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Após ataques, França limita filme ‘jihadista’

Somente maiores de 18 anos poderão assistir a documentário, que tem cenas de violência

Por Andrei Netto , correspondente e Paris
Atualização:

PARIS - Sob o impacto dos atentados de 2015 e em estado de emergência, o governo da França limitou a exibição de um documentário sobre o extremismo islâmico, o filme Salafistas, que estreou ontem no circuito comercial. Após considerar a hipótese de proibir sua apresentação nos cinemas, o Ministério da Cultura decidiu impor o limite de 18 anos para o documentário. 

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Realizado pelo produtor francês François Margolin e o jornalista mauritano Lemine Ould M. Salem, especialista em movimentos jihadistas da África Subsaariana, o filme mostra o cotidiano da vida sobre a sharia dos grupos armados salafistas no Mali e na Mauritânia. 

A decisão sobre a liberação do filme foi tomada ontem pela ministra da Cultura, Fleur Pellerin, horas antes da entrada em cartaz da programação semanal dos cinemas na França. A maior oposição partiu do Ministério do Interior, responsável pela segurança interna, pela polícia e pela repressão ao terrorismo.

Soldados franceses reforçam a segurança em frente a catedral de Notre Dame em Paris. Foto: Philippe Wojazer / Reuters 

Segundo o representante do Interior na comissão do Ministério da Cultura, as imagens do filme poderiam ser interpretadas como apologia do terrorismo. Isso porque o filme traz o depoimento de milicianos que pregam – e praticam – a violência e o proselitismo, defendendo a jihad (guerra santa) contra os inimigos “infiéis” do Islã. 

O discurso e as imagens de execuções preocupou as autoridades francesas porque mensagens de radicalismo e de violência também são veiculadas, com sucesso, pelo grupo Estado Islâmico em sua estratégia de atração de combatentes para a Síria e o Iraque.

A questão, disse Salem ao Estado, é que o filme reflete a realidade, o que até mesmo o obrigou a passar por situações de altíssimo risco. Filmado entre 2012 e 2015 em regiões dominadas por milícias jihadistas em Mali, Argélia, Tunísia e Iraque, o documentário ouve “o outro lado”, ou seja, dá a palavra aos milicianos para que expliquem as razões de tamanha violência. “Nosso filme levanta o debate, o que é normal, pois é necessário para mostrar o funcionamento da ideologia jihadista-salafista”, entende Salem.

O resultado é uma narrativa crua, sem explicações ou interpretações de parte dos autores, sobre o fundamentalismo salafista, que prega a obediência estrita ao Alcorão e o retorno aos preceitos e práticas religiosas do Islã na época do profeta Maomé, entre os anos 570 e 632. 

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Após uma primeira exibição no Festival Internacional de Programas Audiovisuais de Biarritz, o filme passou por cortes voluntários por parte dos autores, que retiraram imagens da execução do policial Ahmed Merabet, morto em Paris em 7 de janeiro de 2015 durante o atentado ao jornal Charlie Hebdo, e também a cena da amputação da mão de um homem pelos jihadistas. 

A polêmica ganhou o meio cultural. Ao Le Monde, o jornalista e cineasta Claude Lanzmann, de origem judaica, saiu em defesa dos autores, exortando a ministra da Cultura a não proibir o lançamento. Para o diretor, Salafistas é “uma verdadeira obra-prima que esclarece, como nenhum livro ou ‘especialista’ em Islã jamais fez, a vida cotidiana sob a sharia em Timbuctu, na Mauritânia, no Mali, na Tunísia, no Iraque”.

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