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De pivô da Lava Jato à ‘refinaria do futuro’ de Lula 3: relembre o histórico de Abreu e Lima

Símbolo de mau uso de dinheiro público durante as gestões petistas, unidade receberá até R$ 8 bilhões em investimentos para produzir hidrogênio e metanol verde

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Por Redação
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RIO - Refinaria que foi pivô da Operação Lava Jato, a Abreu e Lima (Rnest), em Pernambuco, está sendo recuperada pelo governo Lula 3 em seu plano para fazer a Petrobras voltar a crescer. Até 2028, a previsão é que a unidade receba entre R$ 6 bilhões e R$ 8 bilhões em investimentos, em um projeto de ampliação com início previsto para o segundo semestre deste ano.

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As obras, anunciadas no início deste ano, em evento com a presença do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, ficarão a cargo das construtoras Andrade Gutierrez e Odebrecht, hoje Novonor, as mesmas envolvidas no escândalo de corrupção que ficou conhecido como Petrolão. As duas empresas estão entre as vencedoras da licitação para a complementação da refinaria, como mostrou o Estadão.

O plano da Petrobras é aumentar em 160% a capacidade de processamento da Abreu e Lima. A unidade passará a ter uma capacidade de processamento de 260 mil barris de petróleo por dia — atualmente, sua produção é de 100 mil barris processados diariamente.

O presidente da Petrobras, Jean Paul Prates, se referiu em janeiro à refinaria como “uma máquina maravilhosa, do futuro”. “Não vai ser uma lata velha do fim do petróleo”, afirmou.

Refinaria de Abreu e Lima (PE), uma das principais obras investigadas pela Lava Jato Foto: Wilton Jr/Estadão

“Quem aí estiver dizendo que estamos recuperando uma refinaria que não tinha mais de existir, uma refinaria feia e velha, digo que essa é a refinaria do futuro, da virada. Isso aqui (Rnest) não faz combustível fóssil, isso aqui faz energia líquida. Hoje, o mais acessível para a população ainda é o hidrocarboneto, mas essa refinaria vai produzir hidrogênio, e-metanol (metanol verde), o combustível dos navios do futuro, vai produzir diesel renovável 100% de origem vegetal”, disse, na ocasião.

Construída entre 2005 e 2014, a Rnest se tornou um dos maiores símbolos do mau uso do dinheiro público do País. Com um custo inicial de R$ 7,5 bilhões, as obras do empreendimento consumiram quase R$ 60 bilhões. Relembre, a seguir, as denúncias envolvendo a refinaria.

Histórico

As obras da refinaria Abreu e Lima foram inauguradas em 16 de dezembro de 2005, em evento com os então presidentes Lula e Hugo Chávez (Venezuela), que reviraram concreto e posaram para fotos. Por mais de duas horas, sob um sol de 35ºC em Ipojuca, na região metropolitana do Recife, eles discursaram para cerca de 4 mil pessoas no que seria, então, o maior investimento da Petrobras em mais de 25 anos: a construção da Rnest.

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Durante sua fala, o petista definiu o ditador sul-americano como “amigo irmão”. O projeto foi pensado em parceria com a estatal venezuelana PDVSA, inicialmente em um acordo entre o governo petista e o regime chavista.

Lula ao lado de Jean Paul Prates, atual presidente da Petrobras; os dois estiveram na refinaria para cerimônia de lançamento das obras Foto: Ricardo Stuckert / Presidência da República

A Petrobras seria responsável por 60% dos investimentos, e os 40% restantes seriam aportados pela Venezuela, o que nunca aconteceu. Com a desistência do país vizinho, a Petrobras decidiu construir sozinha, inicialmente, apenas um dos dois conjuntos (trem) de refino.

A Rnest foi a primeira refinaria construída no Brasil após 34 anos. A unidade está localizada no Complexo Industrial Portuário de Suape, a 45 quilômetros de Recife. É a mais moderna refinaria da estatal, com a maior taxa de conversão de óleo bruto em diesel, combustível que responde por 70% da produção da unidade.

Mas o que deveria ser o início da independência para o refino de petróleo brasileiro acabou envolvido em um esquema de desvio de recursos da Petrobras. A obra, que sofreu um atraso de três anos para o início de sua operação parcial, foi alvo ainda de processos na Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e no Tribunal de Contas da União (TCU).

Lava Jato

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O empreendimento foi tocado pelas empreiteiras Odebrecht, OAS, Camargo Corrêa e Queiroz Galvão. De acordo com a delação premiada do ex-executivo da Odebrecht Márcio Faria da Silva, as obras na refinaria teriam rendido R$ 90 milhões em propinas a ex-executivos da estatal ligados ao PP, PT e PSB.

A delação se desdobrou em apurações na Justiça Eleitoral e na esfera criminal. O ex-diretor de Abastecimento da Petrobras Paulo Roberto Costa foi condenado a sete anos e meio de prisão por organização criminosa e lavagem de dinheiro desviado das obras da refinaria. Por decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), em 2018, os trechos da delação referentes a fatos supostamente criminosos ocorridos no âmbito da refinaria foram remetidos para a Justiça de Pernambuco, onde tramitam atualmente.

O capítulo da Abreu e Lima abriu as portas do esquema de corrupção e propinas que, segundo Costa, se instalou na Petrobras entre 2003 e 2014. Além de Costa, foram condenados o doleiro Alberto Youssef, peça central da Lava Jato, e outros seis investigados, entre eles o empresário Márcio Bonilho, do Grupo Sanko Sider. Foram fixadas penas que variam entre 11 anos e seis meses de reclusão, em regime inicial fechado, a quatro anos, cinco meses e 10 dias de reclusão, em regime inicial semiaberto.

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Investigação na CVM

As investigações não ficaram restritas às apurações na Lava Jato, a CVM condenou quatro antigos membros da diretoria executiva da Petrobras em processos administrativos envolvendo irregularidades na construção e em testes de Abreu e Lima e do Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro (Comperj). Ao todo foram aplicados R$ 1,6 milhão em multas e penas de inabilitação de executivos.

O órgão regulador do mercado de capitais brasileiro absolveu a ex-presidente Dilma Rousseff (PT) e outros integrantes de seu governo e do conselho da estatal acusados, como o ministro Guido Mantega e Luciano Coutinho, ex-presidente do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), apontados, inicialmente, como partícipes do esquema.

Relatório do TCU

Um relatório do Tribunal de Contas da União apontou indícios de superfaturamento de, pelo menos, R$ 121 milhões na obra da refinaria Abreu e Lima e acusou o presidente da estatal, José Sergio Gabrielli, de sonegar documentos. Os auditores vasculharam os contratos da refinaria e levantaram suspeitas de superfaturamento em quatro contratos que somam R$ 2,7 bilhões.

No relatório, o TCU diz que o custo da refinaria aumentou mais de oito vezes, “passando de US$ 2,4 bilhões para US$ 20,1 bilhões”.

“Desde sua concepção, em 2005, o custo da refinaria aumentou mais de oito vezes. O projeto sofreu, ao longo do tempo, diversas ampliações e redesenhos não suportados tecnicamente, antecipações de investimentos e cancelamentos, gerando prejuízos bilionários à Petrobras. Inicialmente previsto para estar concluído em 2011, até hoje o empreendimento não foi completamente terminado e opera com menos da metade da capacidade projetada, já tendo sido reconhecidas perdas no balanço no total de R$ 15,463 bilhões”, diz o relatório de 2021.

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