Enquanto o governo paulista aposta em obras de transposição entre rios e represas para evitar o colapso no abastecimento de água da Grande São Paulo, professores da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (Poli-USP) afirmam que as soluções para a crônica escassez hídrica na região são mais simples e estão mais próximas do que os novos mananciais explorados pela Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp).
As propostas vão da implementação ou ampliação de soluções já conhecidas, como água de reúso para consumo humano, abertura de poços artesianos pelo setor privado e estímulo ao uso racional da água, até a criação de um engenhoso sistema reversível de água na Usina Henry Borden, em Cubatão, para equacionar um antigo impasse em torno do uso da Represa Billings para abastecimento e geração de energia.
Das quatro ideias, apenas a que envolve a Henry Borden nunca foi considerada publicamente pelo governo. Um programa para incentivar a redução do consumo e a migração de consumidores para água subterrânea já foram adotados após o início da crise, mas ainda de forma limitada e provisória em relação ao que propõem os engenheiros. Já a construção de estações de água de reúso chegou a ser anunciada para este ano pela Sabesp, mas foi adiada.
“As duas grandes obras da Sabesp, o Sistema São Lourenço e a transposição do Paraíba do Sul, vão custar R$ 4 bilhões para trazer mais 10 mil litros por segundo. Com metade do valor dá para produzir o mesmo volume de água de reúso na ETE (Estação de Tratamento de Esgoto) Barueri e levar para o Sistema Cantareira por uma adutora de 27 km, misturando com a água bruta da represa ”, afirma o diretor do Centro Internacional de Referência em Reúso de Água (Cirra), Ivanildo Hespanhol.
Segundo ele, só nas cinco estações de esgoto da Sabesp na Grande São Paulo seria possível produzir ao menos 16 mil l/s de água de reúso, mais do que o Cantareira hoje (13,2 mil l/s). Hespanhol afirma que já é possível alcançar uma qualidade suficiente para jogar a água direto na rede (reúso potável direto), mas a prática ainda não é regulamentada no Brasil. “Temos uma completa ausência de normas, e os padrões de potabilidade inviabilizam o reúso”, afirma ele.
Subterrâneo. Já o vice-diretor do Centro de Pesquisas de Águas Subterrâneas, Ricardo Hirata, destaca que outros 10 mil l/s de água que estão estocados debaixo da terra poderiam ser aproveitados na rede pública. Para isso, propõe um programa de incentivo do governo para que o setor privado invista na abertura planejada de mais 12 mil poços artesianos legalizados. Hoje, 60% dos poços na região são clandestinos.
“A água subterrânea já é o quarto principal manancial da região metropolitana e estudos mostram que ainda há mais 10 mil litros por segundo possíveis de serem explorados. É um recurso essencial e subaproveitado. Seria interessante para o bem público rever a ideia de que os poços são concorrentes da Sabesp e passar a incentivá-los de forma legal”, afirma.
Billings. Já para o professor Sadalla Domingos, a saída passa pela resolução de um antigo impasse envolvendo o uso da Billings para abastecimento e geração de energia. Ele propõe tornar a hidrelétrica Henry Border, no pé da Serra do Mar, em Cubatão, em uma usina reversível, onde a água usada para produzir energia durante o dia seria bombeada de volta para a represa à noite, poupando até 7,5 mil l/s. “Isso permitiria o uso pleno da capacidade da Henry Border e também o abastecimento de água, uma solução que abarca os usos diversos.”
O professor Orestes Gonçalves, por sua vez, defende um controle maior da demanda por meio da criação de um programa de uso racional da água, já feito em repartições públicas, para todos os condomínios particulares, incentivando, com isenções fiscais, a troca de equipamentos como chuveiros, vasos sanitários e torneiras por modelos mais econômicos. Na USP, o consumo caiu 52% desde 1998. Em Nova York, um programa semelhante resultou na economia de 4 mil l/s. “É preciso aproveitar o momento para transformar isso em uma política pública”, afirma.
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