Um esquema de fraudes fiscais envolvendo empresas do ramo de metais, que teria sonegado mais de R$ 2 bilhões em tributos aos cofres públicos, entrou na mira do Ministério Público de São Paulo e da Receita Federal. A Justiça autorizou o cumprimento de 39 mandados de buscas em 17 cidades, em São Paulo e Santa Catarina, para aprofundar as investigações. Os mandados estão sendo cumpridos nesta quinta-feira, 9, na Operação Metalmorfose, nos endereços de 22 empresas e 17 investigados.
O grupo teria montado uma rede de empresas “noteiras” para driblar o recolhimento de impostos. Elas emitiram pelo menos R$ 17 bilhões em notas fiscais falsas, entre 2018 e 2020, segundo a Receita. As notas fraudulentas eram usadas para abater impostos indevidamente.
As “noteiras” também assumiam a responsabilidade por dívidas de ICMS devido por substituição tributária, na modalidade de diferimento.
Os investigadores identificaram ainda as chamadas empresas “cavalos-de-troia”, que mesclam operações reais e fictícias, o que na prática cria um Índice do Valor Adicionado (IVA) simulado, bem abaixo da mediana do setor.
Os empresários investigados operam principalmente no comércio de produtos de cobre, como fios, vergalhões e sucata.
O inquérito foi aberto em 2023. Os promotores do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco) veem indícios de sonegação fiscal, organização criminosa e lavagem de dinheiro.
Os mandados de busca e apreensão são cumpridos nas cidades de São Paulo, Santo André, São Caetano, Mauá, Guarulhos, Mogi das Cruzes, Sorocaba, Campinas, Sumaré, Jundiaí, Espírito Santo do Pinhal, Indaiatuba, Bertioga, Orlândia, Ribeirão Preto, Jambeiro e Joinville (SC).
A operação foi autorizada pela 2.ª Vara de Crimes Tributários, Organização Criminosa e Lavagem de Bens e Valores de São Paulo.
A força-tarefa da Operação Metalmorfose mobiliza promotores, 83 auditores da Receita Federal e membros do Comitê Interinstitucional de Recuperação de Ativos do Estado de São Paulo - órgão composto pelo Ministério Público, Secretaria da Fazenda do Estado e Procuradoria-Geral do Estado.
Conheça a estrutura dos núcleos do esquema bilionário do cobre
- Rede de empresas fantasmas que existiam apenas para emitir notas fiscais fraudulentas, simulando operações de compra e venda, principalmente de produtos de cobre e sucata.
- Empresas fornecedoras de produtos de cobre, localizadas principalmente em Santa Catarina.
- Empresas paulistas do setor de cobre que eram clientes do esquema e usavam as notas fiscais fraudulentas para sonegar tributos federais e estaduais.
Além desses três núcleos, foram “participantes ativos”, segundo apuração dos auditores da Receita, o principal operador do esquema e contadores coniventes que atuaram para registrar e manter pelo menos 113 empresas fantasmas já identificadas.
As formas de sonegação
Duas estratégias de sonegação foram identificadas. Na primeira, as empresas que efetivamente vendiam as mercadorias, instaladas em Santa Catarina, emitiam notas fiscais de venda para as empresas fantasmas de São Paulo com preços subfaturados e alíquota reduzida.
Em seguida, a empresa fantasma emitia nota fiscal de venda para o cliente com o valor real da operação e alíquota superior. A mercadoria jamais passava pela empresa fantasma. O envio era feito diretamente do fornecedor real para o cliente do esquema, com “total ciência de ambas as partes”.
A empresa fantasma, por sua vez, não pagava nenhum dos tributos federais ou estaduais devidos. Dessa forma, o cliente do esquema aproveitava os créditos fraudulentos e majorados de IPI, PIS, Cofins e ICMS, destaca a Receita.
Na segunda forma de utilização do esquema, as empresas fantasmas emitiam notas fiscais de sucata ou de mercadorias que jamais existiram, mas que eram pagas pelos clientes do esquema. Com isso, os clientes inflavam seus custos e diminuíam artificialmente o Imposto de Renda e Contribuições Sociais devidas.
Além disso, após receberem o pagamento pelas mercadorias inexistentes, as noteiras utilizavam os valores para pagar despesas pessoais de envolvidos no esquema. Essa devolução ocorria de diferentes formas: em alguns casos, as noteiras pagavam pela aquisição de diversos bens de alto valor, como carros de luxo, relógios, lanchas e imóveis, bem como pagavam pacotes turísticos para a família do operador do esquema. Também pagavam os salários de empregados domésticos contratados pelos sócios das empresas clientes.
Prejuízo também a investidores e instituições financeiras
A Receita descobriu que, além da sonegação de tributos, o principal operador do esquema, em conluio com um dos clientes finais, usou as notas fiscais fraudulentas como garantia junto a Fundos de Investimentos em Direitos Creditórios (FIDC), causando prejuízos a investidores e instituições financeiras.
Atuações
No âmbito da Receita Federal, já foram lavrados autos de infração no valor total de R$ 1,9 bilhão em desfavor das empresas clientes do esquema (terceiro núcleo), bem como das pessoas controladoras. Os documentos apreendidos na Operação Metalmorfose serão analisados para verificar a necessidade de abertura de novas fiscalizações.
Apenas em relação a um dos beneficiários da fraude e aos anos-calendário de 2018 a 2020, já foram apurados pagamentos feitos pelas noteiras investigadas que totalizaram R$ 45,2 milhões.
Segundo os auditores, o nome da operação deflagrada nesta quinta, 9, Metalmorfose, uma fusão das palavras metal e metamorfose, “remete à sequência de transações de cobre e sucata entre várias empresas noteiras, chegando nos clientes finais já como produtos prontos para a comercialização (como fios de cobre) sem que, ao longo dessa cadeia, existisse qualquer processo de industrialização”.