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'O mundo olha o Brasil com preocupação'

Para economista,escândalos de corrupção levaram a uma perda de confiança e de fé nas instituições brasileiras

Por JAMIL CHADE
Atualização:

GENEBRA - "O mundo olha hoje o Brasil com preocupação." O alerta é do economista Jeffrey Sachs, considerado pela revista Time uma das cem pessoas mais influentes do mundo e diretor do Instituto da Terra, na Universidade Columbia. Em entrevista exclusiva ao Estado em Genebra, Sachs colocou três prioridades à pessoa que estiver na Presidência do Brasil nos próximos quatro anos: atacar a corrupção, investir em tecnologia e ter contas em dia. Mas deixou claro que, hoje, a comunidade internacional já não se entusiasma com o caminho traçado pelo País. "Há um enorme volume de problemas e escândalos de corrupção que levaram a uma perda de confiança e de fé nas instituições brasileiras por muita gente", alertou. Sachs hoje se dedica a defender a economia sustentável. Segundo ele, qualquer presidente brasileiro terá de assumir esse princípio para ser ao mesmo tempo competitivo e coerente com as necessidades de preservação do País. O americano é o atual conselheiro especial da ONU para as Metas do Milênio e seus livros estão entre os principais best-sellers de economia dos últimos dez anos. Em 2005, publicou O Fim da Pobreza, seguido por Common Wealth (2008) e O Preço da Civilização, de 2011. A seguir, os principais trechos da entrevista: Os próximos meses serão fundamentais nas negociações para um acordo sobre o clima. Mas, ao mesmo tempo, estamos vendo que a economia mundial não consegue crescer. Como é que essa equação vai ser resolvida? O mundo hoje não é sustentável socialmente, economicamente ou ambientalmente, Não vamos conseguir reverter isso, a não ser que haja a promoção de uma mudança na direção do crescimento. Ao mesmo tempo que estamos vendo os meses de agosto e setembro mais quentes da história, também estamos vendo que as grandes economias do mundo sofreram um freio porque não existem investimentos. De um lado, temos políticos que querem projetos de curto prazo para poder ganhar eleições. Mas isso não será mais suficiente para reverter a tendência. De outro lado, os mercados e as bolsas estão focados no nanossegundo, quando na verdade precisavam pensar em termos de uma década. Isso é uma inversão do que precisamos. 2015 é o ano crítico para negociações ambientais e para o modelo de economia que vamos construir. Mas a realidade é que, se no ano que vem o processo fracassar, ninguém voltará para mais uma reunião em 2016. O que está em jogo é a estabilidade do mundo. Por muito tempo, os países emergentes, entre eles o Brasil, argumentavam que não era justo que países ricos tivessem tido a possibilidade de se desenvolver e se industrializar nos últimos 50 anos sem nenhum limite, enquanto agora essas condições ambientais são exigidas dos emergentes. Isso é ainda um argumento válido? Não é mais uma justificativa que possa ser aceita. Todos terão de fazer alguma coisa e de forma séria. Felizmente, o Brasil está bem situado para lidar com o que pode ser exigido no mundo. O País tem biocombustíveis, um amplo potencial de energia hidrelétrica e potencial para desenvolver tecnologia. Não será uma barreira ao Brasil. Mas, claro, o País tem dimensões continentais e a biodiversidade poderá sofrer bastante com as mudanças climáticas. Na verdade, a degradação é um assunto que acompanha o Brasil por séculos. A questão da sobrevivência da Amazônia, da Mata Atlântica, isso tudo significa que o Brasil terá de ser um líder global nesses assuntos ambientais. A desaceleração da economia brasileira é um obstáculo para modificar o padrão de crescimento e adotar regras exigindo maior sustentabilidade? Não é um obstáculo. A recessão é um aviso claro de que as coisas precisam mudar de direção para que haja crescimento. Precisamos de um crescimento conduzido por investimentos que sejam sustentáveis, e o que vemos agora é que investidores não sabem onde investir nem em quais setores devem investir. Há muita incerteza e uma falta de liderança que aponte até mesmo qual o combustível e qual o meio de transporte que devem ser a aposta. Isso é importante para justamente indicar ao investidor onde estará o mercado no futuro. É verdade que essa incerteza não existe apenas no Brasil. Mas qual a forma de garantir que esses investimentos ocorram? O único caminho é de apontar para uma maior clareza sobre como o mundo vai reformar o sistema de energia. Isso ajudaria muito a definir que tipo de investimentos devem ocorrer. Mas a realidade é que os investimentos hoje estão paralisados no Brasil, nos EUA e na Europa. Há dinheiro e há opções. Mas ninguém está liderando e indicando para onde ir. Quais devem ser prioridades ao Brasil para voltar a crescer? Acho que o País deve começar com a tecnologia e a futura capacidade de desenvolver novos produtos. Quando eu viajo em um avião da Embraer, sinto orgulho pelo Brasil. É esse tipo de investimento que o Brasil precisa para voltar a crescer no futuro. Portanto, excelência industrial e tecnológica são as áreas para o crescimento do Brasil no longo prazo. Isso pode ser no setor de transporte, mas também em energia, serviços de informática e no agronegócio. E da parte do governo, o que pode ser feito? Claramente o Brasil precisa ser mais bem administrado. Há um enorme volume de problemas e escândalos de corrupção que levaram a uma perda de confiança e de fé nas instituições brasileiras por muita gente. Preciso dizer que, nos EUA, há também muita corrupção. Portanto, não estou apontando o dedo apenas ao Brasil. Há muito dinheiro na política. Não é apenas um slogan, mas a realidade é que nossas sociedades não podem funcionar se não há uma legitimidade básica, honestidade e boa administração. Além disso, a situação financeira do Brasil precisa ser transparente, clara e sustentável. As dívidas públicas não podem continuar a ser tão elevadas. Se houver nuvens no cenário financeiro, isso também será uma enorme barreira. Que recomendações o sr. daria a quem ocupar a cadeira de presidente pelos próximos quatro anos no Brasil? Vejo o Brasil como um país que viveria os ideais do crescimento sustentável. É o lugar mais bonito do mundo e integrar o mundo natural e a economia seria uma agenda perfeita para o Brasil. Portanto, espero que um próximo governo use o desenvolvimento sustentável como um princípio organizacional para o País. Governar de forma honesta e promovendo tecnologia, que é onde a competitividade estará no futuro. Há alguns anos havia uma euforia no mundo sobre o Brasil. Como o País é visto hoje? O mundo olha hoje o Brasil com preocupação pelo caminho que tomou.

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