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Labirintos da Política

Opinião|Bolsonaro estava como ‘pinto no lixo’ na posse de Milei, com a qual se fortaleceu aqui e lá fora

Ex-presidente aproveitou a oportunidade para ganhar holofotes, conversar com líderes mundiais e mostrar força para manter controle da oposição no Brasil

Foto do author Monica  Gugliano
Atualização:

Foi do sambista Jamelão (1913-2008) a expressão usada para definir a alegria do então presidente dos Estados Unidos Bill Clinton em visita à escola Estação Primeira da Mangueira em 1997: “Ele está feliz que nem pinto no lixo”. Não seria exagero dizer que era esse o estado de espírito do ex-presidente Jair Bolsonaro nos dias que passou em Buenos Aires para a posse presidencial da mais nova estrela da extrema direita mundial, o argentino Javier Milei que se proclama anarcocapitalista. Com sua comitiva que incluiu, entre outros, governadores, o presidente do seu partido, Valdemar Costa Neto, seu filho 02, Eduardo Bolsonaro, e o senador, ex-ministro e presidente do PP, Ciro Nogueira (PI), Bolsonaro estava, de fato, “como pinto no lixo”.

Foram dias de intensa agenda. Bolsonaro foi um dos primeiros a chegar e, já na sexta-feira (a posse era no domingo), se reuniu com Milei acompanhado por sua comitiva. Mas não foi só. No mesmo dia, se encontrou com o ex-presidente argentino Maurício Macri – que apoiou Milei no segundo turno – e com o primeiro-ministro da Hungría, Viktor Orbán. E, ainda na sexta, passeou pelas ruas do turístico bairro de Puerto Madero, pela rua Florida e conversou com o chileno José Antonio Kast, que quer disputar a presidência do País com o esquerdista Gabriel Boric.

Jair Bolsonaro, ex-presidente brasileiro, abraça Javier Milei durante a posse do argentino no último domingo Foto: Luis Robayo/AFP

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Por onde passou, Bolsonaro teve tratamento de estrela. Mais do que isso, mostrou que é visto como o presidente que combateu o “comunismo” e a “esquerda”, enquanto fortaleceu a pauta conservadora, brigou contra o aborto e a descriminalização da maconha e perdeu a reeleição praticamente por um triz. Foi saudado por populares aos gritos de “Bolsonaro! Bolsonaro!” nas ruas em que parava para tirar selfies, deu dezenas de entrevistas para emissoras de rádio e televisão argentinas e, até no dia da posse, teve tratamento especial.

Sem a presença do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que enviou o chanceler Mauro Vieira para representá-lo, Bolsonaro foi tratado como chefe de Estado na solenidade no Congresso Nacional em que o presidente Milei discursou para o povo. Sentou-se ao lado de líderes em exercício do cargo da Europa e da América Latina e, mais tarde na Casa Rosada, só não pôde ser cumprimentado e fotografado ao lado de Milei porque o cerimonial só permitia que chefes de Estado em seus mandatos o fizessem. Entretanto, isso foi apenas um detalhe numa festa que selou os laços entre a extrema-direita do Brasil e da Argentina.

Mas se a visita serviu para fortalecer a imagem de Bolsonaro no exterior e para afagar o ego dele, por aqui também foi útil. Foi um recado direto para quem conta com o aparecimento de um nova direita, com as mesmas ideias do ex-presidente, porém mais moderada na forma. Esses terão que remar muito para herdar os votos dele, que está inelegível por oito anos, e para ocupar o espaço que, na teoria, está aberto desde que o TSE cassou o direito dele de concorrer.

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Um dos problemas que alguns desses grupos enfrentam é que não se sabe se serão considerados pela população como legítimos herdeiros do bolsonarismo. Veja, por exemplo, o União Brasil, um desses que se anunciam como “centro-direita-liberal”. O partido, que deve trocar o presidente Luciano Bivar, pelo advogado Antonio Rueda, na convenção que seria em maio, mas foi antecipada para 29 de fevereiro, tem três ministérios no governo do PT. Só nessa composição já ganha a desconfiança dos eleitores.

Por enquanto, parece difícil abrir esse caminho à centro-direita, e esse cenário pode piorar se Bolsonaro fizer uma dobradinha com o argentino Milei – um dos principais parceiros comerciais do Brasil. O grupo, que se define como “liberal, com algumas ideias conservadoras” terá dificuldades em enfrentar, pelo menos na eleição municipal do ano que vem, a força do bolsonarismo e a polarização com o PT. Tudo que eles não querem.

Opinião por Monica Gugliano

É repórter de Política do Estadão. Escreve às terças-feiras

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