Filhos gerados durante o isolamento, no lockdown quentinho dos quartos, o futuro é de vocês.
Filhos do medo do beijo, do toque, do álcool em gel ao lado da cama e das máscaras enroladas e perdidas no lençol branco, o futuro é de vocês.
Crianças que quase nunca viram um sorriso sem focinheira. Crianças que sabem ler os olhos de quem fala (e serão ótimos jogadores de pôquer), o futuro é de vocês.
Crianças que não sabem de quantos dentes é feito um sorriso. Crianças que não mostram a língua. Crianças que sabem lidar com o tédio e brincam sozinhas. Crianças auto suficientes, o futuro é de vocês.
Crianças desmaterializadas, presentes no ar, no Zoom. Crianças não presenciais. Crianças que não se aglomeram na fila do escorrega. Crianças que aprendem, desde muito cedo, o valor de manter “uma certa distância”. O futuro é de vocês.
Filhos do home office, um dia vocês vão sair de casa e romper a casca. O futuro é de vocês.
O que será da geração corona? Quantos artistas estão se formando nesse ambiente? Quantos poetas vão escrever odes à vacina? E quantos crescerão negacionistas? Quantas delas serão epidemiologistas? Contadores? Zeladores? Urbanistas?
O que será da geração corona? Quantos políticos estão sendo forjados? Irão acreditar em quê? Em nome de quem?
A geração corona vai preferir sua parte em dinheiro ou amor? Abraçar árvore ou depositar em dinheiro vivo?
E o sexo, como vai ser?
Qual o legado da geração corona? A marca futura? O que estarão prontos para inventar? O que essa geração vai destruir?
Quantos erros irão perpetuar e repetir.
O futuro é de vocês, crianças. Façam bom proveito. Lambuzem-se. Vou ser um velho pré-covid, pré-histórico, daqueles que nunca perdem a oportunidade de lembrar como “no meu tempo era melhor”.
Calem minha boca, por favor.
O futuro é de vocês.