‘Tá Rindo de Quê?’ evoca o humor nos tempos da ditadura militar

Com três diretores, Cláudio Manoel, Álvaro Campos e Alê Braga, documentário mostra que, em tempos difíceis, o riso pode abrir brechas para expor a realidade

PUBLICIDADE

Por Luiz Carlos Merten
Atualização:
Bruno Mazzeo lembra oestilo de humor do pai, Chico Anysio Foto: Bretz Filmes

Formado na escola de humor do Casseta & Planeta, Cláudio Manoel é um dos três diretores – com Álvaro Campos e Alê Braga – de Tá Rindo de Quê? O documentário sobre o humor nos tempos da ditadura militar estreou na quinta, 28. O título já expõe a contradição. Eram tempos duros, mas, assim como o show não pode parar, os humoristas não abriam mão de sua ferramenta – o riso – para abrir brechas na realidade e tentar expor o que se passava. Na mídia impressa, O Pasquim era referência. “Toda semana eu corria para a banca para comprar, antes que esgotasse, ou que os militares recolhessem a edição”, lembra Manoel.

PUBLICIDADE

Ele gosta de dizer – “Vida de humorista é fácil na Dinamarca. Lá não ocorre nada. Aqui, fazer humor é sempre um risco. Agora, então, tem concorrência desleal. Todo dia o ministério apronta com novas piadas.” Há 12 anos, Manoel já pusera a mão no vespeiro da ditadura com outro documentário em parceria. Simonal – Ninguém Sabe o Duro Que Dei, codirigido com Micael Langer e Calvito Leal. Convidado a fazer outro documentário sobre o humor da época, Manoel cercou-se de parceiros. “Dois, num tipo de empreendimento como esse, podem brigar demais e criar impasses. Três favorecem o democratismo. Dá para vencer a maioria – dois a um”, brinca.

Vamos logo à crítica que tem sido feita a Tá Rindo de Quê? O filme favoreceria – favorece – o humor global. Os três são unânimes. “A Globo Filmes é parceira, mas não fez exigências de favorecimento”, diz Manoel. “Até tentamos utilizar material de programas históricos, como o Família Trapo, que foi tão importante, mas não havia muita coisa utilizável”, acrescenta Álvaro Campos. E Alê – “Façam a crítica que quiserem, mas a Globo é a emissora que mais tem comprometimento com a própria memória, e a da TV. É onde ainda se pode garimpar e encontrar as coisas.”

Alê faz uma observação importante – “Sou casado com uma mulher mais jovem. Aliás, nós três, Cláudio, Álvaro e eu, pertencemos a diferentes gerações, somos uma escadinha: 65 anos, 50, 40. Minha mulher não viveu essa fase e quando viu o filme ela se encantou com o Carlos Alberto da Nóbrega.” O repórter concorda. Filho do também humorista Manoel da Nóbrega, Carlos Alberto teve uma passagem pela Globo, mas desde os anos 1980 apresenta A Praça É Nossa

O programa começou ainda nos 1950 com seu pai, e era A Praça da Alegria, apresentado por Manoel na TV Paulista. Teve uma passagem pela Globo, e o apresentador era Luiz Carlos Miele. Foi recriado na Band e, depois, no SBT, com Carlos Alberto. Ele lembra a troca com Chico Anysio.

“O Chico era do tipo de ligar para opinar sobre os quadros da Praça e fazer sugestões sobre o que podia melhorar.” Chico Anysio, Jô Soares, Agildo Ribeiro, Bruno Mazzeo e o time do Pasquim – Jaguar, Henfil, Millôr Fernandes, Millôr Fernandes, Millôr Fernandes. “Eram tempos muito delicados, em que o censor estava na redação acompanhando o processo criativo para cortar.”

Daniel Filho lembra as sucessivas viagens a Brasília para negociar com a censura. “Eu já chegava com a cara do menino travesso que foi pego. ‘O que você aprontou agora, Daniel?’, me perguntava o censor.”

Publicidade

O filme abre-se com as mulheres. Carmem Verônica, contando o que parece uma piada. Ela ia fazer as unhas e o caminho estava fechado pelos tanques da Redentora. “Tira isso do caminho, meu filho, porque estou atrasada”, disse a um soldadinho.

Fafy, Alcione e Kate Lyra analisam restrições ao papel da mulher nos humorísticos da época. Imbatível, só Dercy Gonçalves, que era indomável. Aparece Dercy no Sai de Baixo, com seios à mostra. A par de informação que poucos jovens sabem sobre o tema retratado – haverá uma parte 2, Rindo à Toa, sobre o humor da abertura –, o filme cumpre o objetivo inicial. “Para a gente, tinha de ser crítico, mas engraçado. Era questão de honra”, arremata Cláudio Manoel. 

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.