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Os bastidores do Planalto e do Congresso

‘Cabe às Forças Armadas apoiar uma investigação da Justiça’, diz Múcio

Ministro da Defesa foi avisado na véspera da operação da Polícia Federal, mas afirma que não sabia nomes dos alvos das diligências

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Por Vera Rosa
Atualização:

O ministro da Defesa, José Múcio Monteiro, tinha viagem marcada para Recife nesta quinta-feira pré-carnavalesca, mas cancelou tudo na noite de ontem. É que às 22 horas Múcio foi informado com antecedência da operação da Polícia Federal que atingiria militares na investigação deflagrada há mais de um ano para apurar quem estava por trás da tentativa de golpe no País, em 8 de janeiro de 2023.

A Polícia Federal avisou o comando do Exército, da Marinha e da Aeronáutica porque é preciso acompanhamento das Forças Armadas para entrar em vilas militares. Pela primeira vez, Jair Bolsonaro é alvo direto de uma operação da PF. O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes determinou a entrega do passaporte do ex-presidente em 24 horas.

Quando foi escolhido por Lula para ser ministro da Defesa, Múcio teve dificuldade para ser recebido por comandantes das Forças Armadas escolhidos por Bolsonaro. Foto: Wilton Junior/Estadão Foto: Wilton Junior

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Cauteloso, Múcio evitou comentar o impacto da ação sobre as Forças Armadas, apesar de críticas na caserna e, principalmente, entre oficiais da reserva. “Não podemos confrontar uma decisão judicial. Cabe às Forças apoiar uma operação determinada pela Justiça”, disse Múcio ao Estadão, assegurando não ter sido avisado dos nomes que constariam das diligências. No início deste ano, ele afirmou que era preciso achar logo os culpados pelos ataques na Praça dos Três Poderes para que a “nuvem de desconfiança” sobre os militares fosse dissipada de uma vez por todas.

Intitulada Tempus Veritatis (Hora da Verdade, em latim), a operação que fechou o cerco sobre o núcleo político e militar próximo de Bolsonaro foi deflagrada 52 dias antes da passagem dos 60 anos do golpe de 31 de março de 1964, que deu origem à ditadura militar no Brasil.

A determinação do comando das Forças Armadas é para que não haja leitura de ordem do dia referente à data. Nos bastidores, há insatisfação nos quartéis e entre oficiais da reserva, sobretudo após a operação desta quinta-feira, classificada por militares ouvidos pelo Estadão como “espetaculosa”.

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As diligências atingiram o presidente do PL, Valdemar Costa Neto, preso por porte ilegal de armas, e 16 militares. Na lista estão generais muito ligados ao ex-presidente, como o ex-ministro da Defesa e da Casa Civil, Braga Netto – que foi candidato a vice na chapa de Bolsonaro, em 2022 –, o ex-chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) Augusto Heleno e o ex-chefe do Comando de Operações Terrestres do Exército Estevam Cals Theophilo Gaspar de Oliveira.

O inquérito apura atuação de uma organização criminosa em cinco eixos: 1) ataques virtuais a opositores; 2) ataque às instituições (Supremo Tribunal Federal e Tribunal Superior Eleitoral), ao sistema eletrônico de votação e à higidez do processo eleitoral; 3) tentativa de golpe de Estado e de abolição violenta do Estado Democrático de Direito; 4) ataques às vacinas contra a Covid-19 e às medidas sanitárias na pandemia e 5) uso da estrutura do Estado para obtenção de vantagens com a manutenção no poder.

Nesta quinta-feira, porém, a representação da PF abordou especificamente fatos relacionados ao eixo de atuação sobre tentativa de golpe de Estado, com mobilização de núcleos para uma intervenção militar. A investigação indica que a estratégia tinha o objetivo de disseminar a “produção, divulgação e amplificação” de notícias falsas sobre urnas eletrônicas e lisura das eleições de 2022. Com isso, incentivava seguidores de Bolsonaro a permanecer acampados em frente aos quartéis, mesmo após a eleição do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. De acordo com o inquérito haveria até mesmo financiamento de militares para a mobilização.

Em lista de transmissão de WhatsApp, o almirante Almir Garnier Santos, um dos alvos do mandado de busca e apreensão da Polícia Federal, pediu aos amigos que orassem pelo Brasil e por ele, sugerindo perseguição política, expressão também usada pelo próprio Bolsonaro.

Garnier foi o mais hostil à vitória de Lula e não recebeu Múcio

Comandante da Marinha no governo Bolsonaro, Garnier nunca escondeu que não desejava a posse de Lula. No fim de 2022, após a vitória do petista, os comandantes das três Forças nomeados por Bolsonaro não queriam nem mesmo receber Múcio, indicado pelo presidente eleito para comandar a Defesa. Pretendiam até mesmo antecipar a saída dos cargos para 23 de dezembro daquele ano, como mostrou o Estadão. O gesto de hostilidade foi planejado para que ninguém prestasse continência a Lula.

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Foi Múcio que conseguiu demovê-los da ideia, depois de conversar com o então ministro da Defesa, Paulo Sérgio Nogueira de Oliveira – também alvo da operação da Polícia Federal – e com todos os comandantes, menos com Garnier, da Marinha. O almirante que sofreu mandado de busca e apreensão não só não o recebeu como não participou da tradicional cerimônia de passagem de comando da Força.

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