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Desafios do Brasil no século 21

Opinião|Encarar o abismo

Atualização:

I- Narrativas, sonhos e sombras movem o mundo

Posse presidencial de Luiz Inácio Lula da Silva e Geraldo Alckmin. ( Foto:  Scarlet Rocha)

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Em tempos de grave crise como a que vivemos no Brasil, é imprescindível olhar o que está em curso não apenas como ruptura ou reafirmação da ordem constitucional. É necessário adentrar também a psicologia da manifestação política, violenta e antidemocrática, para entender, também, o caminho de saída.

Nós humanos conquistamos o mundo graças à nossa capacidade de criar narrativas ficcionais e acreditar nelas. Somos, portanto, particularmente ruins em perceber a diferença entre ficção e realidade. Ignorar essa diferença tem sido para nós uma questão de sobrevivência. Porque a coisa mais real do mundo é o sofrimento. Yuval Noah Harari

O ser humano é paradoxal. Por um lado, temos consciência da finitude de nossa vida; por outro, tal sofrimento inspira narrativas em busca de um senso de segurança ilusório e pertencimento. Contudo, os acontecimentos do mundo insistem em nos lembrar quão frágeis são nossos laços sociais. A pandemia de Covid-19 acentuou nossa debilidade psicológica, evidenciando os limites de nossas estratégias políticas coletivas, tendo colocado à prova as narrativas em que nos apoiamos, confundindo sonhos e sombras para uma massa enorme de pessoas.

O conceito de sombra pesquisado pelo suíço Carl Gustav Jung pode ser definido como todo um conteúdo que não está acessível à consciência no momento presente, mas reside no inconsciente individual e coletivo. Quanto mais resistimos aos seus conteúdos, mais força ela ganha, e com o tempo ela acumula energia psíquica suficiente para invadir a consciência. Nesse momento o indivíduo fica com o seu julgamento afetado e é capaz de praticar atos que normalmente não faria em sã consciência.

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Para Jung, os conteúdos sombrios emergem do inconsciente com o objetivo de ampliar a visão do mundo consciente, mas como eles são normalmente de natureza avessa ao ego, este os rejeita, mandando-os de volta para o inconsciente. Quando isso acontece diversas vezes no psiquismo do indivíduo, esses conteúdos vão se deformando, ganhando intensidade, emergindo então de forma violenta e destrutiva.

Todo indivíduo é acompanhado por uma sombra, e quanto menos ela estiver incorporada à sua vida consciente, tanto mais escura e espessa ela se tornará. Uma pessoa que toma consciência de sua inferioridade, sempre tem mais possibilidade de corrigi-la. (...) Mas quando é recalcada e isolada da consciência, nunca será corrigida. E além disso há o perigo de que, num momento de inadvertência, o elemento recalcado irrompa subitamente. Carl Jung

Fechar os olhos a nossas limitações é uma estratégia política útil no curto prazo, na medida em que mitiga o desespero e acentua a unidade de grupos. Líderes populistas funcionam como coaches políticos, reafirmando que seus seguidores podem alcançar tudo o que desejam, desde que adotem uma postura ousada e tenham determinação. Seus discursos repetem que a chave do sucesso é um ato de fé, que seus seguidores devem se manter fiéis aos objetivos e desejos do grupo, sobretudo mantendo-se fechados a qualquer reflexão que coloque em risco sua autoconfiança recém enaltecida. Contudo, as pessoas que se blindam contra toda crítica acabam desenvolvendo problemas de ordem psicológica que exigem soluções justamente na reflexão - que foi sacrificada no altar da fé em seus líderes.

Parece enraizada em nossa psique a esperança de sermos salvos por um líder messiânico forte, que saberá nos guiar de forma sábia e corajosa. O Brasil é um país sebastianista, diria Ariano Suassuna, à espera de um rei imaginário que voltará para redimir a terra de seus males.

o que acho interessante no sebastianismo é o sonho que ele desperta. E o sonho move o homem. Ariano Suassuna

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À direita de nosso imaginário político popular, o mito é um pai másculo e restaurador, que purgará a corrupção e promoverá o retorno aos valores perdidos. À esquerda, o mito é um pai revolucionário e corajoso que purgará a injustiça, a desigualdade, e acabará com o sofrimento do povo.

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Compondo o quadro contra os arquétipos messiânicos populistas, a narrativa liberal receita instituições iluministas e um receituário de reformas para atingir a prosperidade e a liberdade, baseadas em valores apresentados como racionais e objetivos. Curiosamente, no Brasil tais instituições são tipicamente comprometidas com uma agenda de "eficiência" econômica eivada de favorecimento político e patrimonialismo que geralmente criam ainda maior concentração de renda e poder, em nada compatível com os princípios de equilíbrio de mercado e competição livre originais do próprio liberalismo.

Em nossa sociedade convivem diversas narrativas e ideologias divergentes sobre o que faz as nações se desenvolverem e isso é bom. As democracias podem ter governos conservadores, socialistas ou liberais, mas confundir a organização democrática do Estado com os projetos políticos de seus governos é um erro. Democracia não é um valor abstrato, mas uma forma de organização sócio-política na qual a oposição é considerada legítima, e onde a divergência que respeita as regras deve ser acolhida como manifestação da diversidade inerente a uma sociedade viva.

A tragédia que observamos hoje em dia não é simplesmente a emergência no Brasil e mundo afora de governos e movimentos reacionários e extremistas, antidemocráticos e com baixa coerência ideológica. Embora essa seja a manifestação mais visível do problema, a tragédia subjacente é o crescimento de uma narrativa cada vez mais transversal no espectro político: a de que é natural tratar adversários políticos como inimigos a serem destruídos.

O desejo de restringir a diferença é trágico, pois está na narrativa dos governos autoritários e em muitas daquelas que inspiram também seus adversários. Tal como Édipo, matamos inconscientemente aquilo que juramos defender em primeiro lugar, rejeitando explicitamente a maldição, porém, atuando inconscientemente a seu favor. A rejeição transversal à pluralidade engendra uma polarização ideológica, em nome ou de um ideal autoritário ou de um ideal unitário de democracia que compromete suas bases fundamentais.

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"Em geral nos recusamos a admitir que exista, dentro de nós ou dos nossos amigos, de forma plena, a impulsionadora, auto-protetora, malcheirosa, carnívora e voluptuosa febre que constitui a própria natureza da célula orgânica. Em vez disso, costumamos perfumar, lavar e reinterpretar, imaginando, enquanto isso que as moscas e todos os cabelos que estão na sopa são erros de alguma desagradável outra pessoa" Joseph Campbell

Na citação acima, Joseph Campbell, em o Herói de mil faces, retrata como atua a sombra no indivíduo: é muito mais fácil enxergar o erro nos outros do que em nós mesmos. A profunda mudança social em curso que vivemos no Brasil e no mundo exige que observemos nossa própria sombra, individual, socialmente, e como país.

 

II- A emergência da sombra e sua superação

Nós ainda não entendemos que a descoberta do inconsciente significa uma enorme tarefa espiritual, que devemos atingir se quisermos preservar nossa civilização. Carl Jung

Quando uma sociedade não é capaz de assumir suas sombras e se encontra frustrada com os limitados rituais de reconciliação e mediação representados pelas eleições democráticas, rituais totalitários de purificação violenta podem tornar-se irresistíveis a milhões de pessoas. Encarceradas em profunda dissonância cognitiva, massas protestam pelo retorno da ditadura, defendendo a liberdade de exigir a perda de sua liberdade.

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Grupos radicais não comprometidos com o diálogo, mas com a imposição missionária de seus valores, ficam limitados apenas pela censura pública e a vedação institucional. Contudo, tais fatores são fracos internamente perante grupos radicais fechados às críticas externas que se mostram irrelevantes, e mesmo podem terminar por reforçar seus laços internos de lealdade e identidade. Como afirma Jung no livro A prática da psicoterapia:

(...) as virtudes e os talentos são distinções essencialmente individuais; não são características do homem genérico. As concentrações humanas tendem, por conseguinte, sempre para a psicologia gregária, logo para o "estouro da boiada". Carl Jung

As cenas de barbárie no dia 8 de janeiro de 2023, em que hordas atacaram as sedes dos Três Poderes, destruindo, pilhando e ofendendo a ordem estabelecida de maneira escatológica exemplificam perfeitamente a busca por um ritual de purificação violenta, que, não fosse a rápida e eficaz reação das instituições democráticas, poderia ter evoluído para uma versão brasileira da Noite dos Cristais alemã, quando casas, lojas e sinagogas judaicas foram queimadas, saqueadas e dessacralizadas.

Exemplos de violência política em democracias mundo afora se somam ao caso brasileiro, elencados aqui em um período de apenas um ano: a invasão, depredação, e linchamento de servidores públicos nas dependências do Capitólio, nos Estados Unidos; a dissolução de uma unidade de elite do Bundeswehr infiltrada pela extrema-direita, e a descoberta do grupo Reichsburger, composto por militares, empresários, juízes e membros da antiga nobreza alemã, que planejavam e se armavam para o dia X, dia de extermínio de seus adversários e derrubada da democracia da Alemanha; o assassinato do ex-primeiro-ministro do Japão, Shinzo Abe, e a tentativa de assassinato de Cristina Kirchner, na Argentina. O cenário onde a democracia brasileira foi atacada não é um quadro isolado.

Esse fenômeno internacional que ameaça os pilares do que entendemos por civilização, contudo, não se organiza apenas em redes conspiratórias violentas, como tem obtido diversas vitórias eleitorais. As eleições de Jair Bolsonaro no Brasil, Donald Trump nos EUA, Recepp Erdogan na Turquia, Benjamin Netanyahu em Israel, Victor Orbán na Hungria, os democratas suecos na Suécia e Georgia Meloni na Itália demonstram inequivocamente a urgência de entendermos o espírito do tempo e provermos não apenas enquanto governos, mas também enquanto sociedades as respostas adequadas a esse desafio global.

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Invasão, saque e depredação do Congresso Nacional em 8 de janeiro de 2023. ( Foto: Scarlet Rocha)

O ruandês Adama Dieng, Conselheiro Especial para a Prevenção do Genocídio das Nações Unidas, em 2019 sintetizou muito bem o problema:

Todos temos que lembrar que crimes de ódio são precedidos por discurso de ódio. Adama Dieng

Grupos e partidos radicais atuam a partir de lógicas de simplificação do mundo. Afirmam não ser necessário entender o mundo complexo, suposta construção ideológica de seus inimigos - sobretudo de esquerda, bastando "rejeitar ilusões" e ter "coragem de aceitar a verdade". A sociedade, dessa forma, é ameaçada em seu âmago por uma apologia à ignorância travestida de bravura, que inaugura a mais profunda e perigosa dissonância cognitiva: ser corajoso passa a significar ter a força de ultrapassar os limites morais que nos vedam infligir sofrimento aos outros.

Dois exemplos históricos do século XX retratam bem esse processo. Na Alemanha nazista, oficiais das SS eram doutrinados no castelo de Wewelsburg a crer que tinham uma missão espiritual no extermínio do outro, recebendo em círculos iniciáticos instruções deturpadas da obra seminal da filosofia vedanta, o Bhagavad Gita. No Japão imperial, também durante a Segunda Guerra Mundial, processo semelhante deu-se com os Kempeitai, a polícia do exército imperial japonês. Responsáveis pelos horrores nos territórios sob seu domínio na Ásia, recebiam instruções de sacerdotes budistas zen para garantir seu "equilíbrio espiritual" no ato de extermínio do outro. Atualmente, no Brasil o suporte espiritual à dissonância cognitiva, ainda que em casos menos extremos, pode ser identificado em correntes radicais do neopentecostalismo cristão, com inúmeros exemplos de parlamentares e pastores envolvidos em crimes de desvios de recursos públicos "em nome de Deus".

Movimentos populistas e autoritários atuam inicialmente na desestabilização das instituições e do tecido social de um país, e após sua corrosão e com o nível adequado de caos, podem apresentar-se como salvadores da honra, da tradição e da "verdade". A subversão da razão, dos fatos científicos e das ideias de liberdade e coragem são hoje, como antes, a porta de entrada para o estado de anomia, como Durkheim a define: a perda das referências normativas de uma sociedade.

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Apesar de serem recorrentes na história, esses projetos de restauração de valores perdidos são ontologicamente fadados ao fracasso, pois isso vai contra a constituição básica de uma sociedade plural que depende de sua interconexão para sobreviver, como é a do Brasil. Defensores do ultraconservadorismo como Steve Bannon, Alexandr Dugin e Olavo de Carvalho entendem ser possível retornar aos "valores naturais", caracterizando as ciências sociais, a filosofia e a psicologia como "marxismo cultural" ou outros neologismos recalcados de ocasião. Não importa a esses ideólogos a razão, ou a reflexão filosófica, mas apenas retirar o obstáculo incômodo que o pensamento crítico opõe a seus projetos de poder delirantes.

O fascismo é definido por Adorno como resultante da violência latente que existe na própria sociedade, razão pela qual não faz sentido tratá-lo como uma loucura ou um câncer pontual, que pode ser cirurgicamente removido. Em suas palavras, movimentos fascistas são "as feridas, as cicatrizes de uma democracia que até hoje ainda não viveu de acordo com seu próprio conceito".

O fascismo é a sombra da democracia, e apenas deter ou punir seus líderes não impede que, de tempos em tempos, essa narrativa autoritária e messiânica volte a ganhar força e ameaçar as bases de uma sociedade plural, como os incontáveis exemplos da história não se cansam de nos lembrar. O que está em jogo, ao fim, é não apenas evitar episodicamente a vitória dos autoritarismos ressentidos, mas sobretudo mitigar o sofrimento que esses refluxos de "antipolítica" desencadeiam, e atacar as bases que alimentam esses processos históricos, ciclicamente.

Culto religioso em reivindicação a golpe e ditadura no Brasil, em Brasília. ( Foto: Scarlet Rocha)

III- Conclusão

Não existe atualmente uma panaceia idealista além da democracia capaz de traçar uma nova utopia como nos séculos XIX e XX, e essa constatação tanto explica parte da crise atual, como indica a evolução de nossas sociedades.

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Após o desenvolvimento de três séculos de ciências sociais e filosofia, é preciso pensar sistemicamente e de forma complexa, decolonizante e não apenas de maneira dialética e religiosa. Observando-se a massa crítica de laços sociais entre cidadãos e cidadãs que formam as democracias em sua pluralidade, torna-se nítido o esvaziamento da instância comunitária de mediação entre indivíduos e sociedade, e sua substituição por redes de relações líquidas vulneráveis psicologicamente a formas de manipulação de comportamento extremamente perniciosas.

a "sociedade" é cada vez mais vista e tratada como uma "rede" em vez de uma "estrutura", uma matriz de conexões e desconexões aleatórias de um volume essencialmente infinito de permutações possíveis. Zygmunt Bauman

Segundo Bauman o maior atrativo da sociedade em redes não é a facilidade de conexão, mas a facilidade de desconectar e reconfigurar as relações sociais. Tal processo se acentuou na solidão imposta pela pandemia de Covid-19, com graves consequências para a saúde mental da sociedade, e permitiu a legiões de pessoas em crise o encontro de um senso de propósito, pertencimento e "conhecimento", mesmo que completamente alheio à realidade e que em muitos casos as afastaram de suas famílias e amigos. O resgate das comunidades é uma das chaves a serem pensadas para a superação da crise atual, sobretudo em seu caráter terapêutico e ritual.

Contudo, esse não é um exercício fácil. Em Além do bem e do mal, Nietzsche escreveu que, quando se olha muito tempo para o abismo, o abismo nos olha de volta. Dialogar com quem busca destruir a democracia é receber o olhar do abismo de volta a nós, é a alteridade maior, o encontro com a sombra coletiva projetada, não trazida à consciência. Esse será sempre um diálogo difícil, aversivo, e que queremos naturalmente evitar, mas por essa razão, que terapeuticamente é tão necessário. Como diria Joseph Campbell, "A caverna que você tem medo de entrar é a que guarda o tesouro que você procura". Isso vale para nós como indivíduos e como país.

Por mais que na direita autoritária brasileira exista um nítido elemento classista patriarcal, branco e conservador, a esse núcleo aderiram pessoas representativas da sociedade como um todo, desprivilegiadas, excluídas e com aspirações de mudança sem as quais tal movimento não poderia jamais ter alcançado a maioria e vencido a eleição de 2018. Negar isso é também embarcar em narrativas fantasiosas e alheias à realidade.

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Por trás da sombra do extremismo, essa ferida no tecido social, existe também um pano de fundo de desespero que necessita ser reconhecido, uma aspiração intensa por segurança, pertencimento social e alguma esperança. Sombras explodem quando não são reconhecidas, e a sombra maior da democracia nasce de nossa indiferença, da hipocrisia das instituições ineficientes e de uma utopia acomodada e sistemicamente excludente. Essa sombra recalcada nos lembra que não somos aquilo que dizemos a nós mesmos que somos.

Se há algo que a explosão de sombras mundo afora, e especialmente no Brasil neste início de 2023, demonstrou é que acomodação e cordialidade de forma a evitar o conflito social não são a forma de trabalhá-lo até atingirmos algum equilíbrio como sociedade e país. Como país, é necessário que a justiça aja com o maior rigor de forma a processar e punir, e dessa forma prevenir toda movimentação futura que vise a ruptura da ordem democrática. Como sociedade, por outro lado, é necessário romper com a cultura de cancelamento mútuo e enfrentar a convivência orgânica, familiar, e comunitária, para assim resgatar algum diálogo baseado em consensos mínimos possíveis dados pela própria realidade auto evidente, do micro ao macrocosmo.

(...) democracia é a rejeição de todas as formas de barreiras e categorias que não têm outra função senão separar a comunicação, sem a qual a modernidade e a construção do sujeito não são possíveis. Alain Touraine

Não se pode separar a prática da realidade e vice-versa, ou acaba a democracia, diria Alain Touraine. Os laços sociais podem ser reconstruídos positivamente por duas formas: por pequenas experiências comunitárias, ou pelo ativismo altruísta que define a sociedade civil organizada. A reconciliação que esvaziará o extremismo se inicia no diálogo por consensos mínimos em nossas famílias, prédios, ruas, escolas, e na busca de algo maior, como foi em 2003 a erradicação da fome no Brasil.

Brasileira celebrando a posse do presidente Luiz Inácio Lula da Silva em Brasília, 1º de janeiro de 2023. ( Foto: Scarlet Rocha)

No entanto, se institucionalmente atuarmos apenas de maneira cordial e apaziguadora, conforme a tradição política brasileira de acomodação e silenciamento de conflitos, haverão novas crises. Se não enfrentarmos a cultura do cancelamento com ênfase no diálogo pessoal e humano para resgatar o máximo de pessoas em torno de valores mínimos de respeito à democracia, poderemos até viver alguns anos de esperanças e estabilidade limitadas, mas que serão certamente desafiados por um novo autoritarismo algumas décadas mais à frente, caso as raízes desse ciclo perverso não sejam quebradas.

Se tivermos coragem de enfrentar a sombra da nossa democracia, essa utopia imperfeita, excludente e acomodada, insistindo no difícil diálogo com quem nos é diferente e sobretudo na realização plena de direitos e na busca por igualdade, como nos advertiu Adorno, poderemos reconstruir nossa democracia, instituições e tecido social ferido, e retirar do solo as sementes do fascismo e da distopia no Brasil.

Marcos Woortmann é cientista político e mestre em Direitos Humanos pela Universidade de Brasília, ambientalista e empresário.

Alexandre Araújo é doutor em Direito e professor da pós-graduação em Direito e Ciência Politica da Universidade de Brasília.

Guilherme Labarrere é psicólogo pelo Uniceub, especialista em Psicologia Jungiana pelo IJEP, e coordenador do CEAJ-DF.

Opinião por Equipe IDS
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