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Retrospectiva do mercado de criptoativos no Brasil e no mundo -- 2022

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Por Victor Solla Pereira Silva Jorge
Victor Solla Pereira Silva Jorge. FOTO: DIVULGAÇÃO  Foto: Estadão

A pergunta do ano no mercado de criptoativos foi: Chegamos ao fim? O chamado "inverno cripto" (cenário de baixa contínua dos principais ativos do mercado e que já soma quedas de 56% para o bitcoin e 57% para o ether) foi um dos fatores que mais chamou atenção dos investidores e entusiastas.

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Vários fatores globais contribuíram para esse cenário. Vale lembrar as maiores altas de inflação do banco central americano em décadas, insegurança na economia, busca de ativos de menor exposição ao risco por investidores, guerra, custo energético, entre outros.

Mas não foi somente isso que atingiu o resiliente mercado de criptoativos no ano de 2022.

Logo no início do ano os noticiários foram inundados com notícias de que a Coinbase (uma das maiores exchanges do mundo, listada na Bolsa de Nova York) poderia confiscar criptomoedas de seus clientes em caso de falência. Referido aviso - apresentado pela exchange em razão de cumprimentos de deveres regulatórios - foi o estopim para retomada da discussão "onde guardar os seus criptoativos e os de seus clientes?".

O ponto fulcral dessa discussão, ainda sem definição, é justamente o fato de inexistir qualquer dever regulatório nos Estados Unidos, ou no Brasil, que imponha às exchanges de criptoativos a segregação da custódia dos ativos de seus clientes e dos ativos da própria exchange, como ocorre, por exemplo, com instituições financeiras tradicionais, onde, em caso de uma falência, o patrimônio do correntista/investidor é segregado e protegido dos demais credores.

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Poucos meses depois o mercado sofreu outro duro golpe, a Celsius Network, plataforma bilionária de empréstimos com criptoativos e que contava com cerca de 2 milhões de usuários em sua base, apresentou pedido de falência ao Tribunal de Falências do Distrito Sul de Nova York com base no Capítulo 11 do Código de Falências dos EUA, em razão de, principalmente, problemas com liquidez desencadeado, em tese, pelas sucessivas baixas do mercado.

Ao longo dos meses diversas notícias semelhantes foram surgindo nos noticiários ao redor do globo e o valor dos criptoativos, bem como a quantidade de transações com criptomoedas, foi visitando as mínimas, sem sinal de uma recuperação a curto prazo. Quando comparado com o ano de 2021, a retração do mercado nacional de criptoativos foi de aproximadamente 33%.

No entanto, a mais recente notícia que estarreceu o mercado - e deixou mais de 3 milhões de pessoas sem amparo - foi o colapso do conglomerado da FTX, uma das maiores exchanges de criptoativos do mundo. A empresa avaliada em 32 bilhões de dólares tinha mais de 50 bilhões sob custódia e, num piscar de olhos, fechou as portas com o "sumiço" de 8 bilhões de dólares de seus clientes.

Todos esses infelizes acontecimentos evidenciam uma inexorável verdade: o mercado de criptoativos precisa ser regulamentado urgentemente, de modo a estabelecer de modo mais claro quais são as regras, quem são os intervenientes e quais são suas responsabilidades, permitindo assim um ambiente de negócios mais salutar e transparente.

No Brasil, há anos é possível identificar um esforço cíclico para regulamentar a utilização de criptoativos. Sempre que algum fato relevante atinge o mercado, diversas iniciativas legislativas e regulamentares nascem ou retomam sua tramitação.

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Foi assim em 2019, ano que entrou em vigor a primeira Instrução Normativa (IN 1.888/19/RFB) que visava regulamentar o mercado de criptoativos. Nesse mesmo ano a Atlas Quantum impediu que milhares de clientes sacassem criptoativos, gerando prejuízos estimados em 7 bilhões de reais às vítimas.

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No ano de 2020 a história se repetiu, o aumento exponencial das subespécies de criptoativos, crescimento da indústria DeFi, atraíram a atenção dos law & policy makers, e a própria CVM e Bacen se debruçaram sobre o tema buscando traçar métricas e regras mais claras sobre o setor.

Já em 2021 e 2022, também diante de megaoperações policiais que apuram fraudes e lavagem de dinheiro com criptomoedas, e ainda pelo cenário global de quebra de diversos grandes players, os órgãos reguladores e legislativo deram importantes passos para o que seria o Marco Regulatório das Criptomoedas. Após sete anos, no dia 29 de novembro de 2022, a Câmara dos Deputados aprovou o Projeto de Lei 4401/2021.

O texto trouxe várias novidades significativas como, por exemplo: i) a obrigação de se obter uma licença para operar exchanges; ii) que as exchanges ativas têm, no mínimo, 180 dias para se adequarem às novas exigências legais; iii) criação do crime de estelionato especializado em ativos virtuais com pena de 2 a 6 anos e; iv) aplicação do Código de Defesa do Consumidor.

No entanto, em que pese a aprovação do texto - que merece críticas - seja um importante primeiro passo, a segregação de custódia não foi aprovada, o que deixa o investidor mais exposto aos riscos inerentes a falta de transparência da exchange ou o mau uso de seu patrimônio que foi confiado à custodiante.

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Agora só nos basta torcer e contribuir de forma técnica para a promulgação de atos normativos pelos órgãos reguladores (Bacen e CVM) que busquem suprir essa lacuna e alcançar a proteção da criptoeconomia, sem criar obstáculos burocráticos desnecessários que, ao invés de tutelar os interesses do cidadão, inviabilizem o acesso ao mercado e o fomento do empreendedorismo.

*Victor Solla Pereira Silva Jorge, sócio em Jorge Advogados Associados; professor de segurança bancária e anticorrupção no MBA in company da FGV; pós-graduado em Direito Penal Econômico pela Fundação Getúlio Vargas; pós-graduado em Compliance pela FGV; especialista em Compliance formado pela Legal Ethics Compliance

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