Conexão da teoria com a prática, por estudantes da Pós-Graduação Profissional da FGV EAESP

Opinião | Cultura Organizacional em Fusões e Aquisições: O Pilar (Ainda) Negligenciado do Sucesso

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Por Pós-graduandos - FGV - EAESP

Muitas fusões e aquisições fracassam por gerarem os benefícios e sinergias esperados. A pergunta que surge é: por quê? Embora as empresas geralmente priorizem indicadores financeiros durante essas transações, negligenciam um fator crucial: a cultura organizacional.

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Vejamos um caso típico, para compreender como a falta de atenção à cultura pode comprometer o sucesso de uma aquisição. A empresa X, do setor de serviços financeiros, é uma organização com uma equipe de gestão competente e consolidada e um histórico de bom desempenho. Visando crescer e expandir negócios, a empresa X decidiu comprar a empresa Y.

Financeiramente, a empresa Y apresentava resultados sólidos, com crescimento contínuo na base de clientes e na receita. No entanto, a estratégia de integração da Empresa X envolveu mudanças profundas na estrutura organizacional, substituindo os líderes da adquirida e alterando a maneira como as pessoas interagiam com os clientes.

Essas mudanças não consideraram a cultura organizacional existente, gerando insatisfação, perda de talentos e permitindo que concorrentes capitalizassem sobre o momento de fragilidade criado. Esta aquisição, como muitas outras, destruiu em lugar de criar valor.

Este caso revela que o sucesso de uma fusão ou aquisição depende tanto da dimensão estratégica do negócio quanto da dimensão cultural. Apesar de a modelagem financeira ser fundamental, os profissionais muitas vezes presumem que as equipes da empresa adquirida se adaptarão automaticamente à nova estrutura, sem considerar como a cultura organizacional influencia a operação. Esse erro pode custar caro.

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Empresas que buscam maximizar os benefícios financeiros de uma fusão geralmente focam em cortar custos, eliminar redundâncias e aumentar receitas. No entanto, sem um plano para integrar as culturas organizacionais envolvidas, essas estratégias podem desmoronar.

A cultura organizacional é um padrão de princípios e comportamentos que se desenvolvem à medida que um grupo aprende a resolver seus problemas. Essa dinâmica precisa ser respeitada e cuidadosamente gerida para que a fusão seja bem-sucedida.

A consultoria McKinsey, em estudo de 2017, revelou que muitas empresas envolvidas em fusões e aquisições sofrem quedas significativas em suas receitas e valores de mercado. Uma das razões para isso é justamente subestimar o impacto da dimensão cultural. As organizações frequentemente falham em planejar adequadamente a integração das culturas organizacionais.

Um exemplo recente e relevante desse tipo de problema foi a fusão entre Natura e Avon, anunciada em 2020. A expectativa era que os pontos fortes das duas empresas se complementassem, formando uma gigante global no setor de cosméticos. No entanto, quatro anos depois, os resultados ficaram aquém do esperado, em parte devido às diferenças culturais entre as duas empresas. O que funcionava para cada uma delas separadamente não se traduziu com sucesso no contexto de uma empresa unificada. Isso ressalta a importância de um planejamento cultural cuidadoso para evitar que diferenças internas minem o potencial da fusão.

Mas como as empresas podem evitar esses erros? O primeiro passo é mapear as culturas organizacionais envolvidas, compreendendo as diferenças nos modos de interação, níveis de autonomia e sistemas de decisão. Esse mapeamento permite uma análise mais precisa de como as duas culturas podem coexistir e quais adaptações serão necessárias para que a integração seja fluida.

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Além disso, comparar os modelos de negócios das empresas envolvidas pode revelar questões que não são visíveis em uma primeira análise financeira. A integração bem-sucedida não depende apenas de sinergias operacionais, mas também de como os talentos das duas empresas poderão interagir e se desenvolver em um novo ambiente.

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Outro ponto crítico é evitar a imposição arbitrária de uma cultura dominante. A suposição de que a empresa compradora deve ditar as regras e impor sua cultura à empresa adquirida é um erro comum que gera resistência e descontentamento. Em vez disso, as empresas devem buscar um modelo de integração que valorize e combine os aspectos positivos das duas culturas, permitindo que talentos de ambas as partes floresçam.

A retenção de talentos também é fundamental. Identificar as pessoas chave nas duas organizações e implementar iniciativas de retenção ajuda a minimizar a perda de profissionais valiosos. Essas iniciativas devem ser acompanhadas de ações concretas para garantir que esses indivíduos se sintam parte integrante da nova estrutura e vejam oportunidades de crescimento e desenvolvimento.

Voltando ao exemplo da Empresa X, a falta de uma estratégia clara para integrar a da adquirida resultou na saída de muitos talentos. Concorrentes rapidamente aproveitaram a oportunidade para contratar esses profissionais, e a empresa viu seu domínio de mercado ameaçado. Um planejamento cultural adequado poderia ter prevenido esse desfecho.

Conclui-se, portanto, que uma análise detalhada da cultura organizacional deve ser parte integral de qualquer processo de fusão ou aquisição. Além das modelagens financeiras, é essencial definir qual tipo de cultura será adotada pela nova organização, com regras claras e ouvindo os colaboradores para entender a dinâmica informal que sustenta a operação.

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A fusão de duas empresas deve ser vista como a fusão de dois ecossistemas. Cada um tem suas próprias regras, comportamentos e dinâmicas. Integrá-los não é apenas uma questão de cortar custos ou aumentar receitas, é um desafio que envolve alinhar valores, comportamentos e expectativas. Ao olhar para a cultura organizacional com o mesmo nível de atenção dedicado aos indicadores financeiros, as empresas podem aumentar significativamente as chances de sucesso e criar organizações mais fortes e resilientes.

 

Alison Ramon Santos e Silva - Pós-graduando do Doutorado Profissional em Administração da FGV EAESP e executivo do setor financeiro, atualmente ocupando o cargo de Diretor de Empreendedorismo no Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à fome.

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