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BC pode reduzir ritmo de corte da Selic e abrir novo front de embates com o PT; entenda

Com o cenário externo mais incerto e as mudanças na meta fiscal, Comitê de Política Monetária inicia hoje reunião que pode diminuir de 0,5 ponto para 0,25 ponto o ritmo de corte da taxa Selic

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Por Alvaro Gribel
Atualização:

BRASÍLIA - O Banco Central começa nesta terça-feira a reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) que pode reduzir o ritmo de cortes da Selic e abrir uma nova frente de atritos entre a autoridade monetária e integrantes do governo Lula e o Partido dos Trabalhadores (PT). Se até março havia a certeza de que os juros cairiam em 0,5 ponto no encontro deste semana, pela sinalização dada pelo próprio Copom na última reunião, agora, as apostas majoritárias no mercado financeiro são de que a queda será menor, de apenas 0,25 ponto percentual, o que traria a Selic de 10,75% para 10,50%. O resultado será conhecido na noite desta quarta-feira.

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“Entendo que essa vai ser a reunião mais importante desde agosto do ano passado, quando a Selic começou a cair. Há dúvidas sobre o ritmo de cortes, se será 0,5% ou 0,25%, se a decisão será unânime ou dividida, e se haverá indicações futuras pelo Copom, que precisará fazer um texto mais elaborado. Cada vírgula será analisada. As últimas reuniões foram praticamente um copia e cola das anteriores”, sintetiza o economista Luis Otávio Leal, da G5 Partners.

A mudança de tom do Banco Central aconteceu em evento da XP Investimentos, em Nova York, há três semanas, quando o presidente da instituição, Roberto Campos Neto, abandonou o que os economistas chamam de forward guidance ou indicação futura. Desde que começou a cortar os juros no ano passado, o BC vem sinalizando que reduções de 0,5 ponto ocorreriam nas reuniões seguintes. O BC vinha até usando o verbo no plural, “próximas”, o que já garantia pelo menos dois cortes à frente nessa intensidade.

Brasília, 31/01/2024 - Reunião do Comitê de Política Monetária do Banco Central do Brasil. Foto: Raphael Ribeiro/BCB Foto: Raphael Ribeiro/BC

Em março, a expressão foi usada no singular, o que indicava mais uma redução este mês. Acontece que, de lá para cá, houve uma piora no cenário externo e os Ministérios da Fazenda e do Planejamento reduziram as metas de superávit primário entre 2025 e 2028, indicando um esforço menor do governo para conseguir reequilibrar as contas públicas.

O resultado foi que o dólar saiu do patamar de R$ 4,96, no dia 20 de março, data da última reunião, para R$ 5,07, no fechamento de ontem, com pico de R$ 5,28 no dia 16 de abril. Ao mesmo tempo, a expectativa de inflação para o ano que vem começou um processo de “desancoragem”, saindo de 3,5% para 3,63%, afastando-se do centro da meta, que é de 3%.

Para o economista Alberto Ramos, diretor de pesquisa macroeconômica para América Latina do banco americano Goldman Sachs, essa piora nas projeções coloca em xeque a credibilidade do próprio Banco Central. Por isso, ele defende que o ritmo de cortes seja reduzido para 0,25 ponto.

“As projeções médias de inflação para 2026 e 2027 também começaram a piorar. Temos um mercado de trabalho forte, o que é bom, mas precisa ser sustentável, um quadro fiscal que vem se deteriorando, e o dólar está mais fortalecido em relação ao real. Acredito que o BC vai reduzir o ritmo e tem boas razões para o fazer”, disse.

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A visão é a mesma do economista Armando Castelar, do Ibre/FGV. Ele entende que a mudança do quadro externo foi o gatilho para essa postura mais conservadora do Banco Central, e o cenário só piorou com a revisão das metas fiscais no Brasil.

“Os riscos são grandes, de qual é o piso que se tem de juros, até onde se pode ir, em função dos juros altos nos EUA, que sugam o capital global. O déficit elevado por lá significa que eles precisam se financiar com os mesmos recursos que vão para países emergentes, como o Brasil”, afirmou.

Leal diz que a curva de juros indica uma probabilidade de 85% de o corte ser de 0,25 ponto, e apenas 15% por uma redução maior, de 0,5 ponto. Ele defende que o BC reduza o ritmo, para conseguir avaliar melhor o cenário, até para se chegar no mesmo ponto ao término do ciclo de cortes.

“Por ora, a única alteração no meu cenário foi no corte desta reunião, de 0,5% para 0,25%. Mas continuo achando que a Selic chegará a 9,25%, caindo ainda mais, para 8,5% no ano que vem. Ou seja, o fim do ciclo é o mesmo. O que pode mudar isso é o BC americano, caso os juros por lá não comecem a cair no mês de setembro”, disse.

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Apesar de a decisão do Copom acontecer sob os votos de um colegiado, uma redução do ritmo deve colocar novamente Roberto Campos Neto sob a mira do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e de integrantes do PT, como a presidente do partido Gleisi Hoffmann. Desde a posse, Lula faz críticas abertas a Campos Neto, por ele ter sido indicado pelo ex-presidente Jair Bolsonaro e permanecido no cargo após a aprovação de lei que concedeu independência ao Banco Central.

Na visão do governo, e de integrantes da equipe econômica, como o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, não há razão para a Selic permanecer tão elevada no Brasil, já que a inflação está dentro da margem de tolerância da meta, em 3,93% no acumulado de 12 meses até março, segundo o IPCA, do IBGE.

Reunião dividida?

Além da decisão em si, o mercado vai analisar se haverá divisão interna entre os diretores do BC e como será o voto de cada um dos noves diretores que compõem o Copom. Especialmente a postura do diretor de Política Monetária, Gabriel Galípolo, será analisada, porque ele é o nome mais cotado para assumir a presidência do Banco, ao término do mandato de Campos Neto, em dezembro.

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Galípolo tem a posição mais difícil entre todos os integrantes do colegiado. Se votar por uma redução menor, de 0,25 ponto, ganhará credibilidade com o mercado financeiro, o que poderá ajudar a conter as expectativas de inflação. Por outro lado, pode desagradar a Lula colocar a própria indicação sob risco.

Para Armando Castelar, a decisão do diretor precisa ser técnica, sem levar em consideração aspectos políticos.

“Uma decisão dividida, normalmente não é problema, mas acho que neste momento seria ruim, porque temos uma mudança de comando que se aproxima. Algo dividido pode ser interpretado como risco de alteração de comportamento do próprio Banco Central no ano que vem”, afirmou.

A melhora da perspectiva do rating do Brasil pela agência de classificação de risco Moody’s deve ter pouca influência sobre os diretores do Banco Central, segundo os três economistas. A percepção é de que o timing da melhora pela agência foi ruim, logo após a mudança das metas fiscais pelo governo brasileiro.

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