SÃO PAULO - O diretor de seleções da CBF e ex-presidente do Corinthians, Andrés Sanchez, se prepara para contar tudo o que viveu no comando de um dos clubes mais 'nervosos' do Brasil. Com o título O Mais louco do Bando, Andrés reuniu nas 224 páginas (com mais 28 de fotos) toda a sua trajetória e a do clube também após a queda para a segunda divisão em 2007, quando seu antecessor, Alberto Dualib, ganhava as manchetes do noticíario policial e a instituição se afundava na lama. Foi nessas condições que Andrés assumiu o comando do Parque São Jorge."Quer gozar, goza! Com a gente, não tem tempo ruim. Agora, podem escrever: quem riu do Corinthians, tudo bem, mas é melhor se despedir. A partir de hoje, ninguém nunca mais vai gozar do Timão". Foi assim que, um dia depois da maior catástrofe da história do Corinthians, o presidente recém-eleito iniciava o processo de recuperação do Corinthians, que acabava de chegar ao fundo do poço, com a queda para a 2ª divisão. Quatro anos depois, entregava ao seu sucessor um novo clube, turbinado com a chegada de Ronaldo Fenômeno, com a conquista de títulos, mudanças no estatuto, inauguração de um Centro de Treinamento e as primeiras estacas de um estádio em Itaquera. Andrés reergueu o Corinthians à sua maneira.São essas e muitas outras histórias que ele conta em seu livro de memórias. O Mais Louco do Bando será lançado pela editora G7 Books, dia 19 de junho, a partir das 19h na Livraria Saraiva do Shopping Anália Franco, no Tatuapé. Andrés teve como co-autor seu primo Tadeo Sanchez.O ex-presidente mergulha nos bastidores dos quatro anos em que dirigiu o Cortinthians, de 2008 a 2011, além de dar um breve resumo de sua vida antes de assumir o cargo mais importante que teve no Parque São Jorge. Andrés era um garoto de pés chato, vindo da Espanha, que sonhava em ser lateral-direito do seu time do coração. Não conseguiu. Trabalhou como feirante e também em uma barraca de frutas no Mercado Municipal de São Paulo. Nunca foi de estudar, mas isso não o impediu de vencer na vida e se tornar um líder esportivo."Já fiz muita coisa na vida, mas ser autor de livro é uma que eu não esperava. Ao terminar minha passagem pela presidência do Corinthians e refletir sobre tudo que havia sido feito, achei que o torcedor corintiano gostaria de saber do funcionamento do cube pelo lado de dentro. Nessa época fui procurado tanto pelo primo Tadeo quanto pela editora G7 Books para fazer esse registro em formato de livro. Embarquei nessa jornada e fiquei contente com o resultado. Espero que todo corintiano goste", disse Andrés.A CONTRATAÇÃO DE RONALDOO cartola destaca na publicação a negociação que fez para a contratação de Ronaldo e como tudo se acertou em uma conversa no banheiro de um hotel, com a base do contrato escrita em um guardanapo. A negociação para a construção do Estádio do Corinthians também ganha capítulo à parte. Andrés montou sua central de inteligência no Parque São Jorge. Ele mantinha o que chamou de "rede de ouvidos" para obter relatos de qualquer torcedor que tivesse algo para informar sobre tudo o que acontecia em bares, boates e restaurantes da cidade envolvendo seus jogadores. Sem papas na língua, revela o nome de um famoso ídolo de time rival que cantou o Hino do Corinthians num jantar de jogadores da seleção brasileira. FICHA TÉCNICALivro: O Mais Louco do BandoAutor: Andrés SanchezCo-autor: Tadeo SanchezEditora: G7 BooksData de Lançamento: 19.06.12, na Livraria Saraiva do Shopping Anália FrancoPreço: R$29,90Número de Páginas: 224 + 28 páginas de fotosEXCLUSIVO Das festas de 2009 à água no chope de 2010O time seguia dando show: nas sete rodadasfinais da primeira fase do Paulista, nos mantivemos invictos. Fomos à semi, no primeiro jogo contra o São Paulo, e vencemos por 2 a 1 no Pacaembu – gols de Elias e Christian. No jogo de volta, vencemos por 2 a 0 no Morumbi, com gols de Douglas e Ronaldo.Este fez um gol que calou a boca dos que o chamavam de gordo: pegou a bola na intermediária,deu aquela arrancada que sempre foi sua marca registradae deixou a zaga tricolor a ver navios. O time estava mesmoembalado, não tinha como colocar freio.
A final foi contra o Santos. O primeiro jogo foi na
Vila Belmiro, 26 de abril – fazia 25 anos que não jogávamos
uma final contra o Peixe. Pouco antes do grande clássico,
o gerente de marketing Caio Campos me explicou que as
negociações de patrocínio com a Hypermarcas avançavam.
Eu tinha chegado até a empresa através do fotógrafo
André Schiliró, autor de um livro com fotos de torcedores
corinthianos célebres. Schiliró me apresentou a João Alves
de Queiroz, o Júnior, principal acionista da empresa, e
eu mandei um desafio. Disse que ia demonstrar o peso de
ser patrocinador de um time como o nosso, sem que ele
tivesse de pagar nada. Ele topou, e assim estampamos a
logomarca da Bozzano, uma das marcas da empresa, nas
mangas da camisa naquele jogo.
Muitos não acreditavam que essa estratégia funcionasse.
E informamos ao estafe de Ronaldo, nosso sócio
em 80% em qualquer ação de marketing, nas mangas ou
calção, que havia a possibilidade de um novo patrocinador.
Já no intervalo recebi uma ligação de Júnior: o patrocínio
estava confirmado. Fiquei feliz, foi como se também tivesse
marcado meu gol. A partir dali, a Hypermarcas se tornou
nosso principal patrocinador – o próprio Ronaldo iniciou
uma boa amizade com Júnior.
Aquele dia todos os ventos sopravam a nosso favor.
Mesmo o Santos estando com seu time completo – até
com o garoto Neymar, que iniciava sua caminhada –, o resultado
final foi 3 a 1. Ronaldo fez dois gols e Chicão fez um
de falta, numa cobrança perfeita. O Fenômeno interceptou
um passe longo de Elias pela ponta direita, deu um drible
desconcertante no zagueiro Triguinho, dando um toque de
calcanhar de direita para si mesmo, deu dois passos e bateu
sutil na bola, de esquerda, de cavadinha – a redonda
encobriu lentamente o goleiro Fábio Costa e foi morrer devagar
no fundo da rede. Que golaço!
O jogo final do Paulistão foi em casa, em 3 de maio.
O Santos marcou primeiro, mas empatamos com um lindo
gol de André Santos. A torcida explodiu: depois de um ano
na série B, já comemorávamos o primeiro título, e invicto.
Foi o reinício em nossa história. As festas começavam já
nos vestiários: era tal a qualidade de jogo da equipe que os
resultados eram duplamente comemorados – tanto pelas
vitórias quanto pelo jogo bonito. Na saída do estádio, houve
um encontro coletivo na casa de Ronaldo, e em seguida
a festa oficial, no Royal Club – as pistas ficaram pequenas,
tal o nível de animação do elenco.
Durante aqueles dias, pela segunda vez juntei para
um almoço a família de Mano Menezes com a minha (Dete,
meus filhos, pais e irmãos), mais os membros da comissão
técnica. Nosso bom relacionamento repercutia no ambiente
de trabalho, sem dúvida. Outra festa de que participei foi o
aniversário de 15 anos de Marina, filha do doutor Grava, que
tem o mesmo nome da minha filha. Festa à fantasia. Foi gente
de todo tipo: piratas, presidiários, pierrôs e colombinas.
Simplesmente optei por me apresentar vestido de jogador do
Corinthians, com o uniforme oficial da cabeça aos pés, pronto
para atravessar o túnel e entrar no campo defendendo o
meu time. No fundo, esse sempre foi o meu grande sonho.
Títulos e festas, porém, não aliviavam o fardo de
ser presidente do clube. Atender a tantos assuntos, sempre
com a demolidora pressão do entorno corinthiano, não
é tarefa aconselhável para alguém com o coração exaltado
como o meu. A vontade de sumir era constante. E não
acontecia só comigo: até pessoas impassíveis, acostumadas
aos duros embates financeiros, também bambeavam.
Uma tarde o Rosenberg, que já havia participado da
negociação da dívida externa brasileira na época do Delfim
e depois se tornou consultor de negócios milionários, também
se encheu e veio pedir demissão, já nem me lembro
mais por que motivo. Tentei convencê-lo que só faltavam
dois anos para o fim do mandato, que seria melhor a equipe
ir junta até o fim. Mas não teve jeito: o homem queria ir
embora. Assim, pedi a ele que redigisse duas cartas de demissão.
Se o cansaço e estresse eram as razões para sua
demissão, para mim seria pior. Assim, melhor sairmos os
dois juntos. Rosenberg me olhou perplexo. Entendeu que
era brincadeira. Tudo ficou muito tenso. Até que o impasse
se resolveu numa ótima gargalhada. Quem blefava ali? Nos
abraçamos, solidários, e nunca mais se falou em demissão.
Alguns dias depois decidimos que era hora de tomar
a iniciativa e avaliar as probabilidades de futura construção
de nossa “casa própria” – é assim que sempre trato
nosso estádio. Em reunião com o arquiteto Aníbal Coutinho,
do escritório Coutinho, Diegues, Cordeiro, surgiu a ideia de
ampliar o Parque São Jorge. O tema ficou em suspenso. E
ali mesmo encarregamos ao arquiteto a elaboração de um
projeto para avaliar tal possibilidade.
Enquanto isso, o time seguia firme. No Brasileirão
colecionávamos jogos médios e ruins; já pela Copa do Brasil
devolvemos a derrota em Curitiba com um 2 a 0 sobre
o Atlético-PR, gols de Ronaldo. Seguiu-se, além de vitória
simples, um empate em dois com o Fluminense – mais um
passinho na Copa. Nas semis, o jogo de ida, contra o Vasco,
no Rio, rendeu a igualdade em um gol; outro empate,
agora em zero, nos permitiu a classificação à final da Copa
do Brasil.
Foi nessa época que recebi a ligação de meu amigo
Alexandrino Alencar, diretor de relações institucionais
da Odebrecht. Ele era um amigão do peito, quase parente.
Nos conhecemos desde os tempos em que ele foi diretor
da empresa OPP, que, após uma fusão, deu origem
à Braskem, de quem a Sol sempre foi uma das principais
clientes na compra de matérias-primas. Alexandrino pediu
que fosse até seu escritorio, no Eldorado Business Tower,
em São Paulo: tinha algo a dizer que podia ser de interesse
para o Corinthians, mas não poderia falar ao telefone. Horas
depois eu já estava no bairro de Pinheiros.
O escritório de Alexandrino ficava no 32º andar da
torre, com vista para a marginal Pinheiros. Rodeado de cristais
transparentes, com a sensação de estar suspenso no
ar, tive uma pequena vertigem, mal olhava para fora. Mas a
vertigem maior estava por vir. Com seu usual tom ameno,
amistoso, Alexandrino contou de uma viagem que tinha feito
a Brasília, acompanhando Emilio Odebrecht, presidente
do conselho de administração da empresa. Na reunião, a
construtora tratava com o presidente Lula de assuntos do
setor petroquímico. À saída, Lula, despedindo-se de Odebrecht
e Alexandrino, mudou de assunto:
– Bem que vocês podiam dar uma mão pra esse
garoto, presidente do Corinthians, ajudando a fazer o estádio,
hein?
Alexandrino devolveu: era meu amigo pessoal de
muitos anos. Odebrecht pegou carona:
– Presidente, pode deixar que vamos tratar esse assunto
com muito carinho. Se for viável, com certeza vamos
ajudar.
Ao terminar sua exposição, Alexandrino me piscou
o olho:
– Tá vendo? Até eu, que sou carioca e torcedor do
Fluminense, quero ver o Corinthians com um estádio. E aí,
como fica? Topa o desafio?
Ainda meio zonzo, eu revelei ao meu amigo que o
clube tinha mais de um projeto em estudo. Quem sabe?
Saí dali com mais pressa do que entrei: o “sonho da casa
própria” até que não parecia tão irreal assim.
Na Copa, afinal, a finalíssima: no primeiro jogo, no
Pacaembu, Jorge Henrique e Ronaldo garantiram a vitória
sobre o excelente time do Internacional, liderado por Nilmar
e D’Alessandro. Após passar pelo freguês São Paulo por
3 a 1 no Paulista, fomos para o segundo jogo, em Porto
Alegre, dia 1º de julho. Foi tenso, teve expulsões dos dois
lados. Mas com o 2 a 2, gols de Jorge Henrique e André
Santos, fomos campeões da Copa do Brasil em pleno Beira-
Rio. Mais um prêmio a um ano de muito esforço e trabalho.
Aquela noite Porto Alegre ficou alvinegra de alegria.
Fomos lá comemorar na churrascaria Na Brasa a conquista,
que nos classificava para a Libertadores de 2010. Rolou
uma cena inusitada. Em seu estado natural, Ronaldo é um
baita gozador. Eu conversava com meu irmão Tadeo quando
Ronaldo passou acompanhado do Caveira. Tadeo pediu
ao Caveira: “Faz uma foto?”. Ronaldo, solícito, se preparou
para a pose conjunta. Em seguida, Tadeo lhe passou
a câmera e fez pose, passando o braço sobre o ombro de
Caveira. Ronaldo, sem perder o rebolado, deu muitas gargalhadas
com todos disparando o clic:
– Um irmão concorre em autógrafos comigo; agora
o outro me faz de fotógrafo?!
Dia seguinte, uma delegação composta pelos atletas
Cristian, Dentinho, Jorge Henrique, Ronaldo, o capitão
William, o técnico Mano Menezes, o diretor Mario Gobbi e
o relações-públicas Isaac Waynszteyn me acompanharam
a Brasília em uma visita institucional a Lula. O presidente
estava emocionado com nossa conquista. Ao final da visita,
Lula me chama a um canto e pergunta para quando a diretoria
poderia fechar uma proposta para o estádio. “Com
Ronaldo estrelando um time de primeira linha para a Libertadores,
o passo seguinte é ter a casa própria!”, sugeriu o
presidente. Comentei que havia vários projetos em estudo;
Lula me aconselhou que não demorasse. Foi assim que tratei
pela primeira vez com o presidente sobre a Arena Corinthians
e me comprometi que assim que tivesse o projeto
mais viável passaria para mostrar a ele.