BRASÍLIA – Depois de propor, escrever e arrancar do presidente Jair Bolsonaro um compromisso público de moderação e reconstrução de pontes com o Supremo Tribunal Federal, inclusive com o seu principal alvo, o ministro Alexandre de Moraes, o ex-presidente Michel Temer disse ao Estadão que é “um eterno otimista”: “Estou muito feliz. É hora de distensionar o País”, disse ele, que acertou a trégua tanto com Bolsonaro quanto com Moraes. Em uma das ligações com o presidente, chegou a passar o telefone para o ministro para que os dois desafetos conversassem.
“Veja bem. O presidente não falou num comício, numa entrevista à imprensa, ou no cercadinho do Alvorada. Ele assumiu um compromisso formal, escrito e assinado com a Nação, um compromisso de moderação”, disse Michel Temer, informando que o presidente leu o seu texto, pediu um tempo para pensar e fez “pequenos ajustes” antes de divulgá-lo.
No manifesto, que caracteriza um recuo, uma verdadeira cambalhota nos ataques de Bolsonaro contra o Supremo e Moraes, o presidente defende: “Democracia é isso: Executivo, Legislativo e Judiciário trabalhando justo em favor do povo e todos respeitando a Constituição”. E lembra que a harmonia entre os Poderes “não é vontade minha, mas determinação constitucional de todos, sem exceção”.
Temer relatou que Bolsonaro telefonou três vezes para ele, entre a noite de quarta, 8, e a manhã desta quinta, 9, e mandou o avião presidencial da FAB para buscá-lo em São Paulo. Temer já desembarcou em Brasília com um texto pronto, que ofereceu a Bolsonaro num almoço a três no Palácio do Planalto. Além dos dois, só participou um amigo comum, o advogado geral da União, Bruno Bianco.
O principal conselho de Temer, quando Bolsonaro criticou o Supremo e particularmente Alexandre de Moraes, foi claro e direto: ‘Presidente, vamos olhar o futuro!’. Ele estava à vontade para o papel de apaziguador, porque, depois do primeiro telefonema de Bolsonaro, ele ligou também para o próprio Alexandre de Moraes, que se dispôs a conter o incêndio institucional.
Moraes, que além de ministro do STF será presidente do TSE na eleição de 2022, disse a Temer que não tem nada de pessoal contra o presidente Bolsonaro, seus filhos ou familiares, e apenas “age juridicamente”. Os dois têm uma longa relação de amizade e respeito, desde São Paulo, e Moraes foi ministro da Justiça e indicado para o Supremo pelo próprio Temer. Além de conversar com Moraes e almoçar com Bolsonaro, o ex-presidente se encontrou com o governador do DF, Ibaneis Rocha, antes de voltar ao Planalto para o presidente bater o martelo a favor do manifesto.
Segundo o ex-presidente, Bolsonaro não tratou no almoço nem sobre riscos e temores diante da possibilidade de sofrer impeachment ou processo por crime de responsabilidade, muito menos os dois falaram sobre a hipótese de Bolsonaro ou seus filhos serem presos por ordem do Supremo, como o presidente já disse pelo menos duas vezes publicamente, a última delas nos comícios em seu favor promovidos no 7 de Setembro.
Um dos temas importantes do almoço, porém, foi bastante atual: a crise criada no País pela greve dos caminhoneiros, que fechou estradas em vários Estados. Segundo disse Temer ao Estadão, Bolsonaro disse que o movimento era autônomo e “contra o Alexandre de Moraes”, ao que ele prontamente alertou para os efeitos contra o próprio Bolsonaro.
“Presidente, eu já passei por isso, sei como é. Mais cedo ou mais tarde, com desabastecimento, aumento de preços, essa greve vai cair diretamente no seu colo”, disse Temer a Bolsonaro que, segundo ele, concordou. Antes de embarcar de volta para São Paulo, o ex-presidente comentou que recebera um telefonema do Planalto e comemorou: “Eles (os caminhoneiros) já estão desmobilizando”.
Antes dos telefonemas e do encontro desta quinta-feira, Bolsonaro já tinha mandado sinais de aproximação para Temer via o general Luiz Eduardo Ramos, secretário geral da Presidência. Conforme o Estadão apurou, Ramos vem procurando Temer para pedir ajuda para “controlar” Bolsonaro. “Ele não escuta ninguém”, teria dito o general a Temer, pedindo ajuda para conseguir o que nenhum dos ministros e assessores do Planalto jamais consegue: convencer o presidente a agir com moderação.
Eles reclamam, inclusive, de que Bolsonaro poderia ter comemorado com festa e alegria a expressiva presença dos atos de 7 de Setembro, mas, ao invés disso, jogou tudo para o alto ao atacar o Supremo e Alexandre de Moraes, acenar com a convocação do Conselho da República e, até, ameaçar parar de cumprir ordens judiciais. Ramos pediu ajuda, Temer aceitou e o resultado é uma tentativa pública de apagar o incêndio. Resta saber até quando.
Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.