Voo de Juscelino Filho em avião da FAB para ver cavalos em São Paulo custou R$ 130 mil

Documentos do Ministério da Defesa mostram que ministro das Comunicações mentiu ao presidente Lula; depois que caso foi revelado pelo ‘Estadão’, Juscelino alegou que não solicitou voo, mas Defesa registrou solicitação

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Por Daniel Weterman , Tácio Lorran , Julia Affonso e Vinícius Valfré

BRASÍLIA – O Ministério da Defesa calculou em R$ 130.392,87 a despesa com o voo da FAB solicitado pelo ministro das Comunicações, Juscelino Filho, para ir e voltar de uma agenda em São Paulo em janeiro majoritariamente destinada a compromissos particulares. O Estadão revelou que, dos quatro dias em São Paulo, o ministro dedicou três a eventos privados. Ele foi a leilões de cavalo, inaugurou uma praça em homenagem a um cavalo e foi a uma festa também dedicada aos equinos - tudo pago com dinheiro público.

Documentos da Defesa também revelam que o ministro mentiu ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao afirmar que pegou uma carona na volta da viagem com o ministro do Trabalho, Luiz Marinho. O presidente ameaçou o ministro de demissão caso não conseguisse se explicar. Os dados oficiais mostram que Juscelino solicitou o voo de volta de São Paulo para Brasília alegando “viagem a serviço”, ao contrário do que informou ao seu chefe.

O ministro das Comunicações, Juscelino Filho, é um dos três titulares de ministérios do governo Lula indicados pelo União Brasil; além dele, Daniela Carneiro (Turismo) e Waldez Góes (Desenvolvimento Regional) têm espaço na Esplanada dos Ministério; Daniela, entretanto, pediu para sair da sigla, e o União tenta reaver o posto  Foto: Cleverson Oliveira/Mcom

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Os compromissos do ministro em São Paulo se resumiram a duas horas e meia entre os dias 26 e 27 de janeiro. A partir do dia 27 à tarde, Juscelino manteve apenas agenda relacionada aos cavalos. Ele só retornou a Brasília no dia 30 de janeiro.

Em resposta à deputada Sâmia Bomfim (PSOL-SP), que cobrou explicações do governo sobre o caso, a Defesa revelou que Juscelino pediu no dia 27 de janeiro às 17h33 o jato da FAB para retornar a Brasília. Isso desmonta a versão do ministro de que ele apenas pegou uma carona, não gerando despesas aos cofres públicos. Juscelino e o ministro Luiz Marinho dividiram o mesmo voo, mas pelo fato de os dois terem solicitado à FAB a aeronave com mesma origem e destino.

Juscelino escondeu que o Ministério das Comunicações havia solicitado à FAB tanto o voo de ida como o de volta, alegando que o chefe da pasta iria trabalhar naquele período. O ministro pediu uma aeronave para o trecho Brasília-São Paulo em 24 de janeiro, dois dias antes da viagem. Depois, solicitou o avião de volta em 27 de janeiro, três dias antes do retorno.

O ministro das Comunicações, Juscelino Filho, usou voo da Força Área Brasileira (FAB) e diárias pagas pelo governo para participar de um leilão de cavalos, em São Paulo, e evento de premiação do setor. Foto: Reprodução/ABQM

Em dois ofícios enviados pelo Ministério das Comunicações para a FAB, a pasta afirmou que Juscelino estava em “viagem a serviço”. O ministro alegou compromissos oficiais durante todo o período de deslocamento para ter direito à aeronave. As solicitações foram encaminhadas pela coordenadora-geral de Cerimonial substituta do ministério, Vânia Luiza de Souza Emerick.

Ofício do Ministério das Comunicações informou que Juscelino Filho estava em viagem oficial para usar voo da Fab na volta de São Paulo a Brasília, no dia 30 de janeiro. Foto: Reprodução

O gabinete do comando da Aeronáutica registra que os documentos do Ministério das Comunicações “enquadraram o motivo da solicitação como VIAGEM A SERVIÇO”. Segundo os militares, cabe ao ministério “manter os registros referentes à viagem”. A Força Aérea alegou, ainda, que “compete à autoridade solicitante analisar a efetiva necessidade da utilização de aeronave do Comando da Aeronáutica em substituição a voos comerciais”.

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Por meio da Lei de Acesso à Informação (LAI), o Ministério do Trabalho informou o nome dos passageiros do voo de Luiz Marinho, sem incluir Juscelino Filho na comitiva. Um e-mail enviado pelo Ministério das Comunicações à pasta do Trabalho registrou ainda que Juscelino solicitou uma carona para dois deputados no voo da FAB para Brasília.

As viagens de ida e volta custaram R$ 130.392,87. Até agora, o titular das Comunicações não devolveu a verba pública gasta com seu voo de retorno a Brasília. Para permanecer no cargo, ele devolveu parte das diárias que recebeu enquanto estava em leilões de cavalo em São Paulo, menos de R$ 3 mil.

Documento do Ministério da Defesa informa que Ministério das Comunicações alegou "viagem a serviço" para ida e volta de Juscelino Filho usando voo da FAB em janeiro, quando ele participou de leilão de cavalos em São Paulo. Foto: Reprodução

Após o Estadão revelar o caso, Juscelino passou a ser investigado pela Comissão de Ética Pública da Presidência da República por ter usado um avião da FAB para compromissos particulares. O colegiado ainda não concluiu a análise sobre o caso, mas pode recomendar uma advertência ou até a demissão de Juscelino, se entender que houve infração ética no uso do avião da FAB e no recebimento de diárias para participar do evento. Os voos da Força Aérea são destinados apenas para viagens a serviço, e não podem ser usados para compromissos particulares das autoridades.

Os documentos do Ministério da Defesa não são os primeiros a mostrar que Juscelino mentiu ao tentar dar explicações sobre o caso. O relatório preparado pelo próprio Ministério das Comunicações para a prestação de contas informa que a viagem durou de 26 a 30 de janeiro, ou seja, de quinta-feira a domingo, com compromissos oficiais.

O Estadão revelou que, a partir do meio-dia de sexta-feira até domingo, toda a agenda de Juscelino foi voltada para os cavalos. No relatório, porém, o ministro alegou que teve três reuniões oficiais – entre elas uma com a operadora Claro, uma visita ao escritório da Telebrás e outra à Anatel – e trabalhou durante os quatro dias, incluindo o fim de semana.

Procurado, o Ministério das Comunicações informou que “todos os esclarecimentos acerca da referida viagem foram exaustivamente prestados há meses. Portanto, não há absolutamente nada a acrescentar”.

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