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Política de Lula para a Petrobras empurra ‘junior oils’ para fusões e aquisições; entenda

Sem oferta de campos maduros da estatal, empresas menores terão de se juntar e comprar concorrentes ou buscar ativos no exterior

Por Gabriel Vasconcelos (Broadcast)
Atualização:

RIO – O fim da política de desinvestimento da Petrobras, no governo Lula, deve provocar uma onda de fusões e aquisições entre as pequenas e médias petroleiras brasileiras, que hoje estão altamente capitalizadas – ou seja, tem dinheiro em caixa para gastar. Mas, sem oferta de campos maduros da estatal (em produção há mais de 25 anos ou com produção acumulada de pelo menos 70% do potencial estimado) para comprarem, essas empresas, chamadas de independentes ou “junior oils”, terão duas alternativas: se juntar e comprar ativos das concorrentes ou buscar ativos no exterior para aumentar sua produção.

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Até 2022, a Petrobras mantinha um plano de desinvestimento que previa a venda de uma série de ativos, como os campos maduros e as refinarias. Entre 2017 e 2020, a companhia anunciou a venda de 230 áreas, sendo 194 campos em produção e 36 blocos exploratórios. Esse plano, no entanto, foi paralisado na gestão petista. Sob a administração de Lula, a Petrobras interrompeu o programa de privatização de refinarias e venda de ativos.

Nesse cenário, segundo especialistas, o caminho mais viável para as pequenas e médias petroleiras seria o de fusão e aquisição uma vez que arranjos desse tipo trazem mais sinergias e redução de custos. Uma das operações que pode desencadear esse movimento no mercado é a fusão entre 3R Petroleum e PetroReconcavo. A união entre as duas empresas pode dar origem a terceira maior operadora de petróleo do País, com produção em terra de mais de 80 mil barris de óleo equivalente por dia (boed) já em 2024, só atrás de Petrobras e Prio.

O negócio que começou a movimentar o mercado no início do mês passado é bem-visto entre especialistas. Se concluído, inauguraria uma corrida por hegemonia e menores custos no mercado. A 3R ainda avalia internamente fazer a proposta à PetroReconcavo. Procuradas, a PetroReconcavo informou que não vai comentar o assunto e a 3R não retornou a solicitação até o momento da publicação.

Exploração de petróleo no Brasil pode enfrentar consolidação Foto: MARCOS DE PAULA/ESTADÃO

Fusões e aquisições no Nordeste

O presidente da Associação Brasileira das Empresas Independentes de Petróleo (Abpip), Marcio Felix, não comenta o caso em específico, mas faz coro ao dizer que esse tipo de consolidação é o caminho natural do mercado de campos maduros brasileiro nos próximos anos.

Para ele, a formação de uma grande empresa focada em exploração e produção (E&P) onshore (em terra) significaria só o início de uma onda maior de aquisições. Nesse segmento, haveria ativos apropriados à consolidação em Estados como Espírito Santo, Alagoas e Sergipe, diz Félix sem entrar em detalhes.

Polo da 3R Petroleum: mercado aguarda fusão de empresa com PetroReconcavo Foto: 3R Petroleum

No início desse mercado, boa parte dos campos terrestres em cada um dos três dos Estados foi comprada por uma companhia. A Seacrest, por exemplo, tem 31 campos onshore no Espírito Santo; a Carmo Energy tem 11 campos em Sergipe; e a Origem tem sua produção mais avançada em Alagoas, com cinco campo e 600 poços, além de operação significativa na Bahia (Bacia Tucano Sul) e presenças no Rio Grande do Norte e Espírito Santo.

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Mais focada em gás, a Eneva atua no Maranhão e no Amazonas, enquanto 3R e a PetroReconcavo concentram suas atuações no Rio Grande do Norte e Bahia.

Um presidente de petroleira que não quis se identificar define a tendência de fusões e aquisições dentro desse mercado como “inexorável”, e atribui isso à natureza do negócio: um mercado de escala que precisa de tamanho para ter custo barato. Quem não tiver tamanho, vai sofrer cada vez mais, diz ele.

Outro executivo de “junior oil” aponta a eventual empresa resultante da fusão de 3R e PetroReconcavo como a futura consolidadora do mercado, a partir do Nordeste. Para ele, se a fusão ocorrer, a empresa vai esbarrar na Eneva, que tem negócio muito bem estabelecido, mas deve avançar sobre uma série de negócios que atuam na região.

Uma fonte familiarizada com as negociações dentro da 3R para fusão com a PetroReconcavo confirma. Segunda essa fonte, a Origem Energia tem ativos na Bahia, de muita sinergia com o portfólio da possível nova empresa. A próxima empresa a entrar nesse bolo pode sim ser a Origem, mas há outras empresas no Nordeste e no Espírito Santo. O futuro da consolidação no onshore passa muito fortemente por essa primeira fusão (3R e Petroreconcavo). Procurada, a Origem não quis se pronunciar.

Offshore

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No offshore (em alto mar), analistas destacam os potenciais de Prio, Enauta e 3R Offshore, mas veem as duas primeiras com mais chances de se tornarem “consolidadoras” no mar em função do conforto financeiro de seus balanços.

No fim de janeiro, o presidente da Prio, Roberto Monteiro, disse que a empresa está preparada para novos investimentos “na casa de bilhão” para a aquisição de novos campos. Ele disse que a empresa seguirá focada na aquisição de campos maduros, mas não pretende comprar ativos com potencial baixo.

Na mesma linha do que havia dito em entrevista ao Estadão/Broadcast no início daquele mês, Monteiro reiterou que a Prio observa campos no Golfo do México, nos Estados Unidos, mas que o foco da companhia em 2024 será o desenvolvimento da produção nos campos de Wahoo e Albacora Leste, na Bacia de Campos.

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Já a Enauta fez uma série de aquisições no apagar das luzes de 2023 a fim de diversificar a produção. A companhia comandada por Décio Oddone se firmou no caminho da expansão com a compra de dois campos da Petrobras, Uruguá e Tambaú, no pós-sal da Bacia de Santos, além da infraestrutura de escoamento de gás e da plataforma FPSO Cidade de Santos.

No mesmo período, a Enauta comprou a fatia de 23% do Parque das Conchas, na Bacia de Campos, detida pela QatarEnergy Brasil. A Shell opera o ativo com 50% de participação e ainda tem como sócia a ONGC, com 27%. Juntas, todas essas aquisições obrigam a Enauta a um desembolso de cerca de US$ 208,5 milhões (R$ 1 bilhão).

No mar, dizem os especialistas, a especificidade das operações pode ser um limitador para fusões e aquisições, mas a capilaridade do mercado e os elevados ganhos com sinergias como o uso compartilhado de embarcações podem pesar. A onda de sinergia no offshore pode ser rápida. Hoje há muitas ‘empresas monoativos’ ou com operações menores que podem ser receptivas a uma proposta das maiores, dizem especialistas. Procurada, Enauta não se pronunciou. A Petrobras foi consultada, mas até o momento desta publicação não havia respondido.

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