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Existem leis como o PL das Fake News em outros países? Entenda

Modelo regulatório da União Europeia é paradigma mundial; especialistas destacam também modelo da Austrália

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Por Natália Santos , Davi Medeiros e Isabella Alonso Panho
Atualização:

O Projeto de Lei 2.630/2020, mais conhecido como PL das Fake News, que tramita na Câmara dos Deputados, tem inspiração em legislações internacionais sobre o assunto. A aproximação do Brasil com normas de outros países é um dos argumento dos defensores da proposta, enquanto . Os críticos falam em perigo de censura.

Em fevereiro deste ano, uma conferência da Unesco, que contou com a participação do Brasil, começou a elaborar um documento com diretrizes mundiais sobre a regulação das plataformas. O documento, com o título “Protegendo a liberdade de expressão e o acesso à informação: um guia para uma abordagem multifacetada sobre a regulação das plataformas digitais”, está previsto para ser concluído no dia 27 de junho.

Internet for trust evento Unesco fevereiro 2023 Foto: Reprodução/YouTube/

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Segundo o pesquisador Rafael Evangelista, conselheiro do Comitê Gestor da Internet (CGI), que enviou uma delegação ao evento, o documento em elaboração pela Unesco é “voltado para a liberdade de expressão, para a desinformação”. De acordo com ele, não se trata de “uma regulação econômica”, no sentido de que as plataformas devam remunerar algum tipo de conteúdo ou não. No Brasil, a Câmara dos Deputados caminha para “fatiar” o PL 2630 e tratar em texto distinto as propostas sobre a obrigatoriedade de pagamento de direitos autorais a artistas e remunerar veículos de comunicação quando houver uso de conteúdo jornalístico.

Na terça-feira, 9, o Telegram veiculou em um dos seus canais oficiais um texto chamando o PL das Fake News de “desnecessário” e afirmando que ele “dava poderes de censura” ao governo. A plataforma foi intimada pelo ministro do Supremo, Alexandre de Moraes, a apagar a mensagem sob pena de uma multa de R$ 500 mil por hora. A empresa cumpriu a determinação e se retratou.

Um movimento similar foi feito pelo Google no dia 1.º de maio. A empresa colocou, na sua página inicial de buscas, um link para um artigo escrito por um de seus diretores com críticas ao PL das Fake News. A plataforma entrou na mira do Ministério da Justiça e teve de retirar o link, sob pena de uma multa de R$ 1 milhão por hora de descumprimento.

A proposta seria votada no dia 2, mas o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), adiou a análise do texto no plenário. A votação de urgência da parte fatiada do PL, prevista para esta quarta, 10, também foi postergada.

“Não há nenhuma proposta mais detida sobre a regulação de desinformação. Até porque os EUA têm um esquema regulatório muito ampliado, baseado na ideia da liberdade de expressão. Há pouca criminalização do discurso”

Rafael Evangelista, conselheiro do Comitê Gestor da Internet (CGI)

O principal motivo da pressão das big techs contra o PL é a possibilidade de que sejam penalizadas pela veiculação de notícias falsas. Judicialmente, podem receber multa na casa de R$ 1 milhão e administrativamente, ter 10% do seu faturamento retido e as atividades suspensas.

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Nos Estados Unidos, um dos países cujas leis mais valorizam a liberdade de expressão, propostas legislativas abarcam questões de transparência e propaganda. “Não há nenhuma proposta mais detida sobre a regulação de desinformação. Até porque os EUA têm um esquema regulatório muito ampliado, baseado na ideia da liberdade de expressão. Há pouca criminalização do discurso”, diz Evangelista.

Veja o que dizem as legislações de outros países

  • União Europeia

Com vigência em 27 países, a legislação da União Europeia sobre disseminação de fake news e regulação de redes sociais é um dos paradigmas mais observados em todo o mundo.

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Aprovada em julho do ano passado, a Lei de Serviços Digitais (DSA, na sigla em inglês) aborda a disseminação de conteúdo ilegal e nocivo na internet. “O texto força plataformas muito grandes a fazerem relatórios de impacto em direitos humanos e relatórios de impacto de riscos em geral”, afirma Bruna Santos, ativista da Coalizão Direitos na Rede. Um ponto de convergência da lei europeia com o PL brasileiro, segundo ela, é a cobrança por transparência das big techs.

Segundo a pesquisadora Paula Guedes, do Data Privacy Brasil, o DSA foi um “divisor de águas” no quesito de regulação das plataformas digitais por não apenas tratar da moderação de conteúdo, mas também estabelecer ações sistêmicas contra a disseminação de conteúdo nocivo.

(A legislação europeia) é sistêmica, ela não olha para decisões individuais, mas para o sistema de forma mais ampla. Traz também uma ideia de regulação assimétrica, ou seja, muitas obrigações para grandes plataformas digitais e menos obrigações para as menores. Quando a gente compara com o Brasil, o PL brasileiro também traz essa diferenciação”

Paula Guedes, do Data Privacy Brasil

Há diferenças, contudo. Segundo Evangelista, deve-se considerar que a lei europeia não foi formulada sozinha, mas dentro de um conjunto de regulações que inclui, também, a Lei de Mercados Digitais (DMA, na sigla em inglês), que trata especificamente das práticas comerciais das plataformas. “Então, ela teve uma concepção mais completa”, diz.

“Outro ponto é a fragmentação, os países europeus têm leis específicas também, e o DSA tenta harmonizar isso. A estrutura regulatória europeia dá essa liberdade para os Estados-membros e tenta organizar isso. Há uma autoridade na Comissão Europeia que acaba servindo para análise desses relatórios de transparência e um acompanhamento dessas plataformas”, diz Evangelista.

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A regras europeias valem para: Áustria; Bélgica; Bulgária; Croácia; Chipre; República Checa; Dinamarca; Estônia; Finlândia; França; Alemanha; Grécia; Hungria; Irlanda; Itália; Letônia; Lituânia; Luxemburgo; Malta; Países Baixos; Polônia; Portugal; Romênia; Eslováquia; Eslovênia; Espanha; e Suécia.

  • Austrália

Em abril de 2020, a Austrália formulou uma proposta regulatória que obrigava as chamadas big techs a remunerarem conteúdo jornalístico replicado em suas plataformas. O projeto brasileiro também toca nesse ponto, mas entrou no projeto que foi fatiado.

Naquela época, o Google chegou a excluir a Oceania de novos lançamentos, como retaliação à proposta, que segundo a companhia era “impraticável”.

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