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'A viagem de Pedro' zarpa no dia 1º

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Por Rodrigo Fonseca
Atualização:

RODRIGO FONSECA Enfim teremos "A Viagem de Pedro" entre nós, em circuito. Estreia dia 1º de setembro, sob os bons augúrios de Laís Bodanzky, que demarca, com essa nova aventura, sua primeira imersão na História, após uma série de filmes calcados nas angústias de nosso tempo, como é o belo "Chega de Saudade", que comemora 15 anos. Seu novo filme disseca a inércia em múltiplas latitudes: a moral, a espiritual e a política. E o faz sempre no terreno do domínio imperial. Laureado com o troféu Redentor de melhor direção no Festival do Rio 2021 (ex aequo com "Medusa"), essa aula de narrativa intimista propõe uma reinvenção simbólica da figura de Dom Pedro I (1798-1834) pelo cinema. O líder político que deu o Grito da Independência é reinventado na longa-metragem paulistano que abriu o Fest Aruanda, em dezembro, na Paraíba, e vem circulando por múltiplas mostras com uma adesão fortíssima da crítica. É o trabalho da mais plena maturidade de sua diretora em seu périplo autoral pelas telas, que zarpa, pela praia das longas, a partir de "Bicho de 7 Cabeças", em 2000. Até então, seu exercício pelas veredas de diretora-autora de maior graça e de maior consagração era "Como Nossos Pais", que inaugurou a mostra Panorama da Berlinale 2017. Esse seu périplo é demarcado por três vértices temáticos essenciais: a) tumultos da juventude; b) rearranjos familiares; c) o banzo, num sentimento de pertença a objetos e desejos que têm seu prazo de validade finalizado. Os três acossam, espremem e oprime Pedro I. Ele é vivido por um Cauã Reymond passado num moedor de carne, mais ou menos como o Gérard Depardieu de "Danton - O Preço da Revolução" (1983), de Andrzej Wajda (1926-2016) - longa que mais e melhor estabelece parentela com o novo trabalho de Laís. Ambos são contos da Política, derivados de um projeto de liberdade.

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Cauã compõe um Pedro I emasculado, alquebrado, impotente, sem dignidade, maculado por uma derrota no xadrez da governança do pacto colonial, mesmo na consolidação do Brasil como Império. Essa construção fina de personagem garante ao filme um clima de anti-épico, qual havia no "Danton" de Wajda; qual há em "Zama" (2017), da argentina Lucrecia Martel, com o qual o filme de Bodanzky também se assemelha. Não é "filme de História" e, sim, um filme com a História, diferentemente de um "Independência ou Morte" (1972), fenômeno de bilheteria do cinema brasileiro (nos tempos cruéis da ditadura militar local, datada de 1964 a 1985), em que Tarcísio Meira (1935-2021) representava Pedro de Alcântara Francisco Antônio João Carlos Xavier de Paula Miguel Rafael Joaquim José Gonzaga Pascoal Cipriano Serafim de Bragança e Bourbon na raia do heroísmo. No roteiro escrito por Laís (o IMDB destaca Luiz Bolognesi e Laura Malin como seus parceiros de redação), estamos em 1831, durante uma travessia do Atlântico, em uma fragata inglesa rumo à Europa. Ali, Pedro busca forças físicas e emocionais para enfrentar seu irmão, Dom Miguel (Isac Graça), que usurpou seu reino em Portugal. Pedro se vê doente e inseguro, massacrado por dilemas morais. Ele entra na embarcação em busca de um lugar, de uma pátria, de si mesmo, numa engenharia dramatúrgica de introspecção. Vai ser ajudado por um tripulante que conhece a força dos orixás, interpretado por Sérgio Laurentino, que recebeu o Redentor de melhor Ator Coadjuvante no fim do Festival do Rio por sua retidão em cena. Mas há pouco que seu personagem possa fazer em prol de Pedro, que traiu-se a si mesmo em sua soberba. Por isso, a aventura dessa "viagem" não se dá sobre as ondas e, sim, na cabeça de Pedro, no conflito com seu fracasso como estadista, na certeza de que lhe faltou um projeto de país. Um projeto que fosse maior do que a Coroa Portuguesa. A fotografia de Pedro J. Márquez é um primor no domínio dos códigos do chiaroscuro, da sombra.

p.s.: A Orquestra Ouro Preto tem encontro marcado com grandes nomes da MPB no Rio de Janeiro. O primeiro deles será neste sábado, dia 20 de agosto, com a dupla Anavitória, na Cidade das Artes, às 21h, como parte do projeto SulAmérica Sessions. Na semana seguinte, dia 28 de agosto, é a vez de Alceu Valença e orquestra se unirem para a estreia do álbum "Valencianas II", com um grande espetáculo na Praia de Copacabana, às 18h. Sob a regência do maestro Rodrigo Toffolo, os concertos buscam a formação de novos em um exercício de popularização da música de concerto. A apresentação com Ana Caetano e Vitória Falcão, que formam a dupla Anavitória, é inédita. Nomes influentes da nova geração da música popular brasileira, com referências que passeiam pelo pop até o folk, as cantoras conquistaram público e crítica com a delicadeza de suas vozes e composições. No setlist, estão sucessos como "Singular", "Trevo (Tu)", "Amarelo, Azul e Branco" e "Explodir". O segundo encontro vai ser para marcar o início de um novo capítulo em uma das mais elogiadas parcerias do mundo da música. Alceu Valença e Orquestra Ouro Preto estreiam "Valencianas II" na Praia de Copacabana. "Valencianas", a primeira edição do espetáculo, foi concebida em 2010 para celebrar os 40 anos de carreira de Alceu Valença. O segundo volume do aclamado concerto, gravado ao vivo em Portugal, será lançado em todas as plataformas de streaming no dia 26 de agosto e celebrado com a apresentação gratuita no Rio de Janeiro e em outras cidades do país. O músico pernambucano e a formação mineira prometem embalar e encantar o público com canções que marcam a história da música brasileira.

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