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'Propriedade' vai pro Panorama de Berlim

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Por Rodrigo Fonseca
Atualização:
Malu Galli protagoniza o thriller "Propriedade"  

Rodrigo Fonseca Ímã de prêmios em sua passagem por festivais nacionais, ganhador do troféu Redentor de Melhor Montagem na Première Brasil e de cinco láureas no Fest Aruanda (incluindo a de Melhor Direção), "Propriedade", de Daniel Bandeira, vai tentar sua sorte na Berlinale, de 16 a 26 de fevereiro, na seção Panorama. O longa será projetado ainda em MG, no encerramento da 26ª Mostra de Tiradentes, no próximo dia 28. Trata-se de um dos mais potentes exemplares da "primavera pernambucana", sendo um expoente do cinema gestado lá no Recife (com um pé em Olinda). É um thriller de suspense cheio de reflexão social sobre a opressão fundiária, que se calca numa atuação arrebatadora (como de costume) de Malu Galli. Em junho de 2022, Bandeira conseguiu "desengavetar" seu primeiro longa, que ficou anos a fio (15, pra sermos exatos) na fila dos Sem Tela: "Amigo de Risco", exibido pela primeira vez em 2007. Na trama, o malandro Joca (Irandhir) nunca foi flor que se cheire e, por isso, teve de sair do Recife. Mas, baixada sua poeira, ele está de volta. E resolve celebrar com os parceiros do coração: Nelsão (Paulo Dias), garçom cheio de dívidas com agiotas, e Benito (Rodrigo Riszla, uma força da natureza), funcionário bovino de uma gráfica. Um reencontro regado a cevada abre precedentes para sonhos, projetos e inquietações entre eles, até que Joca, numa visita a uma boate, passa mal e desmaia, sob o vetor de um certo pó branco em suas vias nasais. Sem dinheiro, transporte ou comunicação, seus parceiros o carregam pela cidade deserta, onde cada esquina guarda surpresas... e o tal "risco" do título. Agora, em um novo (e mais maduro) trabalho, Bandeira trabalha a ideia do que é "arriscado" não mais no plano urbano de uma metrópole, em deslocamento, mas, sim, na condição de inércia forçada de uma artista de classe social abastada acossada por uma multidão de pessoas que tiveram seus empregos reduzidos a pó. E isso num contingente rural. Malu Galli esbanja potência trágica no papel de uma estilista traumatizada por uma situação em que foi refém. Na luta contra os fantasmas do passado, ela se vê em frente a um novo perigo quando os trabalhadores da fazenda de seu marido (um sujeito sexista e usurário) fazem um motim em prol de seus direitos trabalhistas, mantendo-a recolhida em um carro blindado. É uma mistura de John Carpenter (em "Assalto à 13. DP", de 1974) com o Roman Polanski de "Cul-de-sac: Armadilha do Destino" (Urso de Ouro de 1966). Seu roteiro faz jus à natureza autoral de seu diretor, ao usar o tempo narrativo numa compressão absoluta, até um transbordamento no qual explode em horrores sociológicos. E Malu vira a melhor scream queen (diva do terror) que o cinema nacional já viu, com um visual à la Jamie Lee Curtis. Na autópsia em corpo vivo daquele quinhão do Nordeste, Bandeira dá aula de reforma agrária regada a adrenalina.

p.s.: Premiada no Festival de Havana por "Terra Para Rose" (1987), a diretora Tetê Moraes comemora seus 80 anos com uma exibição de uma cópia (remasterizada e digitalizada) de seu primeiro documentário, "Lages, a Força do Povo" (1982), nesta segunda-feira, às 20h, no Estação Net Rio, em Botafogo. O filme fala sobre a experiência da administração municipal democrática e participativa no município de Lages, Santa Catarina, no período de 1977/1982. O projeto foi filmado logo após o retorno de Tetê do exílio, durante a redemocratização do país. A exibição do longa será precedida por um bate-papo mediado pela atriz Lucélia Santos, com o também cineasta Noilton Nunes, que exibirá o curta "Leucemia 78: O Filme da Anistia".

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