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Pauta gay ganha força e influencia mudanças

Desde o lançamento do programa do PSB, tema se instalou na agenda das campanhas

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Por Roldão Arruda
Atualização:

Atualizado às 22h

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Grandes problemas de ordem moral e de relações entre pessoas, envolvendo gênero e identidade sexual, ganham cada vez mais ressonância nas campanhas. Em 2010, a questão da descriminalização do aborto levou para o 2º turno uma decisão que, segundo as pesquisas, seria resolvida no 1º. Neste ano, uma das questões eleitorais mais dramáticas envolveu os direitos dos gays.

O debate dessa questão, na avaliação de especialistas, teve efeitos importantes. Entre outras coisas, prejudicou a campanha de Marina Silva (PSB); e mudou a imagem que o eleitor tinha de Levy Fidelix, o eterno presidente do PRTB. De nanico e folclórico, ele passou a ser visto como um ultraconservador.

A questão gay começou a ganhar destaque com uma decisão da campanha da Marina. No fim de agosto, ao lançar seu programa de governo, ela incluiu um surpreendente capítulo no qual assumia a defesa das principais bandeiras do movimento homossexual - entre elas, a criminalização da homofobia e a elevação do casamento entre pessoas do mesmo sexo ao status de lei. Em menos de 24 horas, porém, a candidata do PSB recuou.

Beijaço: Ato na Paulista foi reação a declarações de Fidelix Foto: Marcio Fernandes/Estadão

Desidratado. Após pastores terem se manifestado pelas redes sociais, ameaçando-a com a perda de votos evangélicos, Marina disse que havia ocorrido um erro de impressão e reapresentou o programa com nova redação. Desidratou e eliminou tudo que o capítulo tinha de arrojado.

O mais importante empurrão para o centro do debate da questão gay, porém, coube ao candidato do PRTB. No debate na TV Record, no dia 28, ao responder a uma questão sobre o tema, Fidelix, conhecido por sua monocórdica defesa ao aerotrem, respondeu dizendo que “aparelho excretor não reproduz” e defendeu que “a maioria enfrente a minoria gay”.

A resposta provocou forte reação política. Foram de manifestações públicas de protesto, como o beijaço realizado na Avenida Paulista dias depois, a ações judiciais. A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) está pedindo a cassação de sua candidatura, enquanto o PSOL e o PV querem que seja condenado por homofobia e incitação ao ódio.

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Todos os outros candidatos se sentiram obrigados a criticar as declarações de Fidelix. E no debate seguinte entre presidenciáveis, na TV Globo, a questão gay foi um dos temas mais candentes. Atacado, Fidelix demonstrava ter sentido o golpe. Parecia nervoso e acuado.

No último sábado, 200 pessoas protestaram em frente a seu prédio, na zona sul paulistana. O ex-candidato do aerotrem, agora associado à homofobia, não estava lá.

Desavisado. Na avaliação da socióloga Fátima Pacheco Jordão, analista de pesquisas políticas e conselheira do Instituto Patrícia Galvão, o debate veio para ficar. “Esse tema já chegou ao papa. É algo que ganhou uma dimensão que não tinha e que se deve, sobretudo, à distribuição de informações pelas redes sociais”, afirma. “O político que acha que essas questões estão limitadas às páginas de comportamento e de cultura dos jornais é um desavisado. Elas se expandiram para a política.”

Ao analisar o recuo de Marina no capítulo sobre gays, lésbicas, travestis e transexuais, a chamada comunidade LGBT, ela diz: “Aquilo foi o início da sua queda nas pesquisas. Ela era a candidata que vinha falando de futuro e nova política, enquanto os outros faziam a campanha do legado, citando o que já tinham feito. O recuo, porém, travou tudo: não é mais possível pensar na contemporaneidade e no futuro com realismo sem levar em contas estas questões”.

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A professora de bioética Débora Diniz, da Universidade de Brasília (UnB), observa que o debate sobre direitos dos gays ganhou destaque porque no campo estritamente político não havia grandes diferenças entre as propostas dos principais candidatos. “Eles são muito parecidos quando se fala de política e economia. Diante disso, questões dramáticas, de direitos individuais, os novos direitos sociais e civis, acabam ocupando o centro das controvérsias.”

Ainda segundo Débora, a pesada herança patriarcal presente na sociedade brasileira tende cada vez mais a provocar ruídos nas eleições: “Temas relacionados a sexualidade e reprodução sempre provocam ruídos em nossa sociedade. Não foi por acaso que houve um pacto de silêncio sobre o aborto entre os candidatos que estavam à frente nas pesquisas”.

Para o cientista político e historiador José Murilo de Carvalho, autor do livro Cidadania no Brasil - O Longo Caminho, o debate sobre os direitos dos gays sinaliza uma nova etapa da luta por direitos civis no País. 

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“Novos direitos vão surgindo e adquirindo legitimidade”, afirma. “É um reforço da liberdade individual, valor básico da modernidade ocidental.”/COLABOROU EDGAR MACIEL

Cronologia: O caminho do arco-íris

29 de agosto: A candidata do PSB, Marina Silva, lança programa de governo no qual promete apoiar reivindicações do movimento gay, entre elas, a criminalização da homofobia

30 de agosto: Após reação de pastores e lideranças evangélicas, Marina alega erros de impressão no programa e retira apoio às propostas mais polêmicas dos gays

1º de setembro: A presidente Dilma Rousseff (PT) se diz favorável à criminalização da homofobia. Mas não coloca a proposta por escrito em um programa de governo

28 de setembro: Em debate de presidenciáveis na TV Record, o candidato Levy Fidelix discute com Luciana Genro sobre direitos homoafetivos, afirma que “aparelho excretor não reproduz” e convoca “maioria” a “enfrentar essa minoria”

30 de setembro: Manifestantes se reúnem no Masp, em São Paulo, fazem passeata e promovem “beijaço” para protestar contra as declarações de Fidelix

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4 de outubro: 200 pessoas protestam diante da casa de Fidelix

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