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Banco Central precisa elevar ainda mais os juros quando o Ministério da Economia não faz sua parte

Política fiscal não está entre as atribuições do presidente do Banco Central, mas afeta diretamente o trabalho da autoridade monetária

colunista convidado
Foto do author Henrique  Meirelles
Por Henrique Meirelles

Em um evento na semana passada, o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, tocou no ponto importante da incerteza sobre a política fiscal de 2023. As recentes medidas que ampliaram o gasto público com objetivos eleitorais devem se tornar permanentes. Campos Neto repetiu a dúvida que estava na última ata do Copom: sendo permanentes, como estes novos gastos serão financiados? Não há resposta.

A política fiscal não está entre as atribuições do presidente do Banco Central, mas afeta diretamente o trabalho da autoridade monetária. O controle dos juros busca reduzir a quantidade de dinheiro em circulação para conter a inflação. Quanto mais responsável é a política fiscal, menor a taxa de juros necessária para atingir o objetivo. Se ocorre o contrário, e o Banco Central se vê sozinho no combate à inflação, maiores são os juros.

Paulo Guedes, ministro da Economia de Jair Bolsonaro, e Roberto Campos Neto, presidente do Banco Central; governo federal estourou o teto de gastos nos últimos dois anos e não há sinal de se - ou como - o cumprirá em 2023 Foto: Ueslei Marcelino/ Reuters - 27/4/2020

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Em condições como as atuais, em que o Banco Central busca recolocar a inflação na trajetória da meta, seria essencial uma política fiscal responsável. Infelizmente, não é o que temos. O governo federal estourou o teto de gastos nos últimos dois anos e não há sinal de se - ou como - o cumprirá em 2023. O Banco Central atua sozinho.

Percebemos o valor do trabalho conjunto no passado. No início da minha gestão no BC, em 2003, elevamos os juros para controlar a inflação e estabilizar a economia. O Ministério da Fazenda aceitou o desafio de fazer a sua parte e atingimos um superávit primário de 4,35% do PIB. A inflação foi controlada, o país pagou sua dívida com o FMI e cresceu. No final da minha gestão, com a política fiscal do governo mais solta, tivemos que aumentar a taxa de juros.

Em 2016, quando assumi o Ministério da Fazenda em uma das piores crises da história, aprovamos o teto de gastos. Foi um sinal forte de responsabilidade fiscal. O risco-país caiu após três anos, a curva de juros futuros caiu e a incerteza diminuiu, o que permitiu ao Banco Central reduzir os juros mais rápido e para patamares menores.

Ampliar gastos sociais é importante no momento. Contudo, para isto é preciso cortar despesas desnecessárias - deve-se buscar reformas que abram espaço para esta ampliação. Quando a política fiscal não faz sua parte, o Banco Central precisa elevar mais os juros para trazer a inflação à meta. É uma fórmula negativa: gasta-se mais com benefícios sociais, os juros sobem mais para segurar a inflação, a economia desacelera e gera menos empregos. A melhor política social que existe é o emprego. O gasto social deve complementar a criação de empregos. Gastar com responsabilidade faz bem ao social.

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