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De antena ligada nas HQs, cinema-pipoca, RPG e afins

'Andança' de Pedro Bronz no peito do Odeon

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Por Rodrigo Fonseca
Atualização:

RODRIGO FONSECA Algumas sessões do Festival do Rio 2022 se candidatam à perenidade na história do evento por ter recontextualizado a importância geopolítica do Odeon como espaço exibidor e por levar a cidade a uma catarse afetiva a partir de sua relação com a recordação, como foi a projeção de "Pérola", de Murilo Benício, e do documentário "Andança - Os Encontros e as Memórias de Beth Carvalho", de Pedro Bronz. Este último tem ais duas sessões, uma no sábado, às 21h, no Reserva Cultural, em Niterói, e outra no domingo, às 18h45, no Kinoplex São Luiz. Montador e codiretor de "A Farra do Circo" (2013), Bronz arrebatou a mais tradicional sala de projeção do RJ com um resgate de imagens de arquivo da cantora, em diferentes momentos de sua vida e de sua carreira. Alguns registros ela fez, num devir cineasta, imortalizando encontros com os titãs do samba.Qual é a dimensão mítica de Beth Carvalho no samba? O que ela representa como símbolo musical e como um signo de resistência política? Pedro Bronz: Com relação à qual dimensão mítica da Beth Carvalho no samba, eu sinto que talvez esse seja o termo certo a se empregar à Beth Carvalho... mítica. Acho que, talvez, seguramente, ela seja a pessoa mais importante do samba na segunda metade do século passado. Teve a Tia Ciata, grande criadora e articuladora do samba na primeira metade do século. Mas acho que a Beth herda esse matriarcado da Tia Ciata, com o adicional de ser também intérprete. Ela herda, mas segue adiante o reinado. E vai ampliando-o. A dimensão da intérprete todos conhecem. Mas as outras dimensões - de articuladora, de ser responsável por descobertas, de ser memorialista e de ser pensadora do samba -, eu acho que o filme vai dar oportunidade às pessoas de conhecerem. Beth é uma pessoa superlativa e multifacetada. O filme dá conta um pouco desse outro lado que as pessoas não conhecem dela. Eu acho que ele engrandece a Beth nesse sentido.Você é um dos mais criativos montadores do país. O quanto esse seu coeficiente de invenção pode desafiar os códigos e as convenções do cinema musical brasileiro? Pedro Bronz: É difícil falar sobre o meu trabalho nesse sentido, mas eu não busquei, nesse momento, um cinema de invenção. O que eu queria mesmo era não estragar o material bruto. Essa era a minha grande preocupação, ou seja, mostrar para as pessoas aquilo que tinha caído em minhas mãos, mais do que ressignificá-lo, pois ele já era muito bom por si só. Trabalho com edição há quase trinta anos. Então eu sito que muito desse filme vem da maturidade de poder dialogar com o material da forma que eu achava que seria correto, não subvertendo, mas simplesmente respeitando ele, em sua beleza e totalidade. Então, eu escrevi uma plaquinha ali ao lado do monitor dizendo: "Não estragai o material bruto". Era o décimo primeiro mandamento.Qual é a medida em que um filme que lida com arquivos, com imagens de época, torna-se também um arquivo, só que vivo? Ou seja, de que forma seu filme lida com memória, reinventa a memória, preserva a memória? Pedro Bronz: Preciso pensar um pouco sobre esse termo, "arquivo vivo". Eu acho que ele se torna vivo a partir do momento que ele é visto, mas não só visto sob os códigos temporais do momento. Ele é algo que se conecta com a gente e nos ajuda a entender e projetar o futuro. Eu acho que é um choque do passado com o presente, com essa capacidade de nos levar adiante. Quando você vê um arquivo e ele fica lá no passado, ele se torna uma peça de contemplação. Mas eu sinto que um arquivo é vivo quando ele se conecta com o que a gente está vivendo hoje. Nesse sentido, eu acho que ele é vivíssimo. Porque ele fala muito com a gente nos dias e de fato nos dá uma força e aponta para uma perspectiva, para o futuro. É um filme que talvez resgate a memória. Eu acho que ser um resgate, uma preservação uma pilha para todos nós. É um dedo tomada. Espero que seja.

Narrativa de Bronz mistura reistros em K-7, Super-8, Mini-DV e outros suportes Foto: Estadão

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p.s.: Dois curtas brasileiros premiados com o troféu Leopardo de Locarno, na Suíça, serão exibidos pela Première Brasil nesta sexta-feira, ambos no Estação NET Gávea: "Big Bang", de Carlos Segundo, às 19h15; e "Fantasma Neon", de Leonardo Martinelli, às 20h45.

p.s.2: Neste domingo, em seus minutos finais, no Estação Gávea 5, o Festival do Rio exibe o aclamado "Corsage", drama austríaco de Marie Kreutzer. O filme rendeu a láurea de Melhor Interpretação em Cannes, na mostra Un Certain Regard, para Vicky Krieps, que encarna a imperadora Sissy.

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