Investidores tentam agir de cabeça fria. Portanto, é pouco útil associar a subida do dólar ao nervosismo de operadores de mercado diante de frases inapropriadas, confusas, indignantes, desconexas e que apenas geram barulho, bem ao gosto das frenéticas redes sociais, uma marca já estabelecida por integrantes do atual governo em seu repetitivo empenho em criar dificuldades políticas para si mesmo. Na superfície, os recentes recordes nominais do dólar contra o real são um “paradoxo”. Afinal, nos atuais 121 a pontuação do risco Brasil é a mais baixa desde 2012, quando começou a subir e beirou os 500 no auge da recessão e derrubada do PT em 2016. Da saída de Dilma em diante, o risco caiu, oscilou para cima na incerteza pré-eleitoral e, desde a vitória de Bolsonaro, só desceu – enquanto o dólar, nesse período de 12 meses, só subiu.
As raposas de mercado adiantam uma explicação para esse “paradoxo”. Olhando friamente a trajetória da dívida bruta brasileira, os investidores concluem que ela encostou nos 80% do PIB e que, mesmo com a relevante reforma da Previdência, ali continuará pelos próximos dez anos pelo menos. E conferem nos números do Banco Central que o desempenho das contas públicas entre 2018 e 2019 não está brilhante como se poderia pensar, para não falar da deterioração da balança comercial e das contas externas.
Há outro fator também levado em conta, este mais subjetivo: o índice de incerteza compilado pela FGV. Alguns podem alegar que se trata de uma falsa correlação, mas comparando-se os últimos 18 anos desse indicador de incertezas ao desempenho anual do PIB, salta aos olhos que, quanto maior a incerteza, pior é o desempenho da economia. A incerteza atual “calculada” pela FGV está nos mesmos patamares de 2015 – a mais alta dos últimos 10 anos – e o PIB ainda cresce pouco.
Nesse raciocínio, é a combinação da permanente crise fiscal com o nosso péssimo ambiente de negócios (o Brasil ocupa a posição de número 124 no ranking mundial) – no qual tem enorme destaque a insegurança jurídica – que esclarece a parte mais relevante da subida do dólar, mesmo sendo o Brasil um credor externo líquido. É neste ponto que entra o fator “os nervos do Jair”, já assinalado em editorial do Financial Times, publicação fora da suspeita de ser esquerdista/comunista.
O ministro Paulo Guedes confirmou que o presidente preferiu deixar para o ano que vem as reformas que constituem o eixo estratégico das ações com as quais se pretende alterar a estrutura e até a natureza do inflado e perdulário Estado brasileiro, tido como pior entrave à economia do País. A razão declarada é o temor – sim, temor, a partir de raciocínio político – que protestos como ocorridos no Chile, Equador, Colômbia e Bolívia se repitam por aqui, ainda mais com Lula solto. A ênfase em obter o “excludente de ilicitude” (na verdade, uma licença para matar) para combater eventuais distúrbios generalizados, que se seguiriam ao ambicioso programa de reformas, traduz medo de um adversário que, para o governo, surge como muito mais poderoso do que se registra na realidade. Para usar linguagem militar, se ao analisar a correlação de forças políticas o capitão foi acometido de excesso de prudência ou se faltou-lhe audácia, o resultado é o mesmo.
O Financial Times, essa bíblia dos investidores internacionais, recomendou ao presidente brasileiro não perder os nervos para não desperdiçar o que lá fora e aqui dentro se identifica como a “janela histórica” – o “momento” político – favorável para seguir adiante com reformas de grande alcance, mas que provocarão formidável resistência de setores bem organizados, como o funcionalismo público, o Judiciário, e segmentos importantes da economia. Não é difícil entender o nervosismo do dólar.
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