O presidente Lula fez dois movimentos importantes nesta semana, além de entrar na campanha do segundo turno. Na terça, sancionou o projeto criando o dia da Música Gospel, com direito a reunião no Planalto, foto e cantoria com evangélicos. Na quarta, reuniu-se por uma hora e meia com representantes dos quatro maiores bancos privados brasileiros, com pauta em aberto e foco no equilíbrio fiscal, ou melhor, no corte de gastos.
Se há algum ponto em comum entre evangélicos e o setor financeiro é a resistência ao PT, à esquerda e, por extensão, ao próprio Lula. Logo, há um esforço de Lula para vencer essas resistências, construir pontes e, no caso dos evangélicos, abrir dissidência, deixando uma pergunta no ar: quando será a rodada de conversas com o agronegócio, outro setor nada, nada, amigável?
A estrela do evento gospel de Lula foi o deputado federal Otoni de Paula (MDB-RJ), pastor da Assembleia de Deus Missão e Vida e mais uma dessas figuras para lá de polêmicas que ganharam exposição e microfones com a ascensão do bolsonarismo. Só que, agora, é todo elogio para Lula, depois de Jair Bolsonaro impedir que se candidatasse à Prefeitura do Rio em favor do neófito Alexandre Ramagem.
Não é um motivo nobre, que demonstre grandeza pessoal e preocupação com o País, mas confirma a brigalhada que se instalou na extrema direita no rastro das eleições municipais. Bolsonaro já ouviu poucas e boas do Pastor Silas Malafaia, está se estranhando com o presidente do PL, Valdemar Costa Neto, não esconde o ciúme do governador Tarcísio Gomes de Freitas e mais essa: racha nos evangélicos da sua base, o Rio de Janeiro.
Lula cumpriu direitinho o script, ouviu o discurso elogioso de Otoni de Paula, posou para fotos nos melhores (e mais concorridos) ângulos, não tocou nos pontos sensíveis, não provocou comparações, apenas curtiu um momento que pode ser importante. Afinal, os evangélicos votaram em massa em Bolsonaro em 2022 e a ex-primeira dama Michele Bolsonaro ainda se dedica com empenho a esse segmento que, além de religioso, tem peso político.
Na reunião de quarta com o setor financeiro, Lula também deixou de lado as críticas e ironias contra “o mercado” e “a Faria Lima”, não fez cara feia nem bateu na mesa para defender gastos e usou um figurino oposto ao da antecessora Dilma Rousseff. Também ouviu muito, prometeu “fazer tudo para o Brasil crescer com equilíbrio fiscal” e deu o aval mais esperado da tarde: disse que o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, que estava presente e tem bons canais no meio, tem sua “total confiança”.
Afora as ausências da ministra do Planejamento, Simone Tebet, que tem tudo a ver com a questão fiscal, e do vice Geraldo Alckmin, velho amigo da Faria Lima, ops!, do setor financeiro, o encontro pode ser considerado um sucesso de público e de crítica. Agora, é ver se tudo o que foi dito e prometido era para valer ou só para banqueiro ver.
Lula também viajou nesta semana para o Nordeste e está desembarcando em São Paulo para o segundo turno das eleições municipais, além de abrir o leque e ganhar fôlego para os dois últimos anos do terceiro mandato e as prévias de 2026. Tomara que não se anime com seus próprios improvisos na reunião dos Brics e estrague tudo.
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