PUBLICIDADE

Balão espião aumenta crise entre EUA e China; secretário de Estado cancela viagem a Pequim

Anúncio de que um suposto balão espião da China estaria sobrevoando o território dos Estados Unidos teve ampla repercussão em Washington

Foto do author Redação
Por Redação
Atualização:

O secretário de Estado americano, Antony Blinken, adiou uma viagem diplomática planejada para a China no domingo, enquanto o governo dos EUA avalia uma resposta mais ampla à descoberta de um balão chinês de alta altitude sobrevoando o Estado de Montana, em locais que abrigam cerca de 150 silos de mísseis balísticos intercontinentais.

PUBLICIDADE

A decisão abrupta ocorreu apesar da alegação da China de que o balão era um satélite de pesquisa meteorológica que havia saído do curso por causa de fortes ventos. Os EUA descreveram o balão como um satélite de vigilância.

A decisão veio poucas horas antes de Blinken partir de Washington para Pequim e marcou um novo golpe nas já tensas relações EUA-China. Blinken e o presidente Joe Biden determinaram que era melhor não prosseguir com a viagem neste momento - muito em função das pressões políticas de republicanos e democratas após a descoberta do suposto balão espião.

Joe Biden e Xi Jinping se cumprimentam em encontro do G20; balão espião chinês provocou nova crise entre Pequim e Washington. Foto: Alex Brandon/ AP - 14/11/2022

As tão esperadas reuniões de Blinken com altos funcionários chineses foram vistas em ambos os países como uma forma de encontrar terreno comum em meio a grandes divergências sobre Taiwan, direitos humanos, reivindicações da China no Mar da China Meridional, Coreia do Norte, guerra da Rússia na Ucrânia, política comercial e mudanças climáticas.

Embora a viagem, que foi acertada em novembro pelo presidente Joe Biden e pelo presidente chinês Xi Jinping em uma cúpula na Indonésia, não tenha sido formalmente anunciada, autoridades de Pequim e Washington vinham falando nos últimos dias sobre a chegada iminente de Blinken. As reuniões deveriam começar no domingo e terminar na segunda-feira.

Enquanto o Pentágono minimizou o valor potencial do balão para adquirir inteligência, a reação pública dos funcionários do governo Biden destacou como as relações com Pequim se tornaram frágeis e delicadas, mesmo por causa de um balão.

O secretário de defesa, Lloyd J. Austin III, realizou uma reunião sobre o balão com altos funcionários da defesa dos EUA enquanto estava nas Filipinas, e o presidente Biden “foi informado e pediu opções militares”, disse um funcionário do Pentágono a repórteres.

Publicidade

Balão da discórdia

O anúncio de que um suposto balão espião da China estaria sobrevoando o território dos Estados Unidos teve ampla repercussão em Washington, onde parlamentares republicanos cobraram o presidente, Joe Biden, por uma posição mais rigorosa em relação ao regime liderado por Xi Jinping.

O presidente da Câmara, Kevin McCarthy, qualificou o balão como um exemplo da “afronta descarada da China sobre a soberania americana”, argumento ecoado por outros parlamentares da mesma legenda. Outro senador, Marco Rubio, que participa do comitê de inteligência da Casa, afirmou que a notícia era alarmante, mas não uma surpresa. “O nível de espionagem voltado para o nosso país por Pequim se intensificou e ficou mais claro nos últimos cinco anos”, escreveu no Twitter.

O Ministério das Relações Exteriores da China a princípio afirmou não ter informações sobre o ocorrido, condenando no entanto o que chamou de “elucubrações e boatos” sobre o incidente. Nesta sexta-feira, 3, declarou em nota que o balão era uma aeronave civil usada em pesquisas, meteorológicas em especial, que tinha “desviado de seu trajeto planejado” em razão dos ventos. O comunicado ainda lamenta a entrada do objeto no espaço aéreo dos EUA.

Enquanto isso, o Ministério de Defesa do Canadá afirmou que também havia detectado um balão espião e que o monitorava para checar se ele representava um “segundo incidente potencial”, sem esclarecer se os dois casos têm relação.

O momento já era de tensão entre Washington e Pequim, com o vazamento de um memorando dos EUA na semana passada em que um general previa uma guerra entre as duas potências em 2025.

Funcionários do Pentágono se recusaram a divulgar muitos detalhes sobre o balão, incluindo seu tamanho e características, tornando mais difícil para especialistas externos avaliar sua intenção e valor militar. “Avaliamos que era grande o suficiente para causar danos do campo de destroços se o derrubássemos em uma área”, disse um alto funcionário do Departamento de Defesa a repórteres.

Balão chinês foi encontrado sobrevoando Montana, nos EUA. Foto: Larry Mayer/The Billings Gazette via AP - 01/02/2023

Drew Thompson, um ex-funcionário do Pentágono que agora é pesquisador sênior visitante na Escola Lee Kuan Yew de Políticas Públicas da Universidade Nacional de Cingapura, disse que o momento para a polêmica do balão foi, no mínimo, desajeitada.

Publicidade

“Esta missão de vigilância de balão realmente demonstra que, mesmo quando Xi Jinping está tentando melhorar o tom do relacionamento e a retórica se suaviza”, disse Thompson, “não há interesse real da parte de Pequim em agir com moderação ou alterar seu comportamento de forma que realmente contribua para melhorar genuinamente a condição do relacionamento”.

A primeira reação oficial de Pequim às acusações do Pentágono sobre o balão foi tranquila. Mao Ning, porta-voz do Ministério das Relações Exteriores da China, não confirmou que o balão era da China. “Observamos os relatórios e estamos verificando a situação”, disse ela, “e quero enfatizar que, antes que os fatos sejam claros, a especulação e o exagero não ajudarão a trazer uma solução apropriada para os problemas”.

“A China é um país responsável, sempre cumpre rigorosamente o direito internacional e não tem intenção de violar o território ou espaço aéreo de qualquer país soberano”, disse Mao.

Mas o Global Times, um jornal dirigido pelo Partido Comunista que se tornou um veículo para reações combativas, às vezes quase oficiais, de Pequim, sugeriu que os relatórios do balão estavam de acordo com o que chamou de esforços dos EUA para “criar uma atmosfera de Guerra Fria e exacerbar as tensões entre China e EUA”.

Balão espião existe?

O outrora humilde balão é uma das muitas tecnologias que as forças militares da China aproveitaram como uma ferramenta potencial em sua rivalidade com os Estados Unidos e outras potências. Outras máquinas avançadas incluem drones e veículos hipersônicos que podem manobrar em altas velocidades na atmosfera.

Em estudos e artigos de jornais, os especialistas do Exército Popular de Libertação da China acompanharam os esforços dos Estados Unidos, França e outros países para usar balões avançados de alta altitude para coleta de informações e para coordenar operações no campo de batalha. Segundo eles, novos materiais e tecnologias tornaram os balões mais resistentes, manobráveis e de maior alcance do que as gerações anteriores de balões.

“Os avanços tecnológicos abriram uma nova porta para o uso de balões”, afirmou um artigo do Liberation Army Daily – o principal jornal militar da China – no ano passado. Outro artigo no mesmo jornal observou que os dirigíveis nas camadas superiores da atmosfera também podem se tornar como “mil olhos” ajudando a monitorar o espaço sideral.

Publicidade

O Ministério da Defesa de Taiwan disse que no início de 2022, a China lançou balões sobre a ilha. O balão supostamente enviado para os Estados Unidos pode ser usado para coletar informações sobre sistemas de defesa aérea ou condições atmosféricas, disse Su Tzu-yun, analista do Instituto de Defesa Nacional e Pesquisa de Segurança em Taipei.

As forças americanas teriam poucos problemas para seguir o balão agora, mesmo em altitudes muito mais altas do que as vistas sobre Taiwan, disse ele. “Basicamente, eles são muito óbvios e, devido ao seu grande volume, são facilmente rastreados pelo radar”, disse Su./ NYT, AP e W.POST

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.