Vídeo não mostra comboio militar na fronteira do Brasil com a Venezuela; imagens são de Goiás

Imagens foram feitas na cidade de Cristalina; bandeiras que aparecem nos veículos militares são da Cavalaria do Exército

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Por Clarissa Pacheco

O que estão compartilhando: que vídeo mostra comboio de veículos militares na fronteira do Brasil com a Venezuela após o presidente Nicolás Maduro ameaçar invadir a Guiana.

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O Estadão Verifica investigou e concluiu que: é enganoso. O vídeo mostra veículos do Exército Brasileiro na cidade de Cristalina (GO), a mais de 4,5 mil quilômetros da fronteira do Brasil com a Venezuela. Os veículos que aparecem na imagem são da Cavalaria do Exército – são esses que usam bandeiras nas cores vermelho e branco.

Por outro lado, o Exército Brasileiro reforçou sim a presença militar na fronteira de Roraima com a Venezuela às vésperas da realização de um referendo pelo governo venezuelano. A população foi consultada neste domingo, 3, sobre a intenção da Venezuela de anexar o território do Essequibo, que corresponde a 75% da área da Guiana.

Arte/Estadão Foto: Arte/Estadão

Saiba mais: O vídeo aqui investigado soma mais de 58 mil interações no Instagram e no TikTok, onde foi originalmente postado. O primeiro passo para investigar o conteúdo foi identificar onde as imagens foram feitas. Ao longo de 36 segundos de vídeo, é possível visualizar claramente as placas de dois veículos que passam pelo local: uma Fiat Toro prata e um VW Polo preto. Uma consulta ao sistema Sinesp Cidadão, do governo federal, aponta que os dois veículos são de Cristalina (GO).

O Verifica, então, buscou por companhias do Exército Brasileiro na cidade e identificou uma área militar onde ficam prédios da 3ª Brigada de Infantaria Motorizada, o 23º Pelotão de Polícia do Exército e a 6ª Companhia de Comunicações. Bem próximo deles fica a Rua Inácio Jorge dos Santos, onde foi possível identificar os mesmos elementos que aparecem no vídeo viral. A imagem foi feita nas imediações da Unidade Básica de Saúde Zona Sul Nova de Cristalina.

Quando o vídeo foi feito?

O Exército confirmou ao Estadão Verifica que as imagens não foram feitas na fronteira com a Venezuela, mas não informou quando o vídeo foi feito, nem em quais circunstâncias. Há, porém, algumas pistas no próprio conteúdo. A primeira delas é uma decoração natalina nos postes, o que sugere que o vídeo é recente. Além disso, uma busca reversa de imagem associada aos termos-chave levou a mais um vídeo no TikTok, em versão estendida, em que dois vídeos diferentes são postos em sequência.

No segundo vídeo, é possível ouvir quando uma mulher que narra as imagens afirma: “Isso é só vinda de general? Ah, conversa pra boi dormir”. É possível que ela se refira à cerimônia de Formatura de Passagem de Comando do 23º Pelotão de Polícia do Exército, que aconteceu em Cristalina no dia 28 de novembro deste ano.

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Entre as fotos divulgadas pela 3ª Brigada de Infantaria Motorizada de Cristalina, à qual o 23º Pelotão está subordinado, há fotos de militares usando o mesmo fardamento que os homens que aparecem no vídeo: uma espécie de colete com duas faixas vermelhas na horizontal.

Em 28 de novembro de 2023, 23º Pelotão de Polícia do Exército de Cristalina (GO) fez uma solenidade de formatura e passagem de comando; militares na cerimônia usam farda igual aos que aparecem no vídeo viral. Foto: Divulgação Foto: Divulgação

Quatro dias depois, houve outra solenidade na 3ª Brigada de Infantaria Motorizada de Cristalina, com a presença de pelo menos três generais, posto citado pela mulher que narra o vídeo. Na ocasião, em 1º de dezembro, o general de Brigada Emílio Vanderlei Ribeiro passou o comando ao também general de Brigada Ivon Barreto Leão. O general de Divisão Ricardo Piai Carmona, comandante militar do Planalto, presidiu a cerimônia.

Em agosto, o Estadão Verifica desmentiu outro vídeo que mostrava veículos militares em Cristalina. Na época, um post dizia que os automóveis do Exército exibiam bandeiras de Cuba, mas era apenas o estandarte da Cavalaria.

Reforço militar na fronteira

Apesar de o vídeo não ter sido feito na fronteira com a Venezuela e não haver relação entre as imagens e a disputa territorial entre a Venezuela e Guiana, o Exército Brasileiro reforçou mesmo a presença militar na fronteira nos últimos dias, conforme publicou o Estadão. Em nota, o Ministério da Defesa disse que monitora a crise: “As ações de defesa têm sido intensificadas na região da fronteira ao Norte do país promovendo maior presença militar”.

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A disputa pelo Essequibo, rico em petróleo e minerais, iniciou em 1811, quando a Venezuela se tornou independente da Espanha tendo a região como parte de seu território. Três anos depois, contudo, o Reino Unido assumiu o controle da área que corresponde à Guiana e, segundo a Venezuela, se apossou do território. Conforme mostrou o Projeto Comprova neste sábado, o governo brasileiro apoia uma saída pacífica para a disputa, sem se envolver diretamente.

Em entrevista a emissoras de TV, o ministro da Defesa, José Mucio, disse que o reforço militar na fronteira é para evitar que militares venezuelanos adentrem o território brasileiro. “Precisamos ter cuidado. É como se seu vizinho quisesse invadir outra casa usando a sua. O que não podemos permitir é que a Venezuela, querendo entrar na Guiana, use nosso território. Estamos atentos. A Defesa não vai permitir que use território brasileiro para outro país entrar em briga”, disse em entrevista à CNN.

Neste domingo, a ditadura de Nicolás Maduro anunciou que 95% das pessoas que votaram no referendo aprovaram a anexação do Essequibo, mas os próximo passos ainda não estão claros.

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