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Novo governo precisa abandonar o tom de campanha e apontar rumos para a economia, dizem analistas

Fala de Lula em favor de aumento de gastos e contra a ‘tal da estabilidade fiscal’ provocou estresse no mercado financeiro nesta quinta-feira

Foto do author Luiz Guilherme  Gerbelli
Por Luiz Guilherme Gerbelli
Atualização:

A falta de clareza nas últimas sinalizações econômicas da equipe de transição de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) começou a provocar uma piora de humor do mercado financeiro com o governo eleito, avaliam economistas e analistas ouvidos pelo Estadão. Se na primeira semana havia um otimismo com o rumo da nova administração, a leitura dos últimos dias é diferente: o novo governo precisa baixar o tom ainda de campanha e apontar com clareza quais serão os passos na economia, sobretudo na área fiscal.

Nesta quinta-feira, 10, o mercado financeiro atingiu o seu ponto mais alto de estresse com o governo eleito e reagiu muito mal às falas de Lula. Em encontro com aliados, o petista criticou a estabilidade fiscal e defendeu a ampliação de gastos.

Lula fez discurso em defesa da ampliação de gastos (Photo by Sergio Lima / AFP) Foto: SERGIO LIMA / AFP

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Depois da fala de Lula, o Ibovespa, principal índice da Bolsa de Valores, a B3, que já estava em queda, piorou ainda mais, e o dólar passou a subir com mais força. A moeda norte-americana encerrou o dia em alta de 4,14%, cotada a R$ 5,3966. O Ibovespa recuou 3,35%, aos 109.775 pontos.

O mercado brasileiro operou na contramão do resto do mundo, que teve uma sessão de alívio, com forte alta dos principais índices acionários.

“Quanto mais o novo governo demora para fazer essa transição, mais o mercado vai ficar nervoso”, diz Luciano Sobral, economista-chefe da Neo Investimentos. “O mercado está colocando um preço para esse cenário de mais gasto, sem uma fonte de financiamento clara.”

Já havia uma preocupação em relação ao rumo das contas públicas com a informação de que, na equipe de transição petista, ganha força a opção de retirar as despesas do Auxílio Brasil do teto de gastos de forma permanente.

“Hoje, as declarações (do Lula) coroam uma percepção de uma mudança dessa linha (mais otimista) da semana passada. Agora, há uma visão de muita preocupação com o que vem pela frente”, diz Silvio Campos Neto, economista da consultoria Tendências. “É um movimento (de hoje) que marca uma reversão das expectativas do mercado com o novo governo.”

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A equipe do PT trabalha numa Proposta de Emenda Constitucional (PEC) da Transição com o objetivo de furar o teto de gastos para garantir o pagamento do Auxílio Brasil de R$ 600 no ano que vem. De acordo com o senador Marcelo Castro (MDB-PI), relator-geral do orçamento de 2023, o texto da proposta pode ser definido ainda nesta quinta-feira.

Nesse cenário de aumento de gastos, a grande preocupação é de que a nova administração Lula seja parecida com os últimos anos da gestão Dilma Rousseff, em que houve uma deterioração das contas públicas do País. Durante a campanha, por exemplo, Lula criticou sucessivamente o teto de gastos, regra que limita o crescimento das despesas à inflação do ano anterior, mas ainda não indicou qual será a sua política fiscal nos próximos quatro anos.

“Cada vez que os sinais vão na linha de deterioração do gasto, mais o governo precisará sinalizar maior responsabilidade com um ministro mais técnico do que político. E talvez isso nem seja garantia, pois vai depender no final de como será desenhada a nova regra fiscal”, afirma Sergio Vale, economista-chefe da consultoria MB Associados.

Lula ainda não indicou qual nome será o responsável por conduzir a economia em seu novo governo e afirmou que nomes integrantes da transição podem ser ministros ou não. Na área econômica, André Lara Resende, Persio Arida, Nelson Barbosa e Guilherme Mello integram a equipe de transição.

“Esse movimento do mercado é uma combinação de várias coisas: encaminhamento da PEC da Transição bem pior do ponto de vista fiscal com relação ao esperado, indefinição de qual vai ser a equipe econômica e qual é o plano (fiscal) de médio prazo”, afirma Ricardo Denadai, CEO e economista-chefe da ACE Capital.

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