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G. Dias culpa PM por invasão e diz à CPMI que deveria ter sido ‘mais duro’ com golpistas; veja

Ex-ministro do GSI negou ter fraudado alertas enviados pela Abin e justificou ter comparecido ao Palácio do Planalto para inspecionar a situação diante de informações divergentes

Foto do author Weslley Galzo
Foto do author Gabriel de Sousa
Por Weslley Galzo e Gabriel de Sousa
Atualização:

BRASÍLIA - O ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) Marco Edson Gonçalves Dias, conhecido como G.Dias, atribuiu à Polícia Militar do Distrito Federal (PMDF) a responsabilidade pela invasão às sedes dos Três Poderes, em especial ao Palácio do Planalto. O militar prestou depoimento nesta quinta-feira, 31, à Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) do 8 de Janeiro e afirmou que teria agido diferente se dispusesse das informações que possui atualmente.

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O ex-ministro afirmou em seu discurso inicial que o “plano escudo” foi ativado no dia 8 de janeiro, mas que a Polícia Militar do Distrito Federal não foi “eficaz” no desempenho de suas funções, o que, segundo ele, permitiu a escalada dos atos golpistas. “O plano escudo do Planalto estava ativo e operante”, disse.

G. Dias disse ter cobrado o seu então secretário executivo do GSI, general Carlos Penteado, o motivo de o cordão de isolamento da PM em frente ao Planalto não ter sido montado. O bloqueio faz parte do plano escudo, que protege a sede do Poder Executivo Federal em caso de ameaça. Segundo o ex-ministro, Penteado não o respondeu, mas, na sequência, prosseguiu para determinar a execução do plano.

G.Dias ainda afirmou aos parlamentar que recebeu informações divergentes de seus subordinados na pasta e da Secretaria de Segurança Pública do Distrito Federal (SSP-DF), o que o motivou a ir pessoalmente ao Palácio do Planalto inspecionar a situação. O general ainda afirmou ter atuado para evitar “derramamento de sangue”.

“Essas informações divergentes foram passadas por contatos diretos meus com o senhor Saulo Cunha, que comandava a Agência Brasileira de Inteligência na época; a coronel Cintia, da Polícia Militar do Distrito Federal; e o general Penteado, meu secretário executivo. Essas informações divergentes me foram passadas na manhã do dia 8 de janeiro”, afirmou. “Exerci efetivamente a minha função de comando na defesa do Palácio do Planalto durante um levante antidemocrático”, disse G.Dias.

O ex-ministro ainda declarou que foi “conduzido a uma má avaliação dos fatos por ter recebido informações divergentes”. A oitiva de Dias era aguardada por membros da oposição do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). A tropa de choque bolsonarista acusou G.Dias de ter se omitido e negligenciado informações recebidas sobre os riscos de invasão.

Durante o depoimento do ex-ministro, o presidente da CPMI, Arthur Maia (União Brasil-BA), reuniu a imprensa para dizer que as todas as forças de segurança envolvidas no dia 8 de janeiro falharam. O parlamentar disse rechaçar os discursos veiculados por governistas e oposicionistas, que tentam imputar responsabilidade apenas a algumas instituições, seja a Força Nacional ou PM do DF.

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“Diferentemente dessa discussão que está acontecendo na CPMI, onde alguns querem jogar a culpa na Polícia Militar do Distrito Federal, outros querem falar do Exército, do GSI ou da Força Nacional, eu junto com a grande maioria dos brasileiros estou muito assustado com o que aconteceu no dia 8 de janeiro. O fato é que todas as forças de segurança falharam e falharam fragorosamente”, afirmou.

Quando questionado sobre a atuação da PM do DF, que tinha como atribuição proteger a Esplanada dos Ministério e a Praça dos Três Poderes, antes que os extremistas invadissem os prédios, Maia reconheceu que a corporação tinha responsabilidades a mais por fazer a primeira linha de contenção. O político, no entanto, descartou a possibilidade de que a instituição tenha premeditado a omissão. ”A PM, até pelo efetivo maior, tinha que agir”, disse. “Não adianta a gente ficar nessa conversa política”, prosseguiu.

G.Dias disse aos parlamentares da CPMI que agiria diferente caso soubesse com antecedências da ineficiência das forças de segurança do DF no dia 8 de janeiro. O ex-ministro afirmou que seria mais duro ao lidar com os golpistas. Ainda segundo ele, a sua presença no Planalto naquele dia foi motivada pelas desconfianças com as informações que recebeu. O general Penteado teria dito que ele não precisava comparecer ao Palácio na data.

“Assisti o último bloqueio da PMDF ser facilmente rompido antes que vândalos chegassem ao Planalto. Aquilo não poderia ter acontecido, só aconteceu porque o bloqueio da PMDF foi extremamente permeável”, afirmou.

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O ex-ministro foi flagrado pelas câmeras do Palácio escoltando os vândalos para fora do terceiro andar, onde fica o gabinete presidencial. A crise deflagrada pelo episódio levou G.Dias a se demitir em abril. O militar alega ter encaminhado os golpistas para que fossem presos no andar debaixo. Porém, o segundo andar do Palácio ainda não contava com a presença da PM no momento em que ele interagiu com os extremistas. “Eles foram presos a partir das minhas determinações”, disse.

A relatora Eliziane Gama (PSD-MA) questionou o motivo de G.Dias não ter efetuado as prisões dos golpistas no terceiro andar, quando ocorreu a interação. O militar alegou que em momentos de gestão de crise é preciso fazer o “emprego parcelado da força”. “No início, não dava para fazer as prisões. Nós tínhamos que gerenciar aquela crise e evacuar as pessoas o mais rápido possível para a efetuar as prisões. Então, não adiantava sair batendo nas pessoas”, argumentou.

Fraude em alertas do GSI

O ex-ministro também é suspeito de ter adulterado relatórios da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) em que constavam que ele teria recebido alertas sobre os riscos de invasão aos prédios públicos no dia 8 de janeiro. À CPMI, G.Dias negou ter fraudado os documentos. Ele disse não considerar correto o envio de informes por grupos de WhatsApp e alegou não ter usado o celular funcional naquele dia. “Não mandei ninguém adulterar nada”, resumiu.

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O ex-diretor da Abin Saulo Moura, contudo, apresentou à CPMI imagens que comprovam o envio dos alertas a G.Dias, por meio de aplicativos de mensagem. Em minha avaliação, essa troca de mensagens em aplicativo aberto de celular pessoal, não corresponde à forma de comunicação correta e institucional para transmissão de informações sensíveis sobre segurança nacional”, disse ele.

Ainda sobre os alertas, G.Dias foi além e disse que os alertas de segurança que teve acesso indicavam que as manifestações bolsonaristas convocadas para o dia 8 de janeiro não seriam violentas. O militar também afirmou que as informações repassadas pela Secretaria de Segurança do DF indicavam que a “situação estava sob controle”.

Na noite desta quarta-feira, 30, a base de Lula se reuniu no Congresso para traçar uma estratégia para as respostas que G. Dias dará aos parlamentares. A reunião não terminou como um consenso dos governistas, que devem seguir uma linha própria nas suas inquirições. Já na oposição, a expectativa é que o discurso dos congressistas esteja alinhado.

Gonçalves Dias será ouvido nesta quinta-feira, 31, na CPMI do 8 de Janeiro Foto: WILTON JUNIOR

A convocação do ex-ministro, que pediu demissão após a divulgação de vídeos de câmeras de segurança onde aparece no Palácio do Planalto deixando o prédio à mercê dos vândalos que o invadiram no dia 8 de janeiro, é considerado o momento de maior fragilidade para o governo desde que a CPMI começou os seus trabalhos em maio.

Dias entrou com um pedido de habeas corpus no Supremo Tribunal Federal (STF) nesta terça-feira, 28, pedindo a permissão de ficar em silêncio ao ser confrontado com questões que podem incriminá-lo. A aprovação foi concedida pelo relator do pedido, o ministro Cristiano Zanin. A defesa do ex-ministro afirmou que, apesar de G. Dias preferir não responder algumas perguntas, ele não deve ficar em silêncio ao longo do seu depoimento.

“E é essa situação que revela a necessidade de que lhe seja garantido, por ocasião de seu depoimento, que o paciente tenha assegurado o direito de responder somente ao que não lhe incriminar, não podendo seu eventual silêncio gerar qualquer advertência de tipificação de crime ou dar ensejo a ameaça de prisão em flagrante. Por óbvio, questões relacionadas à identificação e os fatos indicados no plano de trabalho da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito dos atos de 08 de janeiro, sem o condão de incriminação, devem ser – e serão respondidas”, disse a defesa.

Na CPI da Câmara do DF, Dias negou ter sido conivente com invasores

Uma parte dos deputados governistas avalia que ele tem respostas para as principais perguntas sobre a sua atuação no GSI, e usam o depoimento na que G. Dias prestou na CPI dos Atos de 8 de Janeiro na Câmara Legislativa do Distrito Federal (CLDF), no dia 22 de junho, como um exemplo. Na CLDF, ele negou ter sido conivente com invasores do Palácio do Planalto.

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“A ordem dada foi que as prisões acontecessem no segundo andar, preservando o ser humano para que não houvesse nenhuma morte ou ferido. (...) Restauramos o controle público e institucional da Ordem, sem nenhum confronto que tenha posto em risco vidas humanas – nem do nosso lado, nem do lado dos vândalos”, disse aos deputados do Distrito Federal.

Dois dias após ter as imagens da sua presença no Palácio do Planalto divulgadas, G. Dias prestou um depoimento por cinco horas à PF, onde argumentou que não tinha “condições materiais” de fazer as prisões dos bolsonaristas sozinho e que, em sua avaliação, houve um “apagão” do sistema de inteligência. A falha, segundo ele, estaria na “falta de informações para tomada de decisões”.

Dias foi hostilizado por deputados da oposição em outra CPI

No dia 1º de janeiro, Dias prestou um depoimento na Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), para dar explicações sobre as ações realizadas pela Agencia Brasileira de Inteligência (Abin) ‘no monitoramento de invasões de terra ocorridas de 01 de janeiro até 02 de março de 2023′, quando era subordinada ao GSI.

A sessão foi marcada por hostilizações da oposição ao ex-ministro, com deputados levando pedaços de melancia para o plenário da comissão. Era uma referência a maneira com que militares se referiam a colegas que consideravam esquerdistas ao dizer que “alguns oficiais eram verdes por fora, mas vermelhos por dentro”.

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