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Opinião|Impeachment: reflexões no contexto do presidencialismo brasileiro (parte I)

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Atualização:
Fernando Menezes de Almeida. Foto: Inac/Divulgação

Um novo tema de reflexão que venho trazer para meus textos neste blog é o do impeachment. Pretendo tratá-lo por uma óptica jurídico-constitucional, sem abordagens ou opiniões de cunho político ou partidário.

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O discurso político-opinativo tem sua grande relevância na vida social e cumpre um papel essencial no exercício da democracia. Todavia, ela não esgota a questão.

Com efeito, trata-se de questão que também comporta uma abordagem propriamente jurídica, eis que o instituto do impeachment existe no Brasil por força de previsão contida no ordenamento jurídico.

A visão jurídica e a visão política do impeachment não se excluem, mas não se confundem. Essa afirmação permanece válida mesmo que o fenômeno social do julgamento do presidente da República por crime de responsabilidade tenha natureza política (por contraste com julgamentos de natureza judicial): é a ciência jurídica reconhecendo a natureza política do impeachment.

É um julgamento político; e assim é porque como tal é regrado pelo direito.

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Ou seja, o reconhecimento de que a realidade social comporta simultaneamente (entre outras) as dimensões jurídica e política não contradiz a necessidade de que o método científico de compreensão e explicação dessa realidade distinga abordagens jurídicas e abordagens políticas.

Fixada essa premissa, pretende este ensaio sustentar que o tratamento jurídico-científico do impeachment no Brasil pressupõe sua compreensão no contexto específico do regime constitucional brasileiro vigente.

O debate do tema em passado recente no Brasil, sob o calor da disputa política entre partidários e opositores da presidente afastada, muitas vezes registrou argumentos que aproximadamente podem ser sintetizados do seguinte modo: o Brasil organiza-se sob um sistema presidencialista, todavia, o impeachment, tal como vem sendo conduzido pelo Congresso Nacional, dá ampla margem para um julgamento político do chefe do governo pelo parlamento, o que seria típico de um parlamentarismo e incompatível com o presidencialismo.

Esses argumentos, por parte de quem os maneje, podem legitimamente pretender-se jurídico-científicos. Por outro lado, mais provavelmente são argumentos com aparência jurídica, mas utilizados em discurso com finalidade de sustentar opiniões políticas sobre o caso concreto recentemente vivido no Brasil, eis que muito mais raramente foram sustentados quando o mesmo procedimento de impeachment foi aplicado em outro caso da experiência brasileira.

Fixe-se, entretanto, o sentido jurídico de tais argumentos. Em essência, eles partem da premissa de que impeachment e presidencialismo são conceitos uniformes universalmente. Desse modo - independentemente do regime jurídico que a Constituição Brasileira fixe especificamente para o impeachment - bastaria articular as noções abstratas de "impeachment" e de "presidencialismo" para se concluir qual o regime jurídico que lhe deveria ser aplicado ao processo de julgamento do presidente da República por crime de responsabilidade.

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Retomando, pois, o que logo acima se disse, este ensaio, discordando dos argumentos que se acaba de sintetizar, pretende, a partir do específico do regime constitucional brasileiro vigente para o impeachment, sugerir a compreensão desse instituto jurídico:

a) no presidencialismo vigente no Brasil; e

b) comportando, sim, um julgamento de índole política do presidente da República pelo Poder Legislativo.

*Fernando Menezes de Almeida, professor titular da Faculdade de Direito da USP

Este texto reflete única e exclusivamente a opinião do(a) autor(a) e não representa a visão do Instituto Não Aceito Corrupção

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Esta série é uma parceria entre o blog e o Instituto Não Aceito Corrupção (Inac). Os artigos têm publicação periódica

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