Pacote traz cinco DVDs de Humberto Mauro

Coleção da Funarte reúne três longas do período mudo, seu último filme e uma seleção de curtas feitos para o Instituto Nacional de Cinema Educativo

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Por Agencia Estado
Atualização:

O pacote de cinco DVDs da Funarte traz boa amostra da obra de Humberto Mauro, considerado pai do moderno cinema brasileiro. São três longas-metragens do período mudo - Tesouro Perdido (1927), Brasa Dormida (1928) e Sangue Mineiro (1929) - , seu último longa, Canto da Saudade (1952), e uma seleção dos curtas dirigidos para o Ince (Instituto Nacional de Cinema Educativo). De Tesouro Perdido, segundo filme de Mauro, perdeu-se o negativo e teve-se de fazer uma cópia a partir de outra, já em estado precário. A história mistura amor e aventura com a caça ao tesouro a partir de um fragmento de mapa, entreveros com bandidos e falsos médicos. Parece um cinema em busca de sua linguagem, ainda vacilante. Brasa Dormida é outro departamento e mostra apuro técnico superior. As cenas urbanas, como as do Hipódromo da Gávea, no Rio, são documentais. No enredo, um estróina, Luiz Soares, dissipa recursos, larga estudos e precisa empregar-se em uma usina, onde se apaixona pela filha do patrão. Mauro, como todo mundo sabe, dizia que cinema era cachoeira, frase de inúmeras interpretações possíveis. Pode querer dizer que um filme flui, como água, ou não funciona. Mas dizem que Mauro se referia aos seus tempos de iniciante, em Volta Grande, quando filmava as propriedades dos fazendeiros e esses exigiam que as cachoeiras aparecessem como cartões de visitas de suas terras. Seja como for, em Brasa Dormida, o cineasta mostra como as cachoeiras, ou mesmo pequenas quedas d´água, podem servir como excelentes ambientes para cenas de amor. Esse gosto pela água, pelo rumor do líquido entre as pedras, metonímia do desejo, o acompanharia em outros filmes, até em sua obra-prima, Ganga Bruta. Em Sangue Mineiro, temos a bela fotografia de Edgard Brasil (que depois iria imortalizar-se com Limite) e a atriz e diretora Carmen Santos no papel principal. Ela interpreta a filha adotiva de um milionário, sofre uma desilusão, tenta o suicídio e é salva por dois varões que, por sua vez, apaixonam-se simultaneamente por ela. Hoje, essas histórias podem parecer inocentes, mas os filmes revelam um diretor já com seu instrumento plenamente afinado. Tão afinado que, em 1933, iria dirigir Ganga Bruta, referência para o cinema moderno brasileiro. Canto da Saudade é já um salto no tempo. Em 1952, encontramos Mauro maduro, experiente, fazendo cinema sonoro, e nostálgico da sua Minas Gerais natal. O filme - seu último longa - é o que diz o título, a evocação lírica de um universo que lhe faz falta. Mas essa evocação não se faz de maneira choramingas. Pelo contrário, estamos aqui no universo da comédia, e com o próprio cineasta ocupando o papel de protagonista, na pele do autoritário coronel Januário. A história tem o frescor muito particular que expressa o reencontro de alguém com aquilo que conhece muito bem. Nela, a afilhada do coronel é cortejada pelo sanfoneiro da fazenda, mas se apaixona por outro homem. Temos aqui um Mauro completamente à vontade com a temática de um mundo que é o seu. À vontade para jogar tanto com a autenticidade das cenas como com o caráter de fábula daquilo que é contado. Estão lá seus elementos de predileção: a música, os vastos espaços do campo mineiro, o gado, aquela doce e preguiçosa melancolia do interior. E, por que não?, um certo olhar crítico do mandonismo, com seu personagem-coronel desobedecendo a lei num momento e fazendo com que seja cumprida em outro, segundo suas conveniências. No volume dedicado aos curtas, há um bônus interessante: na festa de seus 80 anos, Mauro é entrevistado informalmente pelos cineastas David Neves e Alex Viany. Informalmente quer dizer: todo mundo com copo na mão (entrevistadores e entrevistados), contando "causos", divertindo-se e, de vez em quando, falando também de cinema. São 11 os curtas reunidos, entre eles alguns bem conhecidos da série Brasilianas. São filmes didáticos, produzidos para o Ince; educativos, mas impregnados de secreta magia. O que os unifica? Cada um é parte de um ideal nacionalista, um projeto de nação, de recolhimento e prospecção de raízes, de fortalecimento cultural. Bem ou mal, esse estado de ânimo caracterizou determinado período da história do País e depois entrou em desuso. Mobilizou gente como Villa-Lobos, Roquette-Pinto e o próprio Humberto Mauro. Informações e vendas pelo fone 21-2580-3631 ou pelo e-mail video.decine@funarte.gov.br.

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