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Fôlego dado pelo Brexit aos partidos neopopulistas desafia União Europeia

Após sobreviver à crise da zona do euro, que ameaçou arrasar a economia, União Europeia agora enfrenta o crescimento das legendas que são contra Bruxelas e cujas bandeiras são o nacionalismo exacerbado e a xenofobia

Por Andrei Netto , Correspondente e Paris
Atualização:

PARIS - Às 7h13 da manhã de 24 de junho de 2016, horário de Paris, instantes após a divulgação do resultado do referendo em que os britânicos optaram pela saída do Reino Unido da União Europeia, a presidente da Frente Nacional, Marine Le Pen, comemorou via Twitter: “Vitória da liberdade!”.

Em pelo menos 19 capitais, líderes políticos de extrema direita e de esquerda radical comemoraram a ruptura entre Londres e Bruxelas. São os neopopulistas, corrente que ganha espaço na Europa denunciando a globalização e lutando contra a integração, a imigração e o Islã.

Marine Le Pen, presidente da Frente Nacional francesa, defendeu que cada nação possa se manifestar por meio de um referendo Foto: MATTHIEU ALEXANDRE / AFP

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O crescimento dos neopopulistas não é um fenômeno novo, mas assustou a opinião pública europeia pela vitória da campanha pelo Brexit - a saída do Reino Unido da UE. Liderada pelo conservador ex-prefeito de Londres Boris Johnson e por Nigel Farage, líder do Partido pela Independência do Reino Unido (Ukip), a campanha foi ancorada nas duas bandeiras mais típicas do movimento: o nacionalismo exacerbado, que chamam de “soberania”, e a xenofobia, a rejeição aos imigrantes. O coquetel deu certo, conquistou mais de 17 milhões de votos e 51,9% do eleitorado, sentenciando os britânicos a romperem a relação de 43 anos com a UE.

Desde então, em diferentes países da Europa os apelos a referendos semelhantes se multiplicam. “Como eu peço há anos, é preciso que o mesmo referendo seja realizado na França e nos países da UE”, afirma Marine, que, se for eleita presidente da França em maio, promete realizar até o fim de 2017 uma consulta popular sobre o “Frexit” - a saída da França do bloco - que hoje tem 26% de apoio.

Embora não compartilhem a mesma ideologia - podem ser partidos de extrema direita e de extrema esquerda -, essas legendas têm na UE, no Tratado de Schengen, que fixou regras da livre circulação de pessoas, e na moeda única, o euro, seus grandes inimigos, que combatem com retóricas anticapitalista e antiliberal. Além da Frente Nacional, na França, legendas como o Partido pela Liberdade (PVV), na Holanda, a Liga Norte, na Itália, ou o Pegida, na Alemanha, lideram esse movimento “eurocético”.

Em dois países, essa tendência está no poder, ameaçando a solidez da UE. Esses são os casos da Hungria, com o premiê Viktor Orban, líder da União Cívica Húngara, e da Polônia, onde o presidente, Andrzej Duda, e a premiê, Beata Szydlo, integram o Partido Direito e Justiça.

Em 2015, segundo levantamento do Parlamento Europeu, em pelo menos 14 países essas legendas superaram os 4% dos votos, e em 4 tiveram índices de adesão superiores a 18%, casos de França, Reino Unido, Dinamarca e Áustria - onde nova eleição presidencial pode lhes dar a presidência do país.

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“A ideia comum desses partidos é combater a União Europeia e construir uma Europa em que os Estados-nação retornariam com força e, sejamos claros, onde as pessoas sejam cristãs e brancas”, explicou ao Estado o cientista político Jean-Yves Camus, especialista em movimentos extremistas do Instituto de Relações Internacionais e Estratégicas (IRIS). “Eles compartilham uma visão que recusa o multiculturalismo e a imigração e tenta retornar ao modelo místico de uma certa Europa - modelo que, aliás, não sabemos ao certo o que é.”