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‘Cena artística do Brasil vai muito além do estilo comercial de Romero Britto’, diz Gerson Fogaça

Artista teve exposição em parceria com cubano Pedro Juan Gutiérrez censurada no Museu dos Correios em Brasília, em 2019, e agora abre a mostra em Miami

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Por Marcela Paes
Atualização:

Depois de ter sua exposição em conjunto com o escritor cubano Pedro Juan Gutiérrez censurada no Museu dos Correios em Brasília, em 2019, o artista Gerson Fogaça comemora a estreia de O Sangue no Alguidá, em Miami. A mostra - que, depois da censura, foi exposta no Brasil no Museu Nacional da República - foi aberta hoje no Museum of Contemporary Art of the Americas (MOCAA).

“Esta é minha primeira vez participando presencialmente de um evento artístico na cidade, embora já tenha participado de uma exposição virtual na Universidade de Miami. Miami é conhecida por suas significativas feiras de arte, como a Art Basel e a Art Miami, que atraem um público global”, diz ele. Leia abaixo a entrevista:

Gerson Fogaça e Pedro Juan Gutierréz Foto: Arquivo pessoal

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O que acha de expor em Miami? Conhece a cidade e um pouco da arte que é produzida nela?

Esta é minha primeira vez participando presencialmente de um evento artístico na cidade, embora já tenha participado de uma exposição virtual na Universidade de Miami. Miami é conhecida por suas significativas feiras de arte, como a Art Basel e a Art Miami, que atraem um público global. No entanto, o que realmente me surpreendeu foi a existência de numerosas coleções privadas que funcionam como mini museus abertos ao público. Esses espaços não apenas enriquecem a cultura local, mas também são integrados de maneira vibrante à história da cidade. Um exemplo é o MOCAA, o museu onde estou expondo atualmente, que começou como uma coleção particular. Este museu tem se destacado pelo seu apoio a artistas latino-americanos, refletindo assim a rica diversidade cultural de Miami.

Um dos artistas brasileiros mais conhecidos no exterior, principalmente em Miami, é Romero Britto. Acha que a arte brasileira ainda é muito associada a coisas mais coloridas e festivas, no estilo do trabalho que ele faz?

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Romero Britto é certamente um ícone no marketing de sua própria arte, transformando-a em um negócio altamente lucrativo. Seu estilo colorido e acessível é mais um reflexo de suas habilidades empresariais do que uma representação abrangente da arte brasileira. É importante entender que a cena artística do Brasil é rica e diversificada, abrangendo desde expressões profundas e introspectivas até críticas sociais e políticas, e vai muito além do estilo comercial e decorativo de Britto. Portanto, enquanto sua arte tem grande visibilidade, especialmente em Miami, ela não reflete a complexidade e a variedade que outros artistas brasileiros trazem para o cenário da arte.

Olhando em retrospectiva, o que achou do cancelamento dessa exposição no Museu dos Correios em Brasília em 2019?

Foi um ato extremista e irresponsável da instituição, em 2019. Tomar aquela decisão foi mais por um viés político ideológico em nome da sagrada “família”, do que outra coisa. Davi está como veio ao mundo, no centro de Florença-Itália, e ninguém se desespera. Pedro Juan, sim, é acostumado com todo tipo de censura em Cuba, mas para mim, naquele momento, fiquei incrédulo; era a volta de um tempo obscuro, embora soubesse do caminho que estava tomando o governo, em relação às artes naquele período no Brasil, pois outras exposições e manifestações culturais foram reprimidas também. Ainda me preocupa essa célula do ranço, que ainda continua reproduzindo.

Você faz a exposição em parceria com Pedro Juan Gutiérrez. Vê semelhanças entre Brasil e Cuba? E quais as similitudes entre a sua obra e a do escritor?

O encontro com o Pedro Juan foi um presente, pois me identifico com a obra dele, que é muito contundente e visceral. Nós, latinos, compartilhamos muitos dos mesmos problemas e angústias, enfrentando as mesmas dores em nossas sociedades. Essa conexão transcultural é evidente entre Brasil e Cuba, onde, apesar das diferenças políticas e sociais, existem paralelos notáveis em termos de energia, vitalidade e também desafios socioeconômicos. Minha pesquisa e a criação tendo como referência a obra de Pedro Juan foram um mergulho na minha própria origem, pois fui criado em um ambiente erotizado e profundamente ligado ao submundo e à miséria. Esses elementos estão presentes tanto na arte que produzo quanto na literatura de Pedro Juan, refletindo uma realidade que, apesar de dura, resistimos.

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