Um ano depois, eleitores de região que garantiu vitória de Trump seguem fiéis

Apesar de o presidente americano ter perdido popularidade no país e no Cinturão da Ferrugem, que garantiu sua eleição, ele conserva entusiastas que levam a sério sua autodefinição como gênio

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Por Erie e Pensilvânia

ERIE, EUA - Patty Bloomstine acredita que Donald Trump é o escolhido por Deus para a missão de salvar a América. Quase um ano depois da posse do presidente mais controvertido da história recente dos EUA, a dona de casa de 56 anos continua a professar apoio incondicional ao bilionário de Nova York, que nunca teve o apego à religião como uma característica.

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 Nos meses que antecederam a disputa presidencial, Patty se uniu a Karen Kirley e a Barbara Shannon no movimento que levou à vitória de Trump em Erie, condado da Pensilvânia que não escolhia um candidato republicano para a Casa Branca desde Ronald Reagan, em 1984. 

Patty Bloomstine (de azul, àesq), Barbara Shannon (de verde) e Karen Kirley (de pé) participam de reunião em cafeteria em Erie, Pensilvânia. Elas seguem apoiando Trump um ano depois de sua vitória Foto: Cláudia Trevisan/ESTADAO

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 Trump tem perdido popularidade nacionalmente e mesmo no Cinturão da Ferrugem, conjunto de Estados do Meio-Oeste que, afetados pela desindustrialização, se voltou contra os democratas na última eleição e foi determinante para o resultado. Este desgaste de Trump também ocorreu em Erie, mas não afetou as três amigas. Elas mantêm uma imagem quase mística do presidente, a quem veem como um cavaleiro solitário em constante embate com o poder estabelecido em Washington, a grande imprensa, Hollywood, a oposição democrata e o próprio Partido Republicano. 

Os relatos de instabilidade emocional do ocupante da Casa Branca e as suspeitas de interferência da Rússia nas eleições de 2016 são rejeitados por elas como “falsidades fabricadas” por jornalistas. As declarações bombásticas de Trump são vistas como sinal de transparência e autenticidade.

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“Ele é um verdadeiro gênio”, diz Patty, repetindo o autoelogio feito por Trump depois da publicação do livro Fire and Fury (Fogo e Fúria, em tradução livre), que o retrata como um presidente inepto. “Desde a posse, ele foi capaz de lutar ladeira acima e vencer. Foi Deus”, afirma Barbara, a menos politicamente correta das três. “Ele é muito mais inteligente do que as pessoas acreditam”, opina Karen. 

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Encravado no Cinturão da Ferrugem, o condado de Erie perdeu milhares de empregos industriais nas últimas décadas, com o fechamento de fábricas que transferiram suas operações para o México, a China ou outros Estados americanos. O discurso de Trump contra acordos comerciais e a imigração encontrou eco entre trabalhadores locais, inseguros em relação a seu futuro e a sua permanência na mítica classe média americana. 

Trump ganhou em Erie com 48% dos votos, contra 46,4% de sua adversária, Hillary Clinton. Em todo o Estado da Pensilvânia, ele conquistou 48,2% dos votos, 1,3 ponto porcentual a mais que a democrata. O presidente ainda levou Michigan, Ohio e Wisconsin, que também integram o Cinturão da Ferrugem. Obama venceu nos quatro Estados em 2008 e 2012. A virada republicana de 2016 na região foi fundamental para Trump.

Pesquisas de opinião mostram que a aprovação do presidente caiu em todos eles desde sua posse, há um ano. Levantamento da Universidade Mercyhurst revela a mesma tendência em Erie: a aprovação de Trump passou de 41% a 32% entre fevereiro e outubro, enquanto sua desaprovação subiu de 49% para 55% no período.

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“Não acredite em pesquisas”, disse o cirurgião plástico aposentado Winston Chu, que migrou para os EUA de Mianmar em 1971. “A maioria das pessoas que votou em Trump escolheria seu nome de novo.” Republicano desde a primeira vez em que votou para presidente, em 1976, Chu diz sentir por Trump o mesmo entusiasmo despertado nele por Reagan. Casado com uma imigrante belga, Pauletti, o cirurgião afirmou não ver contradição entre sua trajetória e o apoio a um presidente que adota políticas anti-imigração. “Nós viemos legalmente.”

Patty, Karen e Barbara veem imigrantes e refugiados que vivem em Erie como parasitas dos cofres públicos. Os opositores de Trump sustentam que esses grupos pagam impostos e contribuem para a economia local. As três são críticas de benefícios sociais em geral e esperam que sua redução seja a próxima prioridade de Trump. “Nos zoológicos há placas ‘não alimente os animais’ por uma razão”, declara Barbara. A seu lado, Patty tenta corrigir o tom usado por sua aliada política. “Ela não quer dizer que os que recebem benefícios sociais são animais.” 

Joseph Morris, diretor do Centro de Política Aplicada da Universidade Mercyhurst, diz que é impossível saber se Trump, apesar de impopular, seria derrotado hoje. “Isso depende do candidato democrata. Hillary não era popular, o que deprimiu a participação de eleitores democratas.” Para ele, os fatores que contribuíram para a redução na aprovação do presidente foram a violência com armas e a ausência de investimentos em infraestrutura – uma promessa não realizada.

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As três defensoras de Trump dizem não ter visto mudanças concretas na economia de Erie desde a posse de Trump, que no sábado completa um ano. “Tenho grandes expectativas em relação ao país, mas quando olho ao redor, vejo que estou empacada em Erie”, afirma Patty.

Otimismo

Dono de uma fábrica que produz equipamentos para indústrias, Dennis Sweny diz ter sentido o impacto da agressiva desregulamentação da economia promovida por Trump em seu primeiro ano de governo. Até junho, ele pretende agregar 30 funcionários ao atual quadro de 230. 

“Há mais otimismo das empresas com o fim de regulamentações impostas por Barack Obama e a antecipação dos benefícios da reforma tributária”, observou. A nova legislação reduziu a alíquota do Imposto de Renda das corporações de 35% para 21%. Como todos os eleitores de Trump entrevistados pelo Estado, Sweny vê a grande imprensa como adversária. “Há uma tentativa de golpe da mídia para derrubá-lo.” 

O presidente atribuiu a sua administração a responsabilidade pela queda do desemprego. Mas o indicador registra movimento positivo desde o governo Obama. O desemprego era de 4,8% quando Trump tomou posse. Em dezembro, caiu para 4,1%. Obama assumiu o governo em 2009 com desemprego de 7,6%, que chegou a 9,4% em dezembro do mesmo ano. Em pesquisa da Quinnipiac University, 66% dos entrevistados declararam que o estado atual da economia americana é “bom” ou “excelente”. Mas 49% dos entrevistados atribuíram o cenário a políticas adotadas por Obama. Trump tem o mérito na opinião de 40%.