Regiões áridas do Peru restauram diques pré-incas

Desenvolvidas por volta de 600 a.C., as amunas podem beneficiar todo o país

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Por Redação

SAN PEDRO DE CASTA, Peru - Em uma montanha bem acima da capital do Peru, Javier Obispo faz uma pausa no trabalho árduo de renovar uma amuna. O dique de irrigação abandonado distribuía água antes que os europeus chegassem à América do Sul.

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Com o abastecimento de água de Lima sob pressão crescente, o técnico veterinário de 42 anos tem trabalhado com outros moradores da região para trazer a antiga tecnologia de volta à vida. As encostas íngremes dos Andes, pontilhadas de pequenos cactos com espinhos enormes, elevam-se ao seu redor. As alterações climáticas já são sentidas ali.

“Vinte anos atrás, o solo era úmido. Costumava haver cachoeiras”, diz Obispo, apontando para um penhasco empoeirado acima. “Agora, simplesmente não há mais pasto suficiente. Como será em 2030?”. Agora, a água está começando a pingar, talvez pela primeira vez em séculos.

Reserva de água em San Pedro de Casta, no Peru. Foto: Florence Goupil/ The Washington Post

O sistema

As amunas – paredes permeáveis de pedra e adobe de 40 centímetros de altura que se estendem por quilômetros por essa paisagem imponente – desviam o excesso de água de riachos que, durante a estação chuvosa, fluiriam descontroladamente pelas montanhas e acabariam se perdendo no Oceano Pacífico.

Eles então infiltram essa água no solo, reabastecendo o lençol freático e garantindo sua liberação gradual ao longo do ano em nascentes naturais. A tecnologia antiga também melhora a pureza da água e ajuda a prevenir a erosão e deslizamentos.

Obispo é um de uma dúzia de aldeões que trabalham juntos sob o sol da montanha para resgatar esta amuna de oito quilômetros de extensão, escavando-a e reformando-a em um projeto-piloto que é promissor para esta paisagem árida.

Trabalhadores usam pedras e cimento para reforçar a captura de água. Foto: Florence Goupil/ The Washington Post

Mas o projeto, organizado pela ONG local Aquafondo, pretende também beneficiar populações muito além desta região remota. A quatro horas de carro dali, encontra-se Lima, considerada a terceira cidade desértica mais populosa do mundo, depois de Cairo, no Egito, e Karachi, no Paquistão.

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Aninhada ao lado do Pacífico no que é efetivamente uma extensão norte do Deserto do Atacama, a localização da caótica capital do Peru, de 10 milhões de habitantes, foi escolhida nos anos 1500 pelos conquistadores espanhóis.

O abastecimento de água de Lima depende em grande parte de três pequenos rios que descem dos Andes e variam durante o ano, de secos até torrentes violentas, cujo volume pode sobrecarregar a concessionária de água estatal.

Déficit

Lima ainda sofre com um déficit de água de cerca de 30 metros cúbicos por segundo. Isso significa que cerca de 1 milhão de habitantes mais pobres nas periferias da cidade carecem de água encanada.

O déficit pode ser compensado quase inteiramente pela água fornecida pelos amunas, segundo pesquisadores. Para chegar lá, o Peru teria de restaurar centenas de quilômetros de diques pré-históricos em todas as três bacias hidrográficas que servem Lima.

O desenvolvimento das amunas por volta de 600 a.C., séculos antes da ascensão dos Incas, permanece um mistério pois as culturas andinas não desenvolveram a escrita. Seu renascimento agora pode ocorrer a nível nacional./ WPOST

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