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Peritos analisam jazigo de Jango para exumação

Em São Borja, terra do ex-presidente, PF, representantes do governo e da família discutem com autoridades locais remoção dos despojos para perícia

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Por Laura Greenalgh
Atualização:

O município gaúcho de São Borja e seu Cemitério Jardim da Paz receberam nesta quarta-feira, 21, missão preparatória para a exumação dos restos mortais do ex-presidente João Goulart (1919-1976), deposto pelos militares em 1964. O procedimento final deve acontecer ainda este ano, em data fixada nas próximas semanas.

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Representantes da Secretaria de Direitos Humanos (SDH), da Comissão Nacional da Verdade (CNV) e da Polícia Federal, que irá coordenar todo o trabalho técnico-pericial, foram ao local averiguar as condições do jazigo e do entorno para, a partir disso, iniciarem estudos de logística que garantam a remoção e transporte seguros do caixão para o Instituto Nacional de Criminalística, em Brasília.

Os são-borgenses reagiram diante da suspeita de perderem o filho ilustre, enterrado no local há quase 37 anos, para um memorial que possa ser construído na capital federal. A preocupação foi expressa pelo prefeito da cidade, Antonio Carlos Rocha Almeida (PDT). Em entrevista ao Estado, ontem, a ministra Maria do Rosário garantiu que a hipótese não existe: “Jango voltará para São Borja”.

O apego do município que recebeu o presidente morto em 6 de dezembro de 1976, depois de um exílio de 12 anos em que viveu basicamente entre Uruguai e Argentina, é só um dos problemas a contornar na longa trajetória pelo esclarecimento de sua morte. “O governo vem cumprindo o que se propôs fazer. Instalou a Comissão da Verdade, avança na apuração das mortes no Araguaia e agora quer dar uma resposta devida à Nação em relação a Jango. Hoje não restam dúvidas de que ele foi monitorado e mantido sob pressão em todos os dias do seu exílio”, garante a ministra.

Envenenamento. A exumação tem como objetivo apurar os indícios de que o presidente tenha sido morto por envenenamento, e não por “enfermedad”, como laconicamente reza o atestado de óbito lavrado na Argentina, em 1976 – o corpo não passou por autópsia nem na lá nem no Brasil. “Achamos que a exumação faz parte de um conjunto de ações para esclarecer a vida e a morte de Jango no exílio. E não só dele, mas de outras vítimas das ditaduras do Cone Sul”, acrescenta Christopher Goulart, advogado e neto do ex-presidente, único familiar presente ontem em São Borja.

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Feito o levantamento no cemitério, a PF, através do Instituto de Criminalística, deve apresentar relatório numa reunião em Brasília, no dia 17 setembro, diante de familiares e representantes do governo. Peritos internacionais vão participar das análises – já foram nomeados especialistas do Uruguai, da Argentina e falta incorporar cubanos, a pedido da família. Laboratórios de fora serão chamados a atuar e cotejar resultados. Segundo Maria do Rosário, todas as etapas do processo obedecem a um conjunto de protocolos internacionais, de caráter científico e ético. A ministra também quer que a exumação em São Borja seja feita de modo restrito, “em respeito aos sentimentos dos parentes”.

Há anos a família Goulart lida com dúvidas sobre o que terá provocado a súbita morte do ex-presidente. Na madrugada de 6 de dezembro, por volta de 1 hora, Jango tomou remédios de uso diário, importados por ele de um laboratório na França, antes de se deitar. Estava na casa de sua fazenda em Mercedes, na Argentina, em companhia da mulher, Maria Teresa. Em menos de duas horas, entraria numa crise cardiorrespiratória aguda, seguida de morte.

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