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Economista e ex-diretor de Política Monetária do Banco Central, Luís Eduardo Assis escreve quinzenalmente

Opinião|Hoje o único instrumento usado para combater a inflação é a Selic

Existem formas de aumentar a eficácia da política de combate à inflação e depender menos dos juros altos

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Foto do author Luís Eduardo Assis

É preciso repensar a maneira que o Brasil combate a inflação. Digamos que haja um evento climático que jogue os preços agrícolas nas alturas. Quem perde com isso? Os mais pobres, principalmente, porque o peso dos produtos alimentares é maior no orçamento das famílias de baixa renda. Qual o remédio que temos na prateleira? Juros altos. Quem ganha com isso? As famílias ricas, que passam a receber mais para investirem seus recursos. Ou seja, primeiro o pobre perde; depois, o rico ganha.

Um analista de mercado interromperia agora para lembrar que, como o pobre perde com a inflação, os juros altos que combatem a elevação de preços também acabam por beneficiá-lo. Então tá.

Taxa básica de juros está em 13,75% ao ano e Banco Central deve decidir sobre os rumos da Selic na próxima semana  Foto: Dida Sampaio/Estadão

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O fato é que o único instrumento que utilizamos hoje para enfrentar a inflação é a elevação da Selic. Devemos admitir que, mesmo quando necessários, juros altos são um flagelo. Moderar o seu uso deveria ser um imperativo. Eles potencializam a concentração de renda, podem ser devastadores para as empresas e aumentam os gastos públicos, o que impacta a relação dívida/PIB, causando cólicas no mercado financeiro e exigindo, logo adiante, corte de investimentos públicos e de outras despesas discricionárias.

É preciso ampliar o arsenal de medidas que combatem a inflação, de tal sorte a depender menos dos juros altos. Para começar, o governo precisa se convencer de que deflagrar uma política fiscal expansionista em tempos de inflação alta só prolonga a agonia dos juros altos.

Também é necessário promover a desindexação de salários e contratos, algo que herdamos dos tempos da inflação muito alta e que hoje apenas aumenta a inércia e torna mais difícil o controle do processo inflacionário.

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Recompor os estoques reguladores da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), que foram praticamente zerados nos últimos anos, também ajudaria, da mesma forma que é urgente uma nova política de preços para os combustíveis, sem subsídios.

No âmbito do Banco Central (BC), seria útil também contar com os recolhimentos compulsórios, que, como consta do site da autoridade monetária, são “mais um dos mecanismos que o BC tem à disposição na sua caixa de ferramentas” para combater a inflação. Reduzir a volatilidade da taxa de câmbio também seria de bom grado.

O mais rápido, simples e fácil neste momento seria rever para cima a meta de inflação para 2024. Claro que há risco, mas ele será menor se a revisão for acompanhada pelo anúncio de um novo marco fiscal suficientemente ambicioso e verossímil. Há muito a fazer para aumentar a eficácia da política de combate à inflação e depender menos dos juros altos. Melhor começar logo.

Opinião por Luís Eduardo Assis

Economista. Autor de 'O Poder das Ideias Erradas' (Ed.Almedina). Foi diretor de Política Monetária do Banco Central e professor de Economia da PUC-SP e FGV-SP

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