PUBLICIDADE

Foto do(a) blog

Instituições, sistemas e indicadores da educação superior, da ciência e da tecnologia no Brasil e no mundo

Alterar a Autonomia Univeritária: Emenda Pior Que o Soneto?

PUBLICIDADE

Por Roberto Lobo

Alterar a Autonomia Universitária: Emenda Pior Que o Soneto? Roberto Lobo* e Oscar Hipólito** 13 de maio de 2024 A autonomia das universidades paulistas propiciou uma liberdade na gestão orçamentária, com a possibilidade de redefinição dos gastos e investimentos por alínea tanto pela garantia de repasse de uma parcela do ICMS sem vinculações ou autorização do Estado, como pela regularidade deste repasse. Antes do decreto do governador de SP, em 2 de fevereiro de 1989, os repasses às universidades eram feitos de forma irregular e muitas vezes próximos ao final do ano, quando não havia tempo hábil para se efetuar compras de forma organizada. Muitas vezes os gestores eram obrigados a empenhar recursos em gastos que poderiam ser realizados em pouco tempo, mas que não seriam prioritários. As unidades mais fortes na pesquisa eram sistematicamente salvas com os recursos da FINEP. Quem nunca geriu uma autarquia não percebe o quanto de ineficiência é gerada por essa sistemática. Os repasses em duodécimos eliminaram boa parte desses problemas. A possiblidade de ter garantida uma parcela mensal do orçamento permitiu aos gestores, não só à reitoria e às unidades acadêmicas, poupar e investir em suas prioridades de instalações e equipamentos necessários, tornando mais eficiente a aplicação de recursos. A autonomia financeira também possibilitou orçamentos setoriais mais flexíveis, fugindo do orçamento histórico imobilizante e priorizando áreas em desenvolvimento, seja em qualidade ou em importância. Embora as contratações de funcionários no regime CLT já existissem antes da autonomia, esta permitiu uma maior flexibilidade na gestão de pessoal. No entanto, a legislação das autarquias impede que alguns problemas sejam resolvidos, como a flexibilidade nas contratações de docentes e a diferenciação de salários baseados em avaliações contínuas que levassem em conta o conjunto das atividades de cada professor e seu portfólio. Da mesma forma que todos aplaudem a vinculação das verbas da educação e saúde, a vinculação do orçamento das universidades ao ICMS é uma forma específica de vinculação, sem interferência política, que evita a dependência das decisões das secretarias ou ministérios. Eliminar essa vinculação poderia levar as universidades a dependerem novamente de decisões governamentais, sem qualquer garantia de que os repasses seriam feitos em tempo hábil. Neste caso, seria necessário encontrar outras fontes de receitas como, por exemplo, cobrar mensalidades dos estudantes (a gratuidade das universidades públicas é ponto de honra na visão majoritária da academia) para garantir um fluxo mínimo de recursos assegurados dentro de um cronograma previsto, a fim de evitar as crises que ocorrem, periodicamente, no sistema universitário federal quando faltam recursos até para pagar a conta de luz! Os estudos internacionais sobre as universidades líderes colocam a autonomia como um dos pilares da qualidade. Entretanto, quando se menciona o sistema de ensino superior da Califórnia como exemplo a ser seguido, não se explicita que todas as universidades públicas nos EUA são pagas e possuem múltiplas fontes de receitas: orçamento do estado, mensalidade, verbas federais para pesquisa, verbas privadas para pesquisa, doações privadas, cobrança de serviços ao público e aos estudantes, etc. A autonomia financeira e de gestão da USP, UNICAMP e UNESP tem defeitos, mas mostrou muito mais qualidades do que as previstas na época, aprimorando todos os indicadores acadêmicos durante sua vigência. Não será acabando com essa autonomia financeira que vamos eliminar a burocracia paralisante de nossas autarquias que ainda inibem, em boa parte, uma gestão mais eficaz e internacionalmente competitiva para nossas universidades. Não somente o ótimo é inimigo do bom, mas geralmente as emendas são piores que os sonetos porque atacam um ponto criticável, mudam sem analisar os reflexos destas ações e prejudicam o que estava indo bem! Há tantos pontos a serem melhorados na educação brasileira que não podemos correr o risco de estragar as 3 instituições que fazem parte das melhores universidades de pesquisa do Brasil e da América Latina.

*Roberto Lobo é PhD em física pela Purdue University, foi reitor da USP, é presidente do Instituto Lobo e pesquisador sênior do IEA/USP **Oscar Hipólito, Professor Titular do Instituto de Física de São Carlos, USP

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.