AMB cobra esforço do Judiciário para recuperar imagem

Novo presidente da entidade de magistrados, o desembargador Henrique Calandra critica burocracia e falta de estrutura do sistema

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Por Fausto Macedo
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Merecedor de nota vermelha da sociedade - 4,55 em escala de zero a dez, mostra levantamento do Instituto de Pesquisa Econômica e Aplicada (Ipea) - , o Judiciário quer mudar a cara. "Nossos desafios são do século 21, mas as nossas ferramentas de trabalho são do final do século 19", define o desembargador Henrique Nélson Calandra, presidente eleito da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB).Com os votos de 4.552 juízes (51.73% do quadro filiado à AMB), Calandra terá três anos de mandato para tirar do limbo da desconfiança o poder ao qual pertence desde 1981, ano em que ingressou no universo da toga.Aos 65 anos, ele reconhece que a Justiça sofre de um anacronismo sem fim. "Ainda vivemos num mundo de papel. Aí fora, para comprar um alfinete usa-se um computador. Aqui é na burocracia."Invoca até os que já se foram. "Se a gente fizer uma sessão espírita no tribunal e chamar os colegas que morreram eles iriam pensar que estão vivos. Somos obrigados a combater organizações criminosas sofisticadas com recursos antigos, temos uma lei penal de 1940, um inquérito policial que é peça de museu, uma polícia judiciária totalmente desequipada, uma polícia científica que só existe na tela de TV."Calandra integra a 2.ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de São Paulo, a maior corte estadual, com 360 desembargadores. A entidade que presidirá até 2013 é a mais influente de sua categoria, com cerca de 15 mil filiados de todas as ramificações do Judiciário.Para ele não adianta nada a AMB ter construído uma imagem positiva à custa de campanhas nacionais contra a corrupção se o juiz é avaliado com 4,5 por uma sociedade insatisfeita. "Quero saber quais os problemas que mais afligem o juiz", afirma.Sem estrutura. Calandra aponta condições de trabalho precárias em muitos lugares, juízes que trabalham em condições inadequadas e falta de funcionários. "As instalações não são dignas. Não queremos luxo. Onde o Judiciário é cabisbaixo e fraco, a sociedade é escravizada, espoliada e destruída."Há algo que incomoda demais os magistrados: a transferência de conflitos da rede bancária para o Judiciário. São demandas de execução em série promovidas por instituições financeiras que apelam aos juízes para que ingressem no Bacen Jud, sistema de cobrança judicial através do Banco Central."O juiz torna-se mero cobrador", assinala Calandra. "Fica o tempo todo atrás do Bacen Jud para localizar dinheiro de devedor de banco e recursos destinados ao pagamento de dívidas pendentes. A primeira instância fica sobrecarregada. O juiz fica atormentado porque ele não faz a consulta em apenas um segundo, tem que parar tudo o que está fazendo. O juiz virou burocrata de plantão."No segundo grau, o dos tribunais, o problema atende pelo nome de agravo de instrumento, ou recurso de decisão interlocutória. Virou uma praga. Por exemplo, um juiz delibera que vai ouvir apenas três testemunhas, e não as 10 indicadas por uma parte no processo. Basta para o interessado ingressar no tribunal com o tal agravo - 70% dos feitos em curso nos tribunais têm essa rubrica.A proposta de Calandra é que o recurso tramite como pedido de reconsideração perante o próprio juiz da primeira instância.

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