O presidente Donald Trump não pode concorrer a um terceiro mandato na presidência dos Estados Unidos a não ser que haja mudanças na Constituição no país. Mas isso não o impede de flertar abertamente com a ideia.
Trump já cogitou a hipótese publicamente e privadamente. E, no domingo, afirmou que não está “brincando” sobre isso. Em uma entrevista à NBC News, ele insistiu que haveria “métodos” para contornar o limite de dois mandatos estabelecido pela 22.ª Emenda.
Trump não especificou quais seriam esses métodos e não há sinais aparentes de que ele esteja realmente preparando o terreno para um terceiro mandato. Mas suas ponderações — baseadas na realidade ou não — atendem a um propósito político distinto.
Essas sugestões desviam a atenção de outras controvérsias, como a série de mensagens vazadas do aplicativo Signal na qual seus principais conselheiros incluíram inadvertidamente um jornalista em grupo de discussão sobre uma operação militar iminente. E congelam o campo de manobra de potenciais sucessores que possam roubar a atenção de um pato-manco — um status temido por presidentes americanos, que veem sua relevância diminuir constantemente com o passar do tempo.

“Parece alguém que não quer ser tratado como um pato-manco e agora se revela”, afirmou o professor de direito Derek Muller, da Universidade de Notre Dame, especialista em direito eleitoral. “É muito difícil ser um presidente pato-manco ou ser tratado dessa forma, com as pessoas falando com você como se o seu mandato já tivesse acabado.”
Em janeiro, o deputado republicano Andy Ogles, do Tennessee, propôs uma duvidosa emenda à Constituição para tornar Trump elegível para um terceiro mandato.
Mas os principais republicanos no Capitólio rejeitaram na segunda-feira a ideia de mudar a Constituição e sugeriram que o presidente estava brincando. O senador John Thune, da Dakota do Sul, líder da maioria no Senado, disse que Trump está “provavelmente se divertindo com isso”, e o deputado Steve Scalise, da Louisiana, líder da maioria na Câmara, disse que os comentários tiveram como objetivo “fazer as pessoas falarem” sobre o assunto. Autoridades da Casa Branca sugeriram o mesmo, observando que Trump, em vez de abordar o tema espontaneamente, apenas respondeu perguntas feitas por repórteres.
“Olha, vocês continuam a fazer essa pergunta ao presidente sobre um terceiro mandato, daí ele responde honestamente e francamente, com um sorriso, e então todo mundo surta com a resposta”, disse a jornalistas a secretária de imprensa da Casa Branca, Karoline Leavitt, na segunda-feira.
Ela acrescentou: “Não é realmente algo em que estejamos pensando. Ele tem quatro anos. Há muito trabalho a ser feito. Nós já fizemos muita coisa em quase 100 dias. E o povo americano ama o que este presidente está fazendo.”

O estrategista republicano Dave Carney, que comandou o super PAC pró-Trump Preserve America, disse que a estratégia do presidente pode ser manter as pessoas apreensivas.
“Isso deixa as pessoas desconfortáveis”, disse ele. “Indivíduos de esquerda vão enlouquecer, e isso manda uma mensagem para os outros de que Trump vai ficar por aqui mais tempo do que pensamos. Trump é hábil em manter as pessoas fora do eixo e desconfortáveis.”
“Ele não violou nenhuma lei. Ele não disse que faria isso”, acrescentou Carney. “Ele disse que há por aí muitas opções diferentes. Sua capacidade de enfurecer os oponentes é um de seus maiores pontos fortes enquanto os democratas estão confusos.”
Trump deixou claro que não tem interesse em compartilhar holofotes. Pouco após assumir seu segundo mandato, ele vem reivindicando uma ampla autoridade para reformular o governo federal e demonstra uma visão expansiva sobre o Poder Executivo. E tem se irritado com esforços para refreá-lo.
Os republicanos no Capitólio se alinharam com sua agenda, cedendo muito de seu poder ao presidente. E quando juízes federais tentaram contrariar suas determinações, Trump os atacou sugerindo que eles deveriam sofrer impeachment. Os democratas temem que os comentários de Trump sobre os juízes e um terceiro mandato estejam levando o país a uma crise constitucional.
“Estou muito preocupado com a possibilidade dele tentar exercer o poder máximo até ser refreado”, disse o deputado democrata Ro Khanna, da Califórnia, em entrevista na segunda-feira.
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Por enquanto, Trump afirma que está focado em seu segundo mandato.
“Eu nem quero falar sobre isso”, disse o presidente a repórteres a bordo do Air Force One, na noite do domingo. “Estou apenas dizendo que escutei mais pessoas dizendo: ‘Por favor, concorra novamente’. Nós temos um longo caminho a percorrer antes de sequer pensarmos sobre isso, mas muitas pessoas falaram.”
Na segunda-feira, um repórter da Fox News, aparentemente tentando levantar a bola para Trump, fez uma pergunta hipotética ao presidente: se ele pudesse concorrer a um terceiro mandato, os democratas tentariam lançar o ex-presidente Barack Obama contra ele? (Obama já cumpriu dois mandatos e não demonstrou nenhum interesse em concorrer a algum cargo eletivo novamente.)
“Eu adoraria isso”, disse Trump. “Seria uma boa.” / TRADUÇÃO DE GUILHERME RUSSO