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Graduação a distância aumenta 700% em 10 anos; média é de 171 alunos por professor na rede privada

Ministro da Educação demonstrou preocupação com o crescimento vertiginoso da EAD no País e vai aprimorar a regulação do setor

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Por Paula Ferreira
Atualização:

Dados do Censo da Educação Superior divulgados pelo Ministério da Educação (MEC) nesta terça-feira, 10, mostram uma explosão da educação a distância (EAD) no Brasil. Segundo as estatísticas, o número de cursos na modalidade ofertados no País aumentou 700% nos últimos dez anos, saindo de 1.148 em 2012 para 9.186 no ano passado.

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O crescimento na oferta de cursos EAD tem sido registrado no País desde os anos 2000. O ritmo de criação de novos cursos aumentou a partir de 2018, impulsionado pela edição de um decreto do então presidente Michel Temer no ano anterior, que flexibilizou a abertura de polos de educação a distância. Desde então, houve um crescimento de 189,1% na oferta de cursos nessa modalidade.

Ainda de acordo com o MEC, considerando dados da rede privada, que detém a maior parte das matrículas de ensino superior no País, o ensino a distância apresenta uma expressiva quantidade de alunos por professor. Os dados mostram que o número de alunos por professor na EAD é mais de sete vezes maior do que no presencial. A média é de 171 alunos para cada professor nos cursos a distância e 22 estudantes por docente na modalidade presencial.

A análise da educação superior é feita anualmente pelo Instituto de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) em instituições de ensino públicas e privadas. Nos últimos anos, o Censo da Educação Superior vem mostrando algumas tendências da etapa como o crescimento da EAD sobretudo depois da pandemia de covid-19. A edição do ano passado mostrou que seis em cada dez estudantes ingressaram no ensino superior na modalidade EAD. Durante a pandemia, o ensino presencial encolheu 28%.

O ministro da Educação, Camilo Santana, demonstrou preocupação com o aumento vertiginoso da EAD no País. Segundo ele, o MEC vai aprimorar a regulação do setor, implementando novas diretrizes para qualificar os cursos a distância.

“Estou bastante preocupado primeiro com a qualidade desses cursos. Claro que facilita muito a vida do trabalhador, que tem que trabalhar, se deslocar. Temos de avaliar qual tipo de curso ofertado para boa formação do profissional que possa ser a distância”, disse. “Não estamos aqui demonizando o ensino a distancia, não. Ele é importante para facilitar a vida. Mas, quero prezar pela qualidade da oferta desses cursos”, disse o ministro.

Camilo anunciou que foi suspensa a autorização de cursos a distância de Farmácia e também foi cancelada a discussão de uma portaria do ano anterior que se discutia cursos a distância de Direito, Odontologia e Psicologia.

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“Determinei realizar uma supervisão especial nos cursos a distância para rever todo o marco regulatório disso. A nossa preocupação não é o fato de ter um curso a distância, mas garantir qualidade nesse curso que está sendo oferecido para formação desse profissional. E é impossível determinados cursos serem feitos a distância”, argumentou o ministro.

Número de matrículas

O crescimento na quantidade de matrículas a distância é expressivo, passando de 1.113.850 em 2012 para 4.330.934 em 2022, um aumento de 289%.

Apesar do aumento, o número de matrículas na modalidade presencial ainda é maior do que na EAD: são 5.112.663. A tendência de alta na educação a distância, no entanto, indica que esse modelo poderá superar em breve o ensino tradicional.

Desde 2019, o número de estudantes que ingressam no ensino superior a distância é superior à quantidade de pessoas que entram na modalidade presencial. Em 2022, dado mais recente, foram 3.100.556 novos ingressantes na EAD, um recorde. Enquanto isso, no presencial foram apenas 1.656.172 novos alunos.

Em relação à oferta de vagas EAD, desde 2018, quando o ritmo de crescimento acelerou, houve um aumento de 139,5% na quantidade disponível. O ministro afirmou que o MEC avalia inclusive limitar “o crescimento indiscriminado” de vagas a distância.

“Exige de nós um sinal amarelo aceso, ou sinal vermelho aceso para que possamos tomar medidas importantes,” ressaltou o ministro.

Formação de professores

Outro ponto de preocupação do MEC é a formação de professores. Os dados do Censo mostraram que cerca de oito em cada dez estudantes que entram em cursos de Licenciatura optam pela modalidade a distância. Atualmente, 64% das matrículas nesses cursos são por EAD, o que demonstra que a maior parte dos professores de educação básica do País estão obtendo sua formação a distância.

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“Não podemos aceitar que a grande maioria dos cursos de Licenciatura do Brasil seja a distância”, disse Camilo Santana. “Não tenho dúvidas de que vamos ter desafios enormes em relação principalmente aos cursos de Licenciatura.”

O ministro destacou que dados do Exame Nacional de Desempenho de Estudantes (Enade) mais recentes mostraram que é preciso melhorar a qualidade dos cursos. Segundo o ministro, nessa perspectiva, o MEC vai reservar 40% das vagas remanescentes do Fundo de Financiamento Estudantil (Fies) para licenciaturas.

“Precisamos rever, porque o último Enade já mostrou que todas licenciaturas, numa escala de 0 a 10, estão abaixo de 5. Pedagogia tem 3,6 na escala de 0 a 10. E vamos aguardar o dado do novo Enade que será apresentado”, explicou.

Presidente da Associação Brasileira de Mantenedoras de Ensino Superior (ABMES), Celso Niskier destaca o papel da EAD na ampliação do acesso de estudantes às universidades. A ABMES é uma das instituições que participa do grupo de trabalho do MEC a respeito da reformulação das regras para o setor.

“EAD é fundamental para democratizar o acesso à educação superior. Sem ele nossas taxas não estariam crescendo, mas é necessário sempre que isso seja feito com uma qualidade importante. Conseguimos vencer a batalha da quantidade, agora nos cabe lutar pela qualidade”, defendeu Niskier.

Para José Roberto Covac, advogado especialista em direito educacional, é importante que o MEC revise os parâmetros de avaliação para que tenham maior eficiência ao medir a qualidade dos cursos. Ele defende também que esse processo deve ser feito com o objetivo de proporcionar a recuperação da instituição de ensino, e não apenas sua punição.

“O instrumento de avaliação precisa ser alterado sob a perspectiva da modalidade específica a distância, (considerando aspectos) como a questão da utilização da Tecnologia da Informação, da formação de professores dedicados a isso; a questão da interatividade, que precisa ser aferida na avaliação in loco ou virtual do curso a distância. Os indicadores de qualidade também precisam ser aprimorados”, opina.

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Especialista em ensino superior, Leandro Tessler, do Instituto de Física Gleb Wataghin da Unicamp, pondera que não se deve generalizar as críticas à educação a distância. “A EAD começou por iniciativa do próprio MEC. Não é intrinsecamente de má qualidade. É diferente da formação presencial e bem adaptada para um certa maneira de educar. É assim no mundo todo. O que não devemos é achar que EAD é a solução para tudo. Nesse sentido, preocupa o crescimento tão acelerado do EAD, que tem obviamente custo menor e alcance maior que a formação presencial”, analisa.

Segundo o pesquisador, é preciso que haja uma seleção criteriosa dos cursos que podem utilizar a modalidade, além de um controle rígido da qualidade a exemplo do que é feito com cursos presenciais. “Há também a formação híbrida, em que cursos em EAD complementam a formação presencial. Todas as universidades brasileiras passaram por isso com a pandemia. Entendo que temos uma excelente oportunidade de incorporar isso na formação presencial.”

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