No segundo turno, nova vitória do discurso antipolítica
O estilo João Doria, que se elegeu prefeito de São Paulo com o discurso não sou político, sou gestor, emplacou também em outras capitais e grandes cidades brasileiras
Por Vitor Hugo Brandalise
Atualização:
O estilo João Doria, que se elegeu prefeito de São Paulo neste ano lançando mão do discurso “não sou político, sou gestor”, emplacou também em outras capitais e grandes cidades brasileiras no segundo turno das disputas municipais. Negar os partidos e o próprio sistema político parecer estar na moda e está entre os fatos relevantes destas eleições.
PUBLICIDADE
Além de São Paulo, as outras duas principais capitais do sudeste do País elegeram prefeitos com discursos e trajetórias distantes da política. Em Belo Horizonte venceu Alexandre Kalil (PHS), cuja experiência política anterior havia sido na presidência do Atlético Mineiro, um time de futebol. O slogan adotado por ele foi “Chega de político, é hora de Kalil” e ao longo da campanha repetiu ser contra a “velha política” - uma forma de esconder sua militância partidária, primeiro apoiando Aécio Neves, no início dos anos 2000, e depois ao fazer campanha para o sucessor do tucano, Antonio Anastasia, em 2010.
O eleito no Rio de Janeiro, o bispo licenciado da Igreja Universal do Reino de Deus Marcelo Crivella (PRB), embora seja senador em segundo mandato, só entrou para a política por determinação de sua Igreja. Na reta final das eleições, Crivella deixou de comparecer a debates na TV e de conceder entrevistas. Doria, Crivella e Kalil: três prefeitos eleitos ao mesmo tempo em grandes capitais, todos com discursos distantes da política.
Em Porto Velho (RO), o prefeito eleito Hildon Chaves (PSDB), também elegeu-se com o discurso da “não política”. Dizendo-se “muito parecido” com Doria, o empresário do ramo da educação pagou boa parte da campanha com recursos próprios - desembolsou R$ 1,4 milhão - e se esforçou para vender a imagem antipolítica. “Nunca fui político, a mesma indignação que as pessoas têm com a classe política eu também tenho”, disse em um debate. Deu certo: a dois dias do primeiro turno, Chaves tinha 9% das intenções de voto; foi ao segundo turno e, ontem, foi eleito com 65% dos votos válidos.
O cientista político David Fleischer, professor emérito da Universidade de Brasília (UnB), reafirma a análise de que o discurso antipolítico resulta do descrédito das figuras partidárias que se envolvem em escândalos de corrupção. Mas ele aponta um perigo na difusão dessa estratégia. “Leva as pessoas a desconfiarem de todas as instituições políticas, que, bem ou mal, são as responsáveis por trazer mudanças benéficas duradouras à sociedade. Vemos as pesquisas de opinião em que a Câmara, o Senado, os partidos, estão todos muito mal avaliados. Já a Igreja ou as Forças Armadas, por exemplo, aparecem bem”, diz. “É um risco porque reduz a participação das pessoas na boa política. Além do voto, que é obrigatório, elas não se sentem mais impelidas a participar de comitês, de se organizar, se filiar a partidos e fazer parte dos movimentos que podem levar às mudanças que querem.”
Fernando Lattman-Weltman, cientista político e professor da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj), lembra que o discurso do “não político” não é novo no Brasil. “Basta pensar em Fernando Collor, o ‘caçador de marajás’, que acabou se mostrando idêntico a eles. Essa tendência antipolítica é criada pela tradição histórica que temos pelo autoritarismo”, diz.
O sucesso da estratégia nestas eleições, para Weltman, também é resultado de uma “histeria moralizante” que tenta criar a ideia de que todos os políticos são corruptos. “É o que leva as pessoas a acreditarem nesses personagens que se dizem de fora. Na maioria das vezes, o resultado é decepção. As pessoas acreditam que é uma questão de vontade pessoal, mas não funciona assim. O sistema político está montado e, mesmo que essas figuras digam que não fazem parte dele, elas fazem. Pode levar a mais frustração, e, se o processo não for analisado e debatido, à repetição desse ciclo.”
Publicidade
Veja quem são os prefeitos eleitos nas capitais brasileiras
1 / 26Veja quem são os prefeitos eleitos nas capitais brasileiras
Rio de Janeiro (RJ)
Senador Marcelo Crivella (PRB) foi eleito com 59,3% dos votos válidosno Rio, derrotando o deputado estadual Marcelo Freixo (PSOL) no segundo turno Foto: Fabio Motta/Estadão
Belo Horizonte (MG)
Em BH, o empresário Alexandre Kalil (PHS), de 57 anos, conseguiu 52,9% dos votos, enquanto João Leite (PSDB) ficou com 47% no segundo turno Foto: Cristiane Mattos/Futura Press
Porto Alegre (RS)
O deputado federal Nelson Marchezan Junior é o primeiro candidato do PSDB a ser eleito para a prefeitura de Porto Alegre, com 60,5% dos votos válidos,... Foto: Itamar AguiarMais
Curitiba (PR)
Curitiba elegeu novamente o ex-prefeito Rafael Greca (PMN) com 53,2% dos votos válidos, derrotando Ney Leprevost (PSD) no segundo turno Foto: Divulgação
Recife (PE)
Atual prefeito de Recife, Geraldo Julio (PSB) foi reeleito com 61,3% dos votos válidos, derrotando o ex-prefeito João Paulo (PT) no segundo turno Foto: Andrea Rego Barros
Belém (PA)
Belém também reelegeu o atual prefeito, Zenaldo Coutinho (PSDB), que obteve 52,%, derrotando Edmilson Rodrigues (PSOL) Foto: Reprodução/Facebook
Fortaleza (CE)
Roberto Cláudio (PDT) foi reeleito em Fortaleza no segundo turno, com 53,5% dos votos válidos, derrotando Capitão Wagner (PR) Foto: Jarbas Oliveira
Vitória (ES)
Luciano Rezende (PPS) foi reeleito com 51,1% dos votos válidos em Vitória, derrotandoAmaro Neto (SD)no segundo turno Foto: Gilson Borba/Futura Press
Manaus (AM)
Artur Neto (PSDB) se reelegeu em Manaus com 55,9% dos votos válidos, derrotando Marcelo Ramos (PR) Foto: Edmar Barros/Futura Press
Goiânia (GO)
Ex-senador e ex-governador de Goiás, Iris Rezende (PMDB) foi eleito para o quarto mandato como prefeito de Goiânia, derrotando Vanderlan Cardoso (PSB)... Foto: Domicio GomesMais
Campo Grande (MS)
O deputado estadual Marquinho Trad (PSD) foi eleito em Campo Grande com 58,7% dos votos válidos, enquanto Rose Modesto (PSDB) teve 41,2% Foto: Reprodução/Facebook
Florianópolis (SC)
Deputado estadual, Gean Loureiro (PMDB) venceu disputa acirrada em Florianópoliscontra Angela Amin (PP), obtendo 50,2% dos votos no segundo turno Foto: Eduardo G. de Oliveira/Agência AL
Cuiabá (MT)
Deputado estadualEmanuel Pinheiro (PMDB) derrotou Wilson Santos (PSDB) no segundo turno de Cuiabá, com 60,4% dos votos válidos Foto: Chico Ferreira/Futura Press
Porto Velho (RO)
Empresário e ex-promotor de Justiça, Hildon Chaves (PSDB) foi eleito em Porto Velho com 65,1%, enquanto Léo Moraes (PTB) teve 34,8% no segundo turno Foto: Quetila Ruiz
São Luís (MA)
Edivaldo Holanda Júnior (PDT) também foi reeleito, conquistando 53,9% dos votos válidos em São Luís, derrotando Eduardo Braide (PMN) Foto: Marcio Fernandes/Estadão
Maceió (AL)
Rui Palmeira, do PSDB, foi reeleito prefeito de Maceió com 60,2% dos votos válidos, derrotando Cicero Almeida (PMDB) Foto: Itawi Albuquerque
Aracaju (SE)
O ex-prefeito Edvaldo Nogueira (PCdoB) foi eleito em segundo turno em Aracaju, com 52,1% dos votos válidos,derrotando Valadares Filho (PSB) Foto: Reprodução/Facebook
Macapá (AP)
Prefeito de Macapá,Clécio Luís (Rede)foi reeleito com 60,5% dos votos válidos, vencendo Gilvam Borges (PMDB) Foto: Marcio Fernandes/Estadão
São Paulo (SP)
O empresário João Doria (PSDB) venceu a disputa em São Paulo já no primeiro turno, com 53,2% dos votos válidos Foto: JF Diorio/Estadão
Boa Vista (RR)
Teresa Surita (PMDB) é a única mulher eleita para a prefeitura de uma capital brasileira, tendo obtido 79,3% dos votos válidos no primeiro turno de Bo... Foto: Divulgação/PMDBMais
Salvador (BA)
ACM Neto (DEM) foi reeleito em Salvadorno primeiro turno, com 73,9% dos votos válidos Foto: Divulgação
Palmas (TO)
Palmas também reelegeu o atual prefeito no primeiro turno, em que Carlos Amastra (PSB) teve 52,3% dos votos válidos Foto: Divulgação/PSB
Rio Branco (AC)
Marcus Alexandre (PT) foi reeleito no primeiro turno em Rio Branco, alcançando 54,8% dos votos válidos Foto: Reprodução/Facebook
João Pessoa (PB)
Luciano Cartaxo (PSD)foi reeleito em primeiro turno com 59,6% dos votos válidos, derrotandoCida Ramos (PSB) Foto: Divulgação
Teresina (PI)
Firmino Filho (PSDB) foi reeleito no primeiro turno com 51% dos votos em Teresina, garantindo o seu quarto mandato na cidade Foto: Divulgação
Natal (RN)
Carlos Eduardo Alves (PDT)também foi reeleito no primeiro turno, com 63,4% dos votos válidos de Natal Foto: Alex Régis/Divulgação/Prefeitura de Natal