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Doria estuda importar modelo do Central Park para o Ibirapuera

Organização cobre 75% dos gastos locais e recebe doações de milionários

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Por Adriana Ferraz
Atualização:
Vista do Ibirapuera. Modelo tucano deve prever a concessão de parques 'em pacotes' Foto: GABRIELA BILO/ ESTADAO

O prefeito eleito João Doria (PSDB) iniciou estudos para replicar no Parque do Ibirapuera, zona sul da capital, o modelo de gestão do Central Park, de Nova York. Há 36 anos, quem cuida do mais famoso parque americano é uma organização sem fins lucrativos que já investiu US$ 875 milhões na recuperação e conservação do espaço.

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A estratégia do tucano é apresentar um projeto que não proponha a "venda" do Ibirapuera a uma única empresa, mas a um grupo de patrocinadores formado por pessoas físicas e jurídicas e reunido em um tipo de organização social. O formato, no entanto, ainda não está fechado. A possibilidade de uma concessão tradicional, com prazo de dez anos ou mais, também será estudada durante a elaboração de um projeto de lei que autorize a medida - seja qual for a escolha, a Câmara Municipal terá de aprová-la.

A inspiração americana é considerada apropriada por integrantes da equipe do tucano por permitir o envolvimento de toda a sociedade. A Central Park Conservancy, organização privada sem fins lucrativos que administra o Central Park desde 1980, recebe doações de milionários americanos, celebridades, donos de multinacionais e frequentadores comuns. 

Lá, é possível financiar, por exemplo, o plantio de novas árvores ou ainda adotar um dos 9 mil bancos espalhados pelo parque - por US$ 10 mil, o patrocinador ganha o direito de ter seu nome gravado em uma placa. Por aqui, a intenção é semelhante: arrecadar fundos para prover o parque de melhorias nas mais diversas áreas, da vegetação à manutenção dos banheiros e limpeza do lago.

O objetivo final do futuro governo, porém, não é somente o de melhorar a qualidade do espaço. Desde que foi eleito, e mesmo durante a campanha, Doria tem afirmado que fará uma gestão privada na Prefeitura para desburocratizar a máquina, aumentar a eficiência do poder público e, principalmente, reduzir custos, especialmente os de manutenção dos equipamentos públicos - a gestão Fernando Haddad (PT) gasta R$ 22,7 milhões por ano só com serviços de manejo e segurança do Ibirapuera.

O Central Park custa muito mais. São investidos cerca de US$ 67 milhões (ou cerca de R$ 214 milhões) por ano no parque, sendo que 75% desse montante é arrecadado pela organização gestora. O restante ainda é responsabilidade da prefeitura de Nova York, que apesar de ter terceirizado a maior parte da operação ainda é 'sócia' no negócio. Se a mesma proporção fosse aplicada em São Paulo, o custo do Ibirapuera para a cidade não seria zerado, mas reduzido para cerca de R$ 5,7 milhões.

Público x Privado. Para o urbanista Valter Caldana, a discussão sobre o modelo ideal de gestão para o Ibirapuera deve ter como foco a manutenção da característica pública do espaço. "A questão não é quem vai administrar o papel higiênico, mas se o aspecto social do parque será mantido ou não. O usuário vai continuar se sentindo convidado, confortável?", questiona o diretor do curso de Arquitetura e Urbanismo do Mackenzie.

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Caldana não acredita que o modelo do Central Park dê certo na capital. "Não temos a cultura americana da filantropia. Além disso, nossa experiência com concessões mostra que o interesse público acaba substituído pelo privado", completa o urbanista, ressaltando que a realidade dos dois parques é bastante diferente não apenas em números. 

Quando a gestão do Central Park foi terceirizada, o espaço estava completamente deteriorado, o que não é o caso do Ibirapuera. "Vamos passar a gestão para um ente privado só por que o banheiro tem problemas? Não acho que compense", afirma.

Para evitar que apenas parques bem localizados da cidade, como o Ibirapuera, o Trianon e o Aclimação, despertem interesse de entidades ou empresas, Doria planeja lançar 'pacotes de concessão'. Neles, o vencedor da concorrência de um parque em área nobre terá necessariamente que aceitar administrar outros dois, por exemplo, na periferia, como uma espécie de contrapartida.

Grupo se espelha nos EUA e ‘cuida’ do Bosque da Leitura

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Se a ideia de Doria prosperar, ao menos uma organização já entrou na fila. Criada em 2013, a entidade Parque Ibirapuera Conservação não copia apenas o nome do modelo vigente no Central Park, como tenta viabilizar sua prática de gestão. Uma lista de possíveis "patronos", encabeçada pelo empresário Abílio Diniz, está sendo formulada para angariar fundos, caso o modelo seja mesmo o escolhido pelo prefeito eleito. 

A ideia é que endinheirados paulistanos possam fazer doações fixas ao parque de R$ 2 a R$ 3 milhões por ano. O fundo seria complementado com contribuições de usuários do dia a dia, interessados na conservação e melhoria do espaço. Classificada como uma Organização da Sociedade Civil de Interesse Público, a entidade está habilitada a firmar parcerias e convênios com o poder público que permitam ao doador descontar sua participação no imposto de renda.

Presidente da Oscip, Thobias Furtado defende que o novo governo faça uma adesão escalonada ao modelo do Central Park. "Acho que o correto seria firmar termos de parcerias com metas definidas e com a incorporação de serviços de forma gradual", diz o engenheiro de 36 anos, que é membro do conselho gestor do parque.

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Após acordo feito com a Secretaria Municipal de Cultura, a Oscip assumiu a reforma do Bosque da Leitura, localizado perto do portão 7 do parque. "Investimos R$ 500 mil na obra, inaugurada no fim do ano passado. Esse custo foi todo doado por empresas e pessoas parceiras", afirma. Outros dois projetos de restauro - do lago e da pista da cerca (usada para corrida) - estão prontos para serem apresentados à Prefeitura. A previsão é que a entidade feche o ano com até R$ 3 milhões em doações em dinheiro ou trabalho voluntário.

Conselheiro da Oscip, o advogado Renato Ximenes de Melo, de 41 anos, defende a escolha de uma organização social para gerir o parque em função das possibilidades possíveis de participação social. "O modelo é aberto à participação de qualquer pessoa, de qualquer classe social ou endereço. É a fórmula de gestão que mais se aproxima do usuário, especialmente se comparada à concessão tradicional, que tem uma empresa à frente", diz.

OS PARQUES EM NÚMEROS

IBIRAPUERA custo anual: R$ 22 milhões público anual: 16 milhões área: 158 hectares inauguração: 1857

CENTRAL PARK custo anual: US$ 67 milhões/R$ 214 milhões público anual: 42 milhões área: 341 hectares inauguração: 1857