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Novo plebiscito sobre Brexit ganha força

O Reino Unido está agora entrando num furacão político jamais visto em décadas

Por THE ECONOMIST
Atualização:

Há um ano a causa em favor de um segundo plebiscito sobre a adesão à União Europeia era a definição de uma causa perdida. Na eleição geral em 2017, o único partido que desejava realizar uma nova votação, o Liberal-Democrata, obteve apenas 8% dos votos.

O apoio ao voto popular sobre os termos da saída do Reino Unido da UE estava confinado a um grupo de pessoas intransigentes, fracassadas e excêntricas que passavam mais tempo debatendo aspectos técnicos do que defendendo suas razões de uma nova votação. 

Pesquisa revela que a maioria dos britânicos prefere o Reino Unido dentro da UE Foto: AFP PHOTO / Daniel LEAL-OLIVAS

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Hoje há uma grande chance de o Reino Unido realizar um novo plebiscito sobre a aceitação do acordo do Brexit que Theresa May apresentou ao gabinete nesta quarta-feira. Na segunda-feira, Gordon Brown se tornou o terceiro ex-primeiro-ministro a defender outra votação, ao lado de John Major e Tony Blair. Algumas semanas antes, a campanha em favor de uma consulta organizou uma manifestação que contou com 670 mil pessoas em Londres.

Por que uma causa perdida como essa se tornou uma força tão poderosa na vida política? Claro que em parte foi pura sorte. May cometeu uma sucessão de erros, incluindo acionar o Artigo 50 antes de ter elaborado suas demandas e convocar uma eleição que destruiu sua maioria.

A UE jogou suas cartas brilhantemente, em especial com relação à Irlanda do Norte. Mas, no fim, a lógica prevaleceu. Os defensores do Brexit prometeram o impossível – todas as vantagens da adesão à UE sem arcar com nenhuma das desvantagens – e a desilusão inevitavelmente se fez sentir.

Essa lógica implacável teve o efeito peculiar de transformar a fraqueza do voto popular em força. A campanha sempre careceu dos requisitos normais para ter sucesso político: um líder carismático, uma estrutura organizacional clara e uma identidade comum. São nove diferentes organizações que têm uma notável semelhança com a Frente Popular da Judeia do Monty Python e seus rivais. Mas embora isso tenha prejudicado no início, tais fraquezas hoje vêm colaborando. 

Como a campanha não está associada a nenhum partido ou grandes personagens ela consegue alcançar todo o espectro político. E como é impulsionada por jovens voluntários que ninguém ouviu falar, a organização pode contestar qualquer noção de que é uma frente em favor do centrismo defendido por Tony Blair.

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Ironicamente, o movimento ao qual a campanha em favor da consulta popular mais se assemelha é o que defendeu a saída do país da UE, movimento que também começou com um grupo de desesperançados e se desenvolveu com base numa combinação de adrenalina e paixão.

Existem fortes argumentos contra uma nova consulta. O fato é que ela provocaria de novo uma divisão amarga do país, podendo levar à desobediência civil. O governo de David Cameron prometeu que o referendo em 2016 decidiria se o país permaneceria na UE ou se retiraria. Cerca de 2,8 milhões que não tinham mais o hábito de votar achando que o establishment político manipula o sistema, foram às urnas.

Uma segunda votação poderá produzir um resultado próximo ou uma nova vitória do Brexit. Existem também problemas práticos: como fazer para lançar outra votação nessa miscelânea? E qual seria a pergunta?

Mas o problema dentro da política britânica não é se esta ou aquela opção é difícil e dolorosa, mas se ela é mais ou menos difícil e dolorosa do que as alternativas. Uma segunda votação dividirá o país e enfurecerá os que defendem a saída. Mas o país já está dividido e os que querem a permanência (a vasta maioria dos eleitores mais jovens) estão furiosos. Outro referendo significará retornar à promessa de Cameron para os eleitores. 

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Pesquisas de opinião já indicam que uma pequena maioria de eleitores apoia a permanência na UE. Essa maioria pode ser facilmente muito maior se os eleitores tiverem de fazer uma escolha concreta entre respeitar os acertos existentes e aceitar um acordo que, como defensores e contrários à saída reconhecem agora, forçará o Reino Unido a tolerar muitas das regras estabelecidas pela União Europeia sem ter nenhum direito de se manifestar sobre elas.

Os detalhes práticos para a realização de uma votação são complicados e será necessário pedir uma extensão do prazo para a saída com base no Artigo 50.

O Reino Unido está agora entrando num furacão político jamais visto em décadas. Como esse furacão explodirá ninguém sabe. É possível que May consiga aprovação do seu acordo. Há muitas pessoas que aceitarão qualquer compromisso para pôr fim à questão.

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É igualmente possível que o acordo proposto por ela seja desfeito e o país enfrentará o caos. O fato de o resultado do caos poder levar a uma nova votação sobre a participação do país como membro integral da UE é uma das histórias mais extraordinárias destes tempos extraordinários. / TRADUÇÃO DE TEREZINHA MARTINO  © 2018 THE ECONOMIST NEWSPAPER LIMITED. DIREITOS RESERVADOS. PUBLICADO SOB LICENÇA. O TEXTO ORIGINAL EM INGLÊS ESTÁ EM WWW.ECONOMIST.COM

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