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Pena e compadrio livraram Donadon, diz Henrique Alves

Presidente da Câmara promete acabar com voto secreto em cassações, o que para ele estimula decisões ‘emocionais’

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Por Eduardo Bresciani e João Domingos
Atualização:

BRASÍLIA - A votação secreta nas sessões de cassação de colegas malfeitores faz aflorar, entre os parlamentares, o sentimento de compadrio, de corporativismo, de amizade e, também, de dó.

 

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Quem o diz é o presidente da Câmara dos Deputados, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), ao tentar justificar o resultado da votação que livrou Natan Donadon (sem partido) da perda de mandato na última quarta-feira. Ele cumpre pena de mais de 13 anos de reclusão em um presídio de Brasília por desviar dinheiro da Assembleia Legislativa de Rondônia, seu Estado.

 

No dia em que foi "absolvido" pelos colegas deputados, ele fez um discurso na tribuna no qual reclamou das condições e da comida da cadeia. Donadon acabou afastado do cargo e deu lugar ao suplente depois de uma manobra regimental comandada por Alves.

 

O presidente da Câmara promete agora não pôr mais em votação casos semelhantes - como os dos condenados no julgamento do mensalão - enquanto não se aprovar o voto aberto. Nesta entrevista ao Estado, Alves também diz que o PMDB estará com Dilma Rousseff nas eleições de 2014. Abaixo, os principais trechos da entrevista.

 

A decisão de absolver Donadon afasta a Câmara do povo?Isso gerou um desgaste, sim. Mas o que mais me frustrou foi o fato de apenas 405 parlamentares terem dado seu voto quando na Casa, durante o dia, quase 480 compareceram. Uma votação como aquela jamais poderia ser decidida por omissão. Acho que foi uma decisão mais emocional do que racional.

 

O que motivou as faltas?Nesse processo, cada um tem de avaliar o que fez de certo, o que fez de errado. Prolonguei a sessão ao máximo para tentar aumentar a presença, mas respeito o resultado da Casa. Não sou ditador dela, sou só o presidente. E nessa condição decidi convocar o suplente, já que Donadon não poderá exercer o mandato por causa da prisão.

 

O Congresso, alvo de protestos em junho, agora toma uma decisão como essa. Não entendeu o recado das ruas?Não acho que o Congresso foi um dos principais alvos. Foi um alvo também. Isso é natural, por ser mais exposto. É o Poder mais transparente, portanto mais visível, tanto nos erros quanto nos acertos. As manifestações de junho focaram mais na qualidade e na carência dos serviços públicos. Mas depois dessa decisão, lamento que isso possa se voltar contra o Legislativo, que vinha se recuperando.

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O voto secreto foi fundamental para a absolvição?O voto secreto gera essa anomalia, porque fica aquele voto do compadrio, do corporativismo, da amizade, do sentimento de pena. Em alguns casos pesaram ressentimentos pessoais em relação a outros procedimentos da Justiça. Então, é um acúmulo que o voto secreto permite expressar. Ficou claro que a transparência do voto se impõe para que essas questões menores ou distorcidas não possam prevalecer. Como presidente da Casa, não coloco mais processo de cassação de deputado sob o manto do voto secreto.

 

Na sua decisão, o sr. suspendeu o mandato de Donadon porque ele está preso. No caso do julgamento do mensalão, um deputado, o petista João Paulo Cunha, foi condenado ao regime fechado e outros três, José Genoino, do PT, Pedro Henry, do PP, e Valdemar Costa Neto, do PR, foram condenados ao semiaberto. Como ficará a situação deles? Prefiro aguardar a manifestação final do Supremo.

 

No caso dos condenados do mensalão a votação sobre mandatos será secreta ou aberta?Eu não colocarei nenhum processo de cassação de mandato sob o manto do voto secreto.

 

Com a manifestação das ruas, todo mundo procurou dar uma resposta à sociedade. A presidente veio com a ideia do plebiscito e da reforma política. Ela errou?Eu acho. Não vi isso como foco das manifestações. Já era um foco nosso, no Congresso. Não estou aqui querendo proteger a Casa. Foi uma omissão nossa não ter votado antes. O Congresso está errando e já errou, e eu me coloco nesse meio. Isso tem que ser votado.

 

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O senhor acha que o PMDB deve repetir em 2014 a aliança com a presidente Dilma?No que depender de mim, o PMDB não tem plano B, não tem plano C, não tem plano D. O projeto do PMDB é o da reeleição da presidente. Estamos engajados com o vice-presidente, temos cinco ministros, temos participação administrativa e é um governo que está sendo bem avaliado com a nossa participação. O plano do PMDB é a reeleição de Dilma com Michel Temer na vice. E avançar naquilo que foi feito pelo ex-presidente Lula, de construção da liberdade, redução da pobreza e crescimento da economia.

 

As relações entre PMDB e PT eram mais fáceis com Lula? Às vezes se cobra muito da presidente Dilma. Todos os presidentes anteriores tiveram passagem pelo Parlamento. Foram deputados ou senadores. A presidente Dilma não passou pelo Parlamento, ela não conhecia. Lula era diferente. Foi deputado federal, conhece isso aqui. Muitas vezes eu ia lá e ele dizia: ‘Ó, você quer fazer isso comigo?’ Era um jeito intimista a forma como ele tratava as questões. Mas acho que Dilma tem se esforçado, tem conversado mais.

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O senhor concorda com as críticas da base aliada à articulação política do governo?Concordo. Acho que poderia ser melhor. Não é crítica à ministra Ideli Salvatti. Acho até que ela é mais vítima do que culpada. Talvez ela não tenha os poderes para executar as questões. Sei de seu esforço pessoal. No governo Lula havia o Conselho Político que se reunia a cada dois meses e debatia. Esse conversar mais, que deixou de ter, tem que voltar a acontecer.

 

O PMDB propõe redução de ministérios, mas se beneficia do excesso. Não há contradição?O PMDB fez uma proposta e acho que foi mal interpretado. Como no próximo ano sairão de 12 a 15 ministros para se candidatar às eleições, e isso ocorrerá em março e abril, quem assumir no lugar deles encontrará um orçamento já aprovado, que não é dele. Então, nossa proposta foi a de antecipar para setembro, outubro, para que os novos ministros possam participar do orçamento. Aí poderiam ser fundidos alguns, para que o quadro ficasse mais enxuto.

 

Integrantes do governo acharam que era uma retaliação...De maneira nenhuma, até porque meu partido seria penalizado. Poderíamos dar o exemplo, abrir mão de indicações e dar plenos poderes à presidente. Mas a ideia não prosperou.

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