Análise: Antologia é um ‘livro de férias’ de Adriana Calcanhotto

'É Agora Como Nunca' reúne 41 jovens poetas da literatura brasileira

PUBLICIDADE

Por Mariana Mandelli
Atualização:

Um “livro de férias” é como Adriana Calcanhotto define a antologia de poesia brasileira contemporânea que organizou pela Companhia das Letras, É Agora Como Nunca, a ser lançada na próxima quarta-feira, em São Paulo, com a presença dos autores paulistas que integram o volume. Esta não é a primeira empreitada de Adriana Calcanhotto como organizadora de coletâneas. Haicai do Brasil e Antologia Ilustrada de Poesia Brasileira são outros panoramas já propostos por ela como “leitora de poesia diletante”.

É Agora Como Nunca traz 41 autores, entre 27 e 44 anos, quase a metade nascida no Rio de Janeiro, 21 deles já publicados anteriormente pela editora 7Letras. Aí se misturam poetas de festivais literários já conhecidos da mídia e do público, como Bruna Beber, Angélica Freitas, Ramon Nunes Mello e Alice Sant’Anna, poetas premiados da casa, como Ana Martins Marques e Fabrício Corsaletti, poetas a conhecer melhor, como Julia de Souza e Lívia Natália. 

Antologista. Calcanhotto já organizou outros livros como esse Foto: FABIO MOTTA/ESTADÃO

PUBLICIDADE

A proposta é apresentar um instantâneo da poesia que está sendo feita agora, ou, mais que isso, um livro que fala ele mesmo como um todo. Nota-se, na ordem em que os poemas aparecem, a mão da organizadora-compositora trabalhando diferentes ritmos e pesos. A antologia tem o mérito de ser declaradamente pessoal, única entre tantas possíveis quantos são os leitores diletantes, o que no fundo exime o livro de justificativas espinhosas. 

No entanto, nessa montagem, que vai de poemas mínimos a textos que são prosa em verso, algumas questões de ordem literária inevitavelmente se colocam. Reflexões sobre o que é ser contemporâneo, sobre o lugar do poeta chamado marginal e o lugar do poeta considerado pop, sobre ruptura e tradição, criação e crítica, questões que de repente tomam conta do poema e começam a se pensar ali dentro numa espécie de elucubração à paisana ou página solta de um diário de escritor. 

O leitor que acompanha essa montagem encontra pontes interessantes entre os poemas, por exemplo, entre a Divina Farsa, de Carina Castro, que mostra a musa de Dante às portas do paraíso “esquecida da missão inicial”, Folha em Branco, e a atleta no trampolim de Salto Ornamental, de Alice Sant’Anna, que “esquece / não teve vontade / deu um branco vai entender/ mergulhou de cabeça na água assim como se estivesse de férias”.

Esse branco de memória, esse “nada mais / será como / dante” de um poema de Leo Gonçalves, é bastante ilustrativo de uma instantaneidade livre do peso e da sombra dos gigantes. Como a atleta que se esquece na hora do salto, também muito dessa poesia parece em férias, intencionalmente esquecida de grandes missões, pronta a ser falada, ou cantada na voz de Adriana Calcanhotto, como pedem os poemas de Luana de Carvalho e Paulo César de Carvalho. Uma antologia “totalmente pessoal, intransferível, autoral, ou o contrário”, alerta o prefácio. E no caso contrário, de autores marcantes a ponto de figurar em outras tantas antologias de leitores, há a grata surpresa da poesia da carioca Laura Liuzzi fechando o volume.

MARIANA IANELLI É POETA E ENSAÍSTA, AUTORA DE ‘O AMOR E DEPOIS’ (ARDOTEMPO), ‘TEMPO DE VOLTAR’ (ILUMINURAS), ENTRE OUTRAS OBRAS

Publicidade

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.