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É colunista do 'Estadão' e analista de assuntos internacionais. Escreve uma vez por semana.

Opinião|A aliança entre EUA e países do Indo-Pacífico para isolar a China

A estratégia envolve aproximação entre as democracias asiáticas e europeias, diante da retomada da competição estratégica com a China e a Rússia, numa nova versão da guerra fria

Foto do author Lourival Sant'Anna

As nações democráticas do Indo-Pacífico deram novos passos nessa semana para se defender do expansionismo chinês e das ameaças norte-coreanas. O primeiro-ministro do Japão, o presidente das Filipinas e o chanceler da Nova Zelândia estreitaram em Washington a cooperação militar com os Estados Unidos e outros aliados democráticos da região.

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Os Estados Unidos têm alianças militares com Japão, Coreia do Sul, Austrália, Filipinas e Tailândia. Além disso, têm parcerias estratégicas com a Índia, Taiwan, Nova Zelândia, Cingapura, Mongólia, Indonésia, Malásia e Vietnã. Desses, o Vietnã é uma ditadura de partido único, Cingapura é um regime semiautoritário e Tailândia, uma monarquia com forte influência dos militares. Os outros são democracias, ainda que imperfeitas.

A articulação foi chamada de “pivô para a Ásia” no governo de Barack Obama, retrocedeu sob Donald Trump e Joe Biden a retomou. Um de seus principais desafios foi aproximar Japão e Coreia do Sul, inimigos históricos.

Entretanto, quatro incentivos explicam a união de todos esses países: as disputas territoriais com a China, as ameaças da Coreia do Norte, a invasão da Ucrânia pela Rússia e a possível eleição em novembro de Trump, que em seu primeiro mandato colocou em dúvida os compromissos americanos de defesa de aliados na Ásia e na Europa.

O presidente Joe Biden, ao centro, o presidente filipino Ferdinand Marcos Jr., à esquerda, e o primeiro-ministro japonês Fumio Kishida posam antes de uma reunião trilateral na Casa Branca, em Washington Foto: Mark Schiefelbein/AP

“A Ucrânia de hoje pode ser o Leste Asiático de amanhã”, advertiu o primeiro-ministro japonês, Fumio Kishida, no encontro com Biden, na quarta-feira. No mesmo dia, o líder chinês, Xi Jinping, recebeu em Pequim o ex-presidente taiwanês Ma Ying-jeou, e assegurou que “ninguém pode impedir a reunião de família” entre China e Taiwan.

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Foi uma sombria referência ao plano de Xi de anexar Taiwan, que fabrica 90% dos chips mais sofisticados do mundo. Presidente entre 2008 e 2016, Ma é do partido Kuomintang, que mantém uma atitude dócil em relação à China. Já o Partido Democrático Progressista, no poder desde então, defende de forma mais firme a autonomia de Taiwan frente à China.

No dia seguinte, Biden e Kishida realizaram uma inédita cúpula trilateral com o presidente filipino, Ferdinand Marcos Jr. Japão e Filipinas são parceiros estratégicos. A China contesta a soberania dos arquipélagos Senkaku, japonês, e Spratly, filipino. Biden reafirmou o compromisso americano de defesa dos dois países.

Os EUA discutem o ingresso do Japão no Aukus, acordo de compartilhamento de tecnologia militar que inclui também a Austrália e o Reino Unido. Para isso, o Japão precisa aprovar novas leis que protejam melhor o sigilo de informações sensíveis. O país já participa do Diálogo de Segurança Quadrilateral (Quad), que promove grandes manobras militares com EUA, Índia e Austrália.

O grupo foi criado em 2007, no governo de George W. Bush, quando os republicanos ainda atuavam como o tradicional partido do establishment de defesa americano. Ao se apossar do partido, Trump reduziu suas políticas externa e de defesa a interesses mercantilistas e, no caso de Israel, ideológicos.

Seu único objetivo na relação com a China, por exemplo, era reduzir o déficit comercial. Quando negociava o aumento de US$ 200 bilhões em dois anos das importações chinesas, Trump argumentou com Xi que ele precisava ajudá-lo a se reeleger, comprando os produtos do Meio Oeste americano, já que os democratas seriam mais duros com a China, testemunhou o então conselheiro de Segurança Nacional, John Bolton.

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O líder chinês, Xi Jinping (à direita), se reúne com o ex-presidente de Taiwan Ma Ying-jeou no Grande Salão do Povo em Pequim; encontro com ex-líder taiwanês pró-China é um sinal para a ilha  Foto: Ju Peng / Xinhua News / EFE / EPA

O comunicado conjunto do encontro entre o secretário de Estado Antony Blinken e o chanceler neozelandês Winston Peters afirma que sua parceria se baseia no domínio da lei, democracia e direitos humanos. E em “desafios comuns”, como a “mudança climática, competição estratégica e a guerra de agressão da Rússia contra a Ucrânia”.

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Os dois países se dizem unidos pela aposta em um Indo-Pacífico “aberto, estável e próspero”, no qual haja “liberdade de navegação, livre resolução de disputas e respeito a soberania e a normas internacionalmente acordadas”. Todas essas preocupações se referem à atuação chinesa no Mar do Sul da China.

A estratégia envolve aproximação entre as democracias asiáticas e europeias, diante da retomada da competição estratégica com a China e a Rússia, numa nova versão da guerra fria. A Otan tem quatro parceiros estratégicos no Indo-Pacífico: Japão, Coreia do Sul, Austrália e Nova Zelândia. Esse número tende a crescer.

O flagelo ucraniano mostrou que ficar de fora de alianças e não se preparar para a guerra para não provocar potências expansionistas apenas aguça o seu apetite.

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Opinião por Lourival Sant'Anna

É colunista do 'Estadão' e analista de assuntos internacionais

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