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Diálogo intercontinental sobre futebol, com toques de política, economia e cultura.

Chegou Pep, 'La Estrella del Sur'

Edu: O que você me diz de Guardiola falando alemão, já chegou colonizado?

Por Carles Martí (Espanha) e José Eduardo Carvalho (Brasil)
Atualização:

Carles: Ledo engano. Ele demonstrou que é poliglota durante a apresentação, respondendo perguntas em inglês, castelhano, catalão e italiano e, detalhe: em bávaro!!!! Porque ele não falou em alemão, usou a língua regional, com expressões autóctones e, com isso, longe de ser soberbo ou prepotente, deu um recado, como catalão da gema que é. De respeito à cultura local, da região. Qualquer coisa, menos colonizado, nem por Madrid, nem por qualquer outra dominação centralista.

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Edu: O cara que fica sem fazer nada durante mais de 400 dias - e com a grana que tem - no mínimo precisa aprender algumas línguas e estudar outras culturas e costumes. Além do que jogou na Itália, morou em Nova York e já sabe há mais de seis meses que trabalharia na Alemanha. Bastante midiático o companheiro Pep. E parece que conseguiu o que queria, impressionar os alemães logo no primeiro dia.

Carles: Tem gente que mora e trabalha anos em outro país e mal aprende a própria língua. Não é o caso de Pep que provavelmente sabia fazia bem mais do que seis meses, que iria morar na Alemanha. Aliás, no discurso de apresentação foi mais além nas insinuações, pediu desculpas pelo alemão ruim e disse que Nova York não é o lugar ideal para aprender alemão. Provavelmente, uma mentira piedosa, com a intenção de ressaltar que em determinados lugares costuma-se ignorar o resto do mundo.

Edu: Parece que você, como advogado de carteirinha de Pep, descobriu nele a perfeição suprema.

Carles: Obviamente que compartilho muitas das ideias de Guardiola, mas também é certo que eu não conseguiria assumir a condição de produto de marketing como ele fez, inclusive sendo um conferencista do tipo TED. Agora, ficar sem fazer nada? Dá um tempo, né Zé!. O que ele fez não é para todo mundo, ele é um privilegiado que pode se permitir interromper o trabalho durante um longo período e dedicar-se a si mesmo, à sua preparação e aperfeiçoamento.

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Edu: Claro, por isso digo que ele pode se dar a alguns luxos, entre os quais ficar um tempo estudando futebol, algo que certos técnicos brasileiros deveriam ser obrigados por decreto a fazer. Não tenho reservas quanto aos conhecimentos de Pep Guardiola, embora ainda precise vê-lo montando um time saído do nada, não o Barça, que já tinha, entre outros, a dupla de meio-campo e Leo Messi. E admiro essa obsessão em jogar no ataque, de longe sua maior virtude. Mas 'La Estrella del Sur', como chamaram ontem alguns jornalistas alemães, ainda fica devendo quanto a algumas posturas pessoais, como o fato de pedir para a direção do clube 'acompanhar' o que os jogadores fazem nas horas de folga. Piqué e Cesc que o digam.

Carles: Desde faz uns dois anos parece que toda a população da Catalunha vem sendo investigada pela tal Método 3. Tudo começou com a denúncia da líder do PP local de supostas fraudes realizadas por Oriol Pujol, filho do ex-presidente da Generalitat, Jordi Pujol. A partir daí foram descobertas fichas de muitos catalães eméritos nos arquivos da tal agência. Quanto a se entre eles estavam ou não jogadores do Barça, ou se o mandante era o clube, o ex-presidente Laporta e se Guardiola foi conivente... nada disso foi confirmado. Como disse, de santo ou ingênuo ele não tem nada, tanto que sobrevive nesse mundo e bem, mas também não me parece o protótipo do mafioso do futebol. Para esse cargo, tenho outras indicações de candidatos bem mais capacitados. O time que ele encontrou montado, estou de acordo que Rijkaard fez um excelente trabalho, enquanto não se mostrou preguiçoso e indolente, mas o modelo na mão de um Pep bem mais ambicioso, evoluiu muitíssimo.

Edu: Não preciso de ajuda para identificar esses tipos, muito obrigado. Temos de sobra o modelo exportação por aqui no meio futebolístico, se vocês se interessarem. Se bem que os próprios jornais da Catalunha associaram a tal empresa, Método 3, a Guardiola e era evidente a implicância dele com Cesc e Piqué. Só acho que é o tipo de procedimento que não cabe a um técnico, que simplesmente prepara e escala quem está jogando melhor. Se o sujeito passou a noite na balada e não treinar nem jogar direito, perde o lugar no time e pronto. Aliás, como aconteceu com Cesc. Essa é a punição. Ou então que fique com o clube a função de vigiar seus funcionários, como vem sendo cada vez mais comum, embora condenável. Mas, enfim, seja ou não Guardiola um desagregador, o que me surpreendeu nos portais catalães ontem foi a reação de alguns torcedores 'culés' que ainda se referem a ele como um traíra, um 'duas caras'. Um pouco pesado para um ídolo desse porte.

Carles: Daqui a pouco isto vai parecer o bate-boca das redes sociais nos últimos dias: "foi ele"; "não, foi ele"... Não posso evitar defender o Pep outra vez, um cara que manteve o grupo unido durante muito tempo e sem precisar bajular ninguém. Provavelmente o jogo de mimos ele fez, como gestor de uma verdadeira fogueira das vaidades. E ele, o primeiro superego da corte, tratando de excluir alguns jogadores que dificultavam sua política, como Ibra ou Eto'o. Laporta, que também não é anjo caído, tampouco diria que é esse elemento desagregador. Coincidência ou não, tudo desandou com a chegada de Rossel, adepto de massagear egos para vendê-los na alta. E, pelo visto, as consequências já se fazem notar, com um Messi cada vez mais isolado. É possível que a filosofia de grupo, de conjunto que sempre prevaleceu durante as gestões Laporta e Guardiola, possivelmente nem sempre com os métodos mais louváveis, tenha seus dias contados em Camp Nou.

Edu: Hummm, será que já atingiu mesmo o Messi? É por causa da investigação do Fisco? Se for isso, preciso de outro post para saber mais dessa história. Por enquanto, quanto ao Pep, continuo achando que o idioma não será seu maior problema dele e sim o relacionamento com caras como Uli Hoennes, que está longe de ser um padrão de empatia, generosidade e bons comportamentos no mundo futebol. Além de ter um histórico autoritário.

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Carles: Não, nada a ver com o Fisco, ou talvez até tenha. Mas o ar já vinha ficando rarefeito há um tempo. Quanto à relação entre Pep e Hoeness, nem o próprio Guardiola nem o Bayern parecem dispostos a correr riscos, e por isso já colocaram uma série de elementos protetores entre ambos. Da parte do catalão, seu amigo inseparável, campeão olímpico de polo aquático, Manel Estiarte e, pelo clube bávaro, Matthias Sammer. Serão interlocutores permanentes para evitar males maiores para ambos os lados.

 

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