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Arquitetura, decoração e design

Veneza como canteiro

Por Ana Garrido
Atualização:

  Marcelo Lima ? O Estado de S.Paulo Ao longo de quase oito décadas de atuação profissional, Oscar Niemeyer, nosso maior arquiteto vivo, nunca se cansou de proclamar que a busca da beleza sempre teve um papel primordial na sua criação. Lógico que a ele sempre se impôs a função social da arquitetura, como faz questão de pontuar. Mas, ao mesmo tempo, sempre lhe pareceu natural que bons projetos produzissem surpresa. Gerassem, enfim, um espanto comparável ao do objeto artístico. Se assim o for ? e sua obra é plena de exemplos capazes de confirmar a tese ?, não chega a surpreender que, para muitos de seus colegas, a evolução tecnológica não seja também vista apenas sob o prisma da racionalização construtiva. Para um seleto grupo de arquitetos ? do qual ele é um digno representante ?, ela é uma ferramenta eficaz para se alcançar soluções cada vez mais exclusivas, complexas e, por que não, belas. ?Na arquitetura, muitas questões aparentemente individuais têm como base preocupações comuns. E é isso que esta edição da bienal se propõe a discutir?, afirma o arquiteto inglês David Chipperfield, diretor da Bienal Internacional de Arquitetura de Veneza, em cartaz até o dia 25. Um evento já célebre por se apresentar não como feira comercial ou portfólio de escritórios. Mas como um conjunto de instalações conceituais implantadas em meio a uma cidade que é, por si só, uma permanente exposição de edifícios. ?É preciso levar em conta a cidade. Se inserir nela. Jamais confrontá-la?, adverte Chipperfield sobre a dinâmica de realização do evento que, como em todos os anos, ocupa duas locações referenciais: os galpões do Arsenale de Veneza, construídos no século 16, onde foram alocados os arquitetos selecionados pela curadoria, e o Giardini, área ao ar livre repleta de pavilhões criados para sediar a bienal de arte local, onde se distribuem as representações nacionais convidadas (leia mais na pág. 10). ?Common Ground? (terreno comum), o tema deste ano, foi escolhido por Chipperfield para discutir sintonia de ideias em um evento que reúne nada menos que cem participantes, entre eles algumas estrelas máximas da constelação internacional. ?Arquitetos não são visionários solitários, mas profissionais que trabalham em colaboração. Seja com seus construtores, clientes ou mesmo com o público em geral?, declarou ele, procurando diluir um pouco o clima de rivalidade sempre pronto a se instalar entre seus convidados. ?Procuramos mostrar como a fluidez das formas que buscamos aplicar em nossos projetos são, de fato, resultantes de um intrincado equilíbrio de forças. Outra área de investigação que procuramos abordar foi o domínio da luz?, disse a arquiteta iraquiana Zaha Hadid, um dos mais incensados nomes da mostra, que este ano levou ao antigo arsenal vêneto Arum: uma gigantesca estrutura metálica plissada e rebitada. Destaques entre os demais escritórios de arquitetura convidados, os suíços do Herzog e de Meuron apresentaram em Veneza o plano de construção da Elbphilharmonie ? sala de concertos a ser implantada sobre um antigo armazém em Hamburgo, na Alemanha ?, enquanto os portugueses do escritório Aires Mateus, além da consagrada dupla Álvaro Siza e Eduardo Souto, brilharam com suas elegantes estruturas, construídas nos exteriores do arsenal: uma simbiose perfeita entre rigor geométrico e emanação luminosa. Sob a curadoria do britânico Chipperfield, foi inegável que arquitetos do Reino Unido e da Irlanda desfrutaram de uma expressiva prevalência sobre os demais expositores. Mas, quer se trate da dupla O?Donnell & Tuomey, com suas imensas torres treliçadas, do mega-arquiteto Norman Foster ou ainda de um grupo iniciante como o londrino FAT ? que se serviu do Vila Rotonda de Palladio, provavelmente o edifício mais reproduzido do mundo, para discutir a questão das cópias ?, o mérito dos trabalhos apresentados atestou a escolha. Ainda que de forma indireta, o Brasil acabou se saindo bem diante da tsunami britânica que tomou conta de Veneza. Inspirado na ?nova geografia?, conceito criado por outro arquiteto brasileiro, o capixaba Paulo Mendes da Rocha, o estúdio Grafton, de Dublin, ganhou o Leão de Prata em Veneza. No entender do júri, pelas qualidades conceituais e espaciais do projeto, que, partindo da obra de Mendes da Rocha, previa a implantação de uma universidade em Lima, Peru: o primeiro projeto do escritório na América Latina.       Sob um mesmo teto Dois arquitetos brasileiros de gerações diferentes, Lúcio Costa e Marcio Kogan colocados lado a lado, sem interrupções. Este foi o ponto de partida do curador Lauro Cavalcanti ao conceber o espaço representativo do Brasil na 13ª ediçãoda Bienal Internacional de Arquitetura de Veneza. Sintonizada com o tema Common Ground, a ideia foi explorar as intersecções possíveis entre o tradicional e o contemporâneo na arquitetura brasileira. De um lado, Riposatevi (ou Descansem), instalação concebida por Costa para representar o Brasil na Trienal de Arquitetura de Milão, em 1964, e que retorna agora à Itália, remontada em Veneza. À primeira vista, um convite de Costa para o público relaxar em uma das redes instaladas no local, sob um céu coberto por toldos e, se for o caso, até mesmo arriscar uma canção ao violão. Vista pelo ângulo do arquiteto, uma instalação que faz alusão ao uso de elementos artesanais para uma adaptação mais natural ao clima dos trópicos. Tudo isso, apresentado em continuidade à proposta de Kogan, que traz os interiores de uma luxuosa casa projetada em São Paulo, passíveis de serem visualizados, em toda a sua intimidade, apenas por meio de lentes de aumento.  

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