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Professor da PUC-Rio e economista-chefe da Genial Investimentos, José Márcio Camargo escreve quinzenalmente

Opinião|Meta contínua pode afetar autonomia do Banco Central

Sem ter um ponto de referência, o novo regime se torna mais influenciável por decisões políticas

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O parágrafo 19 da ata da última reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), ao afirmar que “a avaliação predominante (dos membros do comitê) foi de que a continuação do processo desinflacionário em curso, com consequente impacto sobre as expectativas, pode permitir acumular a confiança necessária para iniciar um processo parcimonioso de inflexão na próxima reunião”, gerou algum mal-estar entre os investidores.

A questão não é a decisão em si, caso ela venha a efetivamente se concretizar. Mas a mudança brusca do teor do comunicado pós-reunião, se comparada à ata. A pergunta é: por que não foi divulgada no comunicado? Por que esperar a ata? A autonomia do Banco Central foi preservada? O questionamento é ainda difuso e pouco consistente, mas pode afetar as expectativas para a inflação em horizontes mais longos, principalmente a partir de 2025, com mudança do presidente do Banco Central.

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O comportamento das expectativas vai também refletir em como os investidores vão avaliar a decisão do Conselho Monetário Nacional (CMN) de manter a meta para a inflação em 3,0% e, ao mesmo tempo, mudar o regime de metas a partir de 2025, de ano-calendário para meta contínua.

Não foi uma decisão surpreendente. Essa era a expectativa da maior parte dos investidores. A surpresa, a nosso ver positiva, foi a mudança passar a valer apenas em 2025, ou seja, com a nova diretoria do Banco Central.

Banco Central tem a função de tentar traze a inflação para o centro da meta, entre outras Foto: Marcello Casal Jr. / Agência Brasil

A manutenção da meta em 3,0% é uma decisão positiva, porém a mudança do regime para meta contínua pode afetar a autonomia do Banco Central.

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A meta do ano-calendário cria um objetivo claro a ser perseguido pelo Banco Central e define um ponto de avaliação da política monetária. O objetivo não é atingir a meta no ano-calendário, mas sim no horizonte relevante da política monetária, que hoje já é 2024. Nesse regime, o CMN define a meta politicamente, e o Banco Central tem o mandato para atingir a meta, sem interferência política.

A mudança para meta contínua, além de eliminar esse ponto de referência, deixa em aberto várias questões: quem vai definir o horizonte de política monetária? Com base em que critérios? Qual o papel do CMN nesse processo? Sem ter um ponto de referência a ser perseguido, o regime se torna menos técnico e mais influenciável por decisões políticas. Os efeitos sobre a autonomia do Banco Central e sobre as expectativas para a inflação a partir de 2025 são imprevisíveis.

Opinião por José Márcio de Camargo

Professor aposentado do Departamento de Economia da PUC-Rio, é economista-chefe da Genial Investimentos

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